Um novembro para dar o tom a 2025

Novembro foi um daqueles meses que poderiam ser ”síntese do ano” na política climática nacional. Foi bastante clara a movimentação simultânea do governo em três importantes direções, o que, aliás, deve ser também a tônica de 2025: articulações com Legislativo em pautas essenciais ao clima, regulações intra-Executivo e negociações em política internacional. 

Em novembro, vimos movimentos nítidos nas três direções: ao mesmo tempo em que o governo centrou suas fichas em atos de regulação – especialmente em matéria de terras, que contabilizou simplesmente metade de todos os atos infralegais do mês (vide seção Monitor de Atos Públicos, adiante) – houve finalmente a aprovação, no Congresso, do mercado regulado de carbono no Brasil, sem que o governo tenha perdido de foco o clima – e o combate à pobreza – como fios condutores da Declaração de compromisso do G20. Um malabares danado, que deve se repetir em 2025.

Lá fora, a operacionalização do mercado global de carbono, prevista no famoso “Artigo 6” do Acordo de Paris, foi destravada. O Brasil, mesmo sem o Presidente Lula na COP, não só anunciou, como também foi o 2º país a depositar sua nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) na Convenção do Clima, detalhando políticas climáticas e destacando pela primeira vez o tema adaptação, mas com uma meta de mitigação para 2035 em sistema de banda, que significa uma “zona de segurança” que pode depor contra o ideal de máxima ambição. O lançamento da NDC brasileira três meses antes do prazo final de depósito na Convenção é também uma “estratégia presidencial”, já que o Brasil é o anfitrião da próxima COP e quer estimular os países a acelerarem seus novos compromissos, evitando uma COP30 modorrenta.

Novembro também deixou claro que, diante do contexto internacional, o desafio brasileiro de ser o próximo presidente da COP, em 2025, será ainda maior do que o esperado: a decisão sobre a nova meta de financiamento climático (NCQG) ficou (bem) abaixo das expectativas e do necessário na COP 29, e expôs definitivamente a necessidade de se reformular o modelo de governança climática global. E isso terá um capítulo crucial em Belém. Ou melhor: na jornada entre Baku e Belém. Só assim a COP 30 pode vir a ser a “COP da virada”.

Em novembro, a política climática atravessou outras agendas não apenas por sua inerente transversalidade, mas pela sobreposição de calendários. Enquanto as negociações se desenrolavam – ou melhor: se enrolavam – em Baku, no Azerbaijão, os líderes das maiores economias globais se reuniram no Rio de Janeiro, na Cúpula do G20. A diplomacia brasileira, na presidência do grupo, logrou colocar a questão climática com destaque na agenda financeira e fechar o comunicado conjunto já no primeiro dia do encontro. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou suas falas no Rio para pedir que os países se empenhassem em Baku para alcançar uma nova meta de financiamento na casa dos trilhões. Não adiantou. O resultado final na COP 29 reconheceu a necessidade de US$ 1,3 trilhão anuais, mas o objetivo acordado ficou bem abaixo: US$ 300 bilhões

No Rio, o presidente brasileiro também voltou a falar na criação de um conselho sobre mudança climática na estrutura da ONU. Ele já havia levantado o tema no discurso de abertura da Assembleia Geral da organização em setembro, em Nova York. Esse parece ser um tópico que voltará constantemente à mesa nos próximos meses. Desenha-se como um dos pontos que o governo brasileiro defenderá para a reforma do multilateralismo global, pauta que também levanta interesse de parlamentares de vários países. A COP-16 – a da Biodiversidade –, sem resultados de encher os olhos, foi pausada para retomada em fevereiro. Enquanto o mundo derrapa em momentos de tomadas de decisão consistentes, os eventos climáticos extremos seguem encontrando pela frente cidades não adaptadas para tamanha intensidade e recorrência: inundações mataram mais de 200 pessoas na Espanha.

No plano interno, a política climática se movimentou para frente. Além da aprovação do mercado regulado de carbono, o Brasil apresentou seu primeiro esboço de uma Estratégia Nacional de Adaptação, à consulta pública; também foi criada a Comissão Nacional de Bioeconomia – de dentro da qual sairá o Plano Nacional sobre o tema – e uma série de atos ligados à governança territorial aproximaram o Brasil do cumprimento de metas projetadas pelo mandato. Do lado de fora do mundo dos papeis e normas, a seca prolongada segue a afetar comunidades e a biodiversidade nas diferentes Amazônias. 

Ainda deu tempo de a Organização Meteorológica Mundial (OMM) anunciar que 2024 deve superar 2023 e se tornar o ano mais quente que a Humanidade já registrou.

TÁ LÁ NO GRÁFICO

Neste mês, o Tá Lá no Gráfico tratou de explicar por que tivemos COP 16 em Cali, COP 29 em Baku e COP 16 em Riad, com “As conquistas das COPs”. 

Também analisamos a redução do desmatamento reportada pelos dados anuais do Prodes, que mostraram quedas nas taxas de perda de vegetação nativa da Amazônia e do Cerrado, mas que ainda indicam que “O caminho ainda é longo” para zerarmos o desmatamento em nossos biomas. 

No mês em que o Brasil apresentou sua nova NDC, explicamos a importância das metas climáticas apresentadas à Convenção do Clima (UNFCCC). Em “As NDCs vão salvar a Terra?”, refletimos sobre como essas três letras podem fazer a diferença em matéria de clima. 

Com a aprovação do marco do mercado regulado de carbono pelo Congresso, apresentamos “As fichas no mercado de carbono”. 

E com a operacionalização do mercado global, em decisões na COP 29, mostramos “Que mercado de carbono é esse?”. 

Conheça! (Ou revisite!)

MONITOR DE ATOS PÚBLICOS

Em novembro, foram captadas 53 normas relevantes para a política climática brasileira. O tema dominante no mês foi Terras e Territórios, com 34 atos. A maioria de normas alocadas neste tema inclui as declarações de interesse social para fins de desapropriação de imóveis rurais, em benefício de territórios quilombolas e atos de destinação de terras públicas. 

Entre as classes, está mantido o predomínio de normas de Regulação, com 26 normas, seguida por Resposta com 11 atos e na sequência, Planejamento, com 8. As normas de regulação são referentes ao tema Terras e Territórios; já as de Resposta estão relacionadas, principalmente, com os repasses emergenciais destinados ao enfrentamento de queimadas, secas e crises climáticas no Brasil, realizados pelo Ministério da Saúde e ao emprego da Força Nacional de Segurança Pública, em apoio à Funai. Em Planejamento foram criados Grupos de Trabalho e abertas Consultas públicas, como a do Plano Decenal de Expansão de Energia 2034 – PDE 2034. 

Em termos de agenda, a mitigação ficou em evidência em novembro, puxada pelas declarações de interesse público que fazem parte do processo de titulação dos territórios quilombolas. Governança ficou em 2º lugar, com a instituição de programas com o Terra Cidadã, seguida da agenda Financiamento, com leis de abertura de crédito extraordinário ainda em resposta ao desastre ocorrido no Rio Grande do Sul. Adaptação segue a tendência dos meses anteriores, sendo a agenda menos presente no monitoramento da política climática.

Brasil, 500 atos depois

Já nos últimos dias de novembro, o Brasil ultrapassou a marca de 500 atos normativos relevantes para política climática em 2024. A efeito de comparação, 2023 havia contabilizado, ao todo, 438 normas relevantes para clima. Isto é: um salto de 15% na produção normativa para clima no país (com ainda alguns dias pela frente, antes das festas de final de ano…). A produção normativa em 2024 já é mais intensa que em 2023 em todas as principais classes de normas:

– Atos de Planejamento saltaram de 103, em 2023, para 141, até o último dia de novembro; 

– Atos de Regulação, de 153 para 198;

– Atos de Resposta, de 86 para 97.

Uma avaliação geral indica que o país vai construindo (e reconstruindo) a institucionalidade necessária para que os diferentes assuntos da pauta climática se desenvolvam na dimensão de políticas públicas. 

Qualitativamente, os atos têm demonstrado que o governo incorpora lições aprendidas no passado e busca trazer novos elementos que dialoguem com oportunidades e desafios da atual conjuntura, como é o caso de novas formas de financiamento climático (ex. Ecoinvest), estímulos à reconfiguração industrial e atração do setor privado (NIB, Mover), adaptação de cidades (Estratégia Nacional e Programa Cidades Verdes Resilientes), entre outros temas que se impõem na nova realidade climática do planeta. 

Acompanhando cuidadosamente esse tecido de normas essencial para a política climática nacional, a Política por Inteiro alerta que o ritmo de estruturação em certos temas precisará acelerar o passo. A 2ª metade dos ciclos de governo, no Brasil, costuma ser mais rápida que a 1ª. 

Afinal, “é tarde, mas ainda temos tempo”.

Acesse o Monitor de Atos Públicos e acompanhe diariamente a atualização das medidas relevantes para a política climática nacional.

top-3

TOP 3 DESTAQUES DO MÊS

Em ano de Olimpíadas, todo o mundo volta os olhares para Paris. Na Política por Inteiro, nosso pódio olha para o Acordo de Paris. Por isso, elegemos como os destaques de novembro três medidas que aproximam o Brasil das metas estipuladas no Acordo, no seguinte pódio:

🥈

Ministério do Meio Ambiente (MMA),

pelo suporte à Presidência da República para, por Medida Provisória, alterar leis que, agora, passam a permitir repasses diretos do Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA) aos estados e municípios, para prevenção e combate a incêndios florestais.

🥇

Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA),

pelo suporte a 15 decretos que declaram áreas a serem desapropriadas de dentro de Territórios Quilombolas, ampliando segurança jurídica e direitos sobre a terra a comunidades, nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul.

🥉

Ministério dos Povos Indígenas (MPI)

que, por meio do Conselho Nacional de Política indigenista, emite Resolução recomendando ao Governo Federal incluir o tema demarcação das terras indígenas como eixo do Plano Clima.

nota metodológica

Dada a transição do governo federal, a metodologia da POLÍTICA POR INTEIRO passou por uma revisão, na qual foram reformulados temas e classes e inserido mais um nível de sistematização das normas captadas no Diário Oficial da União, relacionado especificamente às agendas de mudança do clima. A partir de agora, os Balanços Mensais contarão com identificações (tags) para cada agenda do clima da qual pertencem as análises.

  • “Mitigação”
  • “Adaptação”
  • “Governança”
  • “Financiamento”
“Governança”

Em governança, o destaque ficou para a criação de novos programas, como o Terra Cidadã, que tem como objetivo ampliar a capacidade operacional das políticas públicas de reforma agrária e de governança fundiária já em implementação, funcionando como um serviço de apoio ao Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA).

Outra frente da agenda foi a revisão da lista de municípios prioritários para ações de contenção do desmatamento na Amazônia, assim e também daqueles que já podem ser considerados com o desmatamento sob controle. A nova relação se baseia nos dados mais recentes do Prodes, divulgados neste mês, e assim substitui a lista anterior, publicada em novembro de 2023.

Com mais de 4 meses de atraso em relação ao prometido em norma estipulada pelo próprio governo, foi criada a Comissão Nacional de Bioeconomia. Ela envolve 32 instituições, dentre as quais os ministérios da Fazenda (MF), Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que a presidirão, em sistema de rodízio. A Comissão é a instância central de elaboração e de acompanhamento do Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia (PNDBio), concebido para ser uma das engrenagens principais do Plano de Transformação Ecológica do Brasil, assim como os Planos de Prevenção e Controle do Desmatamento nos biomas brasileiros, a exemplo do PPCDAm, para a Amazônia Legal. Há, também, rebatimentos em outros planos importantes, como o Nova Indústria Brasil (NIB), que dedica 1 de seus 6 eixos para o tema Bioeconomia.

Para além da governança de uso da terra, que vem sendo prioritária para o governo federal ao longo de 2024 (vide a posição do MDA no ranking de medalhas da Política por Inteiro), outras iniciativas importantes caminharam em novembro. Uma delas é a criação do Comitê Nacional de Segurança de Infraestruturas Críticas, responsável pela atualização do Plano Nacional de Segurança de Infraestruturas Críticas – PLANSIC. Ainda que o MMA não conste na composição do Comitê, a retomada da governança acerca de infraestruturas essenciais pode significar o desenho da estratégia de segurança infraestrutural, com a incorporação dos riscos e dos preceitos de adaptação climática.

“Mitigação”

A questão territorial colocou a agenda de mitigação em primeiro lugar no mês de novembro. Foram 17 declarações de interesse social e desapropriação de imóveis rurais em benefício de terras remanescentes de quilombos, em diversos estados do Brasil. Além disso, foram destinados mais de um milhão de hectares (1.287.465,15 ha), no âmbito do Incra, as terras federais foram para criação de assentamentos e regularização fundiária, as destinadas ao Icmbio são para ampliação e criação de novas Unidades de Conservação. Foram destinadas ainda áreas para concessão florestal, tanto para o Serviço Florestal Brasileiro quanto para o MMA. Para o ordenamento fundiário de povos e comunidades tradicionais em áreas de florestas públicas foram cedidas 18 áreas remanescentes de glebas federais, aos cuidados do MMA juntamente com o MDA. Somam-se ainda a aprovação de novos projetos de assentamentos e reconhecimentos de terras remanescentes de quilombos.

“Adaptação”

A agenda de adaptação ganhou em novembro um reforço de orçamento: a Lei Complementar nº. 210 determina que a adaptação às mudanças climáticas, assim como ações de prevenção, mitigação e resposta e recuperação de desastres sejam prioridades na destinação de emendas parlamentares. O texto define que intervenções no território custeadas por emendas, de quaisquer tipos, estão impedidas na falta das respectivas licenças ambientais. Determina também que as emendas do tipo de Bancada somente poderão ir para ações estruturantes. Em termos de novas políticas públicas foi lançado o Programa Periferia Viva, que aponta para uma importante interseção entre a redução de desigualdades em territórios periféricos e as mudanças climáticas, ao definir como um de seus objetivos de “reduzir riscos de desastres e promover a adaptação dos territórios periféricos às mudanças climáticas”.

“Financiamento”

Na seara do financiamento climático, foi aberta a primeira fase da consulta pública dos cadernos técnicos do Sistema Brasileiro de Taxonomia Sustentável, o envio de sugestões pode ser realizado até 31/03/2025. A segunda fase está prevista para começar em fevereiro de 2025 e será referente aos limites quantitativos de mitigação e adaptação.

Na Saúde, normas de repasse financeiro emergencial ao SUS, para custeio no enfrentamento a queimadas, secas e crises climáticas, alavancaram a agenda em novembro. No mês, os repasses totalizaram R$ 74,2 milhões e saíram da conta do Fundo Nacional da Saúde direto para os respectivos fundos municipais. Municípios no estado do Amazonas vêm sendo os principais beneficiados. 

Ainda estão sendo emitidas normas de resposta ao desastre climático ocorrido no Rio Grande do Sul, em maio deste ano. No mês, foram destinados mais de R$ 1 bilhão em crédito extraordinário para ações de governança fundiária, defesa civil, entre outras medidas de reparação do estado.

BRASIL

Habemus nova NDC…

Era quarta-feira, 13 de novembro, quando a delegação brasileira, liderada pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, ladeado pela ministra Marina Silva e pelo embaixador André Correa do Lago, apresentava ao mundo a nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil, no âmbito da Convenção do Clima. O documento, segundo a ministra, é muito mais do que só a entrega de números e do compromisso brasileiro com o mundo. É “um novo paradigma para o desenvolvimento econômico e social do Brasil”. De fato, se a implementação de todos os elementos previstos na NDC brasileira for levada em conta, ela pode mesmo vir a ser esse novo paradigma. Resta saber como e com que velocidade a ambição climática brasileira será tocada. 

Dada a importância da nova NDC brasileira para o próprio conjunto das políticas públicas nacionais, a Política por Inteiro preparou uma análise especial sobre o assunto. Também tentamos entender como essa banda vai tocar.

… E habemus mercado regulado de carbono também!

Ou melhor, teremos daqui a pelo menos seis anos. O importante é que agora a precificação das emissões tem um cronograma. Em novembro, o Brasil deu um passo essencial no caminho para honrar seus compromissos no Acordo de Paris com a aprovação do projeto de lei que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). A proposta ficou travada no Congresso por nove meses, e foi aprovada em uma semana no Senado e na Câmara.  

“Finalmente a política climática brasileira contará com um instrumento de regulação de emissões, colocando o Brasil junto de pares que adotaram mercados de carbono há mais tempo. Que seja uma nova era para a implementação dos compromissos climáticos nacionais”, afirmou a presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell.

O projeto foi sancionado pelo presidente Lula, tornando-se lei em 12 de dezembro, e reúne os principais elementos para induzir a indústria e o setor energético a abandonar de vez os combustíveis fósseis até a metade do século.

MUNDO

COP Biodiversidade vai ter Bis

Com menos holofotes que sua “irmã mais velha”, a COP da Biodiversidade encerrou de maneira melancólica sua 16ª edição às portas de novembro, em Cali, na Colômbia. Encerrou não, deu uma pausa. Será retomada noutro continente e, esperamos, noutro espírito de resolução dos países: a COP-bis será em Roma, na Itália, de 25 a 27 de fevereiro de 2025

À exceção da decisão de ampliar a participação de povos originários e de comunidades locais nas tomadas de decisão no âmbito da Convenção da Diversidade Biológica (sem necessariamente ter dito como isso acontecerá), a COP-16 não deve deixar saudades. A Política por Inteiro acompanhou de perto as negociações pela biodiversidade e preparou uma análise a respeito.

Em novembro, foram emitidos 23 reconhecimentos de situação de emergência e calamidade pública, atingindo 125 municípios brasileiros. A estiagem impactou 90 municípios, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do país. A seca se concentrou no Nordeste e no Sudeste, com maior força nos estados do Rio Grande do Norte e de Minas Gerais. As tempestades seguem sendo mais registradas no Sul e no Sudeste, de maneira pontual. Um incêndio florestal foi registrado no Pará.

TÚNEL DO TEMPO

Capa da análise mensal - novembro de 2020

Em novembro de 2020, a análise mensal da Política por Inteiro destacava a movimentação do governo federal para estudar a fusão de IBAMA e ICMBio. O assunto gerou uma análise de nossa equipe naquele mesmo mês. E não era blefe: uma portaria chegou a ser instituída, com a finalidade de criar Grupo de Trabalho para “analisar potenciais sinergias e ganhos de eficiência administrativa em caso de eventual fusão”. Não precisa ser mestre em Administração Pública para saber que autarquias com tão pesadas e complexas atribuições – como licenciamento ambiental, fiscalização e gestão de Unidades de Conservação em um país imenso – não podem se tornar mais eficientes se compartilharem (e sobrecarregarem) a mesma área-meio. A menos que eficiência signifique inoperância. Aliás, foi justamente para exercer sua especialidade contando com um corpo administrativo próprio e independente é que o ICMBio fora criado, em 2007. Felizmente, o assunto é um não-problema no atual mandato federal, mas é importante que a memória seja sempre exercitada, a fim de que a sociedade não aceite retrocessos em qualquer época. Para 2025, a expectativa da Política por Inteiro é que a gestão de áreas protegidas avance tanto na criação de novas Unidades de Conservação, quanto na implementação das já existentes.

TERMÔMETRO DO MÊS

Com o fim de novembro e eventos como a COP-29 e o G20 já no espelho retrovisor, está “inaugurada” a trilha Baku-Belém. A Política por Inteiro acredita que os resultados (bem) aquém do esperado na última COP trarão um rebatimento direto no trabalho da Presidência brasileira, que deverá ser dobrado em matéria de articulação e mobilização dos demais países. Não bastasse, o mundo volta a viver um momento de “lampejo de extremos”, a exemplo do retorno de Donald Trump à Casa Branca dentro de poucos dias. Assim, pautas como protecionismo econômico (disfarçado ou não de nacionalismo), negação a dados científicos e imposição de novas barreiras para o comércio justo devem “bagunçar” a geopolítica mundial.

É como receber novos vizinhos no condomínio e, além de não poder contar com eles para nada que diga respeito à vida em comum, ainda ter que aceitá-los fazendo baderna a qualquer hora do dia, dentro ou fora de casa. Como o Direito Internacional não tem uma “polícia” a ser acionada para restabelecer alguma ordem, em 2025 e adiante resta conviver com esses vizinhos e não desistir de criar meios que os demova das ideias que perturbam os demais moradores.

O Brasil nunca chegou a ter sido empossado como síndico, mas é visto pelos condôminos como aquele morador “boa gente”, bom de conversa, que tem trânsito com todo mundo. Traduzindo: muitos esperam que ele vá bater à porta dos “desalinhados” para conversar e tentar soluções de consenso. Como os consensos na vida real envolvem dinheiro para financiar freios diante da desordem (climática), não será uma tarefa fácil. E estamos todos premidos pelo tempo escasso.

Dentro de casa, o “síndico extraoficial” também tem suas dores e desafios particulares. E dos grandes: manter a casa em ordem é difícil por si, e ainda precisa conter os vazamentos. “Casa em ordem” envolve continuar mantendo o desmatamento em queda (o que vai ficar mais difícil a partir agora, do que era em 2023 e 2024), o estímulo à nova industrialização, o ritmo de reconhecimento de territórios quilombolas e a aceleração nas “declaratórias” do MJSP e na demarcação de terras indígenas; “conter os vazamentos”, por sua vez, dependerá muito do que virá do pessoal que habita o quarto da Energia, que tem no Plano Nacional de Transição Energética a chance de plantar algo realmente transformador na trajetória de descarbonização do Brasil. Até o momento, a estrutura desenhada para o plano ainda esbarra em prazos burocráticos para que o Fórum Nacional de Transição Energética (Fonte) – principal espaço de formulação, implementação e monitoramento do Plano – seja constituído e inicie seus trabalhos. Acontece que 50% do tempo de mandato já ficou pra trás, lembrete óbvio, mas que também importa a outros temas, como Bioeconomia, Oceanos, Cidades Verdes Resilientes, entre outros que precisam deslanchar.

Por falar em deslanchar, também é esperado que a “perna” de mitigação do Plano Clima se fortaleça e já ganhe funcionalidade em 2025. Isso porque em 2024 a prioridade foi para a Adaptação climática, que já avançou em uma Estratégia Nacional, difundida pelos variados setores e andares da casa. Aliás, o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (principal pacote de obras dentro da casa) segue precisando beber nessa fonte se quiser realmente propor uma infraestrutura resiliente ao clima.

A “família” brasileira é grande, e a casa comporta “parentes” com visões de mundo bastante distintas. Por isso, o chefe de família vive numa linha tênue entre articulações bem-sucedidas versus desgastes com a parentada. A aprovação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (que também atende pelo nome de Mercado Brasileiro de Carbono) foi uma prova de que essa articulação aqui-e-acolá dá seus resultados. É importante lembrar que, há pouco tempo, toda a “família” assinou um Pacto pela Transformação Ecológica (e consentiu até um Comitê para acompanhar seu cumprimento!), que precisa ser colocado sobre a mesa da sala e lembrado a cada refeição. A relação conflituosa que persiste entre os quartos Legislativo e Judiciário, que na casa estão de frente um para o outro, precisa acabar. E um teste importante para selar a harmonia nesse lar é a resolução do impasse sobre o marco temporal, cuja comissão especial de conciliação criada pelo STF, em agosto, teve de ser prorrogada, no mínimo, até 28 de fevereiro de 2025. Indício de que o diálogo pode estar mais amarrado do que se esperava.

Seja na casa chamada Brasil, ou no condomínio chamado Mundo, em 2025 não haverá monotonia.

(O conteúdo desta Análise Mensal é feito totalmente por humanos. E para humanos)

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