(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
- Introdução
- Tá Lá no Gráfico
- Monitor de Atos Públicos
> Governança
> Mitigação
> Adaptação
> Financiamento - Balanço 2024: Quadro de Medalhas
- Destaques do Mês
👎 Atravessou o samba!
👍 Tá afinado! - Brasil
> Difícil “descer para BC” 🎶
> 2055: Cenários da Transição Energética - Mundo
> Take America from the past again (Traga a América do passado de novo)
> E não foi só Acordo de Paris, não
> “Sala de Comando” do capitalismo global já entendeu o risco climático - Monitor de Desastres
- Túnel do Tempo
- Termômetro do Mês

Janeiro, o mês que não terminava nunca – a ponto de isso virar tão meme na internet quanto os meses de agosto – se mostrou essencial para entender o que se desenha em matéria de política climática, dentro e fora do Brasil. Quem porventura passasse um mês inteiro hibernando entre o Réveillon e 1º de fevereiro, teria muitas dificuldades em entender o mundo de agora.
Enquanto as manchetes tiveram uma overdose de Donald Trump e de sua deliberada inundação de encrencas (“trumping point”, como bem disse o cientista Carlos Nobre, em evento promovido pela Talanoa em fevereiro), balões de ensaio e atos oficiais imediatamente após sua posse, aqui no Brasil – mesmo no usual recesso da atividade legislativa – o Executivo tratou de sancionar leis com rebatimentos importantes ao clima, cujos projetos haviam sido aprovados pelo Congresso no apagar das luzes de 2024. Um exemplo foi a Lei das Eólicas Offshore, que, com vetos, trata do aproveitamento da força dos ventos em zonas marinhas para produção de energia elétrica ao país. Outro, a que proíbe a importação de resíduos sólidos e de rejeitos, setor onde estão cerca de 4% das emissões brasileiras de gases estufa.
Ainda teve espaço para o lançamento de mais um Programa de Aceleração – mesmo prenome de batismo do famoso PAC, prioridade de governos petistas – mas, dessa vez, supostamente, para transição energética: o Paten. Apesar de o Ministério de Minas e Energia (MME) anunciar que se trata do “maior programa de financiamento a juros baixíssimos para transição energética da história do Brasil”, com “mobilização de até R$ 600 bilhões” para “ampliar a geração e o uso eficiente de energia de baixo carbono, descarbonizar o transporte e substituir fontes fósseis”, por ora, o Paten é mais uma sigla que ainda aguardamos engrenar nessa sopa de letrinhas pela descarbonização. Emprestando das aulas de Física, até aqui, a política nacional (PNTE), o plano nacional (Plante) e o fórum consultivo com a sociedade (Fonte) ainda são tudo de energia potencial, nada de energia cinética. O Paten poderá seguir a linha do “irmão mais velho” PAC e ser prioridade do governo? O tempo de mandato já passa da metade…
Mas janeiro também não veio só confundir, veio esclarecer. Ao retomar suas atividades nos primeiros dias do ano, a Política por Inteiro lançou 3 perguntas no ar, que, com o passar das semanas, foram sendo respondidas uma a uma: finalmente habemus Presidência da COP; o Secretariado da Convenção do Clima anunciou prorrogação de prazo até setembro para a submissão dos novos compromissos climáticos oficiais (NDCs) dos países, olhando para metas daqui a 2035; e Belém deve mesmo – ainda que sem ateste oficial, o que normalmente acontece no meio do ano – ser sede da COP30.
Recuperando-se dos sustos com a saúde, Lula acabou com a dúvida que pairava desde a COP29, sobre quem conduzir à Presidência da COP30. O embaixador André Corrêa do Lago, ladeado da secretária nacional sobre mudança do clima, Ana Toni, como diretora-executiva, recebeu a desafiadora missão de presidir a COP30, trabalho que, na prática, já começou. A dupla tem tarefas espinhosas tanto dentro – entre um parlamento desatento e fogos amigos – quanto fora de casa, em estimular ambição climática nas negociações entre países em pleno ano de novos compromissos oficiais (NDCs) a serem submetidos à Convenção do Clima.
Pra completar, a conjuntura internacional não colabora. 2024 foi o ano com mais conflitos simultâneos pelo mundo desde o final da 2ª Guerra Mundial. O multilateralismo vem sendo cada vez mais posto à prova. E o enfrentamento da questão climática depende muito das capacidades de diálogo e de cooperação que ele potencializa. Se esperarmos apenas da autonomia e do senso de urgência de nações cujos líderes cada vez mais guinam a extremos, acenando a pautas que não fecham só as portas para imigrantes, como também para o enfrentamento de questões universalistas por natureza, como o clima, estaremos fritos. Literalmente.
Janeiro se encerrou às portas de Eleições no Congresso Nacional, das quais sagraram-se vencedores Hugo Motta (Republicanos/PB), na Câmara, e Davi Alcolumbre (União Brasil/AP), no Senado. Enquanto o primeiro está afinado com o agronegócio, o segundo defende com veemência a pauta do petróleo na Margem Equatorial. Vende a ideia de que o Amapá, seu estado natal, seria um dos principais beneficiados economicamente com a exploração. O andamento dessa agenda, especialmente se a licença do IBAMA realmente estiver a caminho, consolida o espaço político local de Alcolumbre para possivelmente uma vida inteira, como um “padrinho” do “desenvolvimento” e da “geração de empregos” que o petróleo pode gerar no Extremo Norte do país. O que os arautos de mais fósseis no mundo não explicam à sociedade é como o Brasil fará diferente do que fez até agora, em termos de resolução de problemas sociais e de infraestrutura de serviços públicos, a exemplo de municípios que, no passado, já cederam ao mesmo “canto da sereia” do petróleo, como é o caso de Campos dos Goytacazes/RJ, entre outros fluminenses. Até aqui, a História mostra que dividendos econômicos oriundos de mais petróleo não resolveram problemas nem locais (carências sociais), nem globais (mudança climática). Muito pelo contrário, têm aumentado a conta social e ambiental no Brasil e no mundo. Aí estão, mundo afora, os eventos climáticos extremos, sem trégua, confirmando o que a Ciência do Clima anuncia já não é de hoje…
Enquanto isso, crescem as expectativas para a COP30 no Brasil. O mundo precisa de uma COP da Implementação!
Tá Lá no Gráfico
Durante janeiro, o Tá Lá no Gráfico repercutiu a Ciência do Clima alertando que, assim como em 2023, nosso planeta quebrou de novo o recorde de ano mais quente da história, mas que ainda temos tempo de evitar estourar o famigerado 1,5ºC de aumento da temperatura média global. E não só isso. Em ano de COP no Brasil, explicou qual o real papel de um Presidente na Conferência da ONU sobre Mudança do Clima. Trouxe, ainda, o papel dos minerais estratégicos (que também podem ser críticos) na necessária transição energética que o Brasil precisa pôr em marcha se quiser alcançar o patamar de emissões líquidas zero até 2050.
Monitor de Atos Públicos
Em janeiro, foram captadas 30 normas relevantes para a política climática brasileira.
A classe mais frequente do mês foi Planejamento, com 14 normas, seguido de Regulação (7) e Lei (5). Já o tema mais presente foi Terras e Territórios com 9 atos, seguido de Institucional (5) e Energia (5).
Neste mês, a distribuição das normas entre as agendas climáticas ficou concentrada entre Governança, com 19 normas, com Mitigação em 2º lugar, com 6. Já na agenda de Financiamento foram captados apenas 5 atos. Nenhum ato de Adaptação detectado.
Agendas
Governança
Agenda mais movimentada do mês de janeiro, Governança teve como um dos destaques a criação de três Comitês em importantes políticas transversais à pauta climática. O Comitê Gestor do Programa Cidades Verdes Resilientes e o Comitê Gestor Interministerial do Programa Periferia Viva, políticas lançadas em junho e em novembro de 2024, respectivamente. Ainda, o Comitê Permanente de Resiliência Climática, ligado ao Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR), e que se compromete, em texto normativo vago, a “promover uma abordagem holística para enfrentar desafios específicos relacionados às mudanças climáticas”. A ver.
O Fórum Nacional de Transição Energética (Fonte), instância consultiva essencial para a elaboração, a implementação e o acompanhamento do Plano Nacional de Transição Energética (Plante), tem agora um Edital de Seleção de representantes da Sociedade Civil. Com 87 assentos projetados (29 para cada segmento – governo, empresariado e OSCs), o processo de seleção inteiro está previsto para ser concluído em 4 meses e meio. O Fonte estará em condições de funcionamento a partir de meados de maio, somente.
No tema florestas e vegetação nativa, ainda deu tempo de o Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo, braço operativo da Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (PMIF) – outra emplacada em 2024, no contexto de um Brasil em chamas – passar a ter regimento interno.
Mitigação
Reproduzindo a tendência observada ao longo de 2024, os atos alocados em Mitigação, no Brasil, representam o esforço na agenda de ordenamento territorial, com protagonismo da dupla INCRA-MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar), responsáveis pela criação de um pequeno assentamento em Mato Grosso, e dois reconhecimentos de terras de quilombo, um em Goiás e outro no Maranhão, mas não somente: uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) foi oficialmente reconhecida em Minas Gerais e, além disso, um ajuste do Congresso, com sanção do Executivo, atualizou os limites do Parque Nacional Serra do Itajaí, importante Unidade de Conservação em Santa Catarina. Essa alteração levou a uma residual ampliação (154 ha) na extensão territorial da UC, no estado barriga-verde.
Adaptação
Sem normas em janeiro (e esperando que tenha sido o único mês do ano assim!), a expectativa é pelo lançamento, para consulta pública, do Plano Clima Adaptação, que deve ocorrer nos próximos dias. Vale lembrar que a Estratégia Nacional de Adaptação (ENA), que antecede o Plano, foi concluída no 2º semestre de 2024, fruto do trabalho de mais de uma dúzia de ministérios na Esplanada, encabeçados pelo MMA.
Financiamento
As ações ligadas a Financiamento em janeiro se concentraram em 3 frentes.
A primeira revisou diretrizes e prioridades nos Fundos Constitucional (FCO) e de Desenvolvimento (FDCO) do Centro-Oeste, que passam a priorizar investimentos alinhados ao Plano de Transformação Ecológica do Brasil e, ao mesmo tempo, vedam investimentos em infraestrutura cujos proponentes “tenham dirigentes condenados por trabalho infantil, escravo ou crime ambiental” e/ou “deixem de minimizar devidamente os impactos ambientais”. Convenhamos: nada de incremental aqui. Fosse dito na linguagem de internet, certamente viria com o meme da plaquinha levantada dizendo “parabéns, não fez mais do que sua obrigação!”.
A primeira é a que cria o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), mecanismo financeiro que merece observação nos próximos meses, entre regulamentações e funcionamento prático; e
A segunda vem do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e se refere ao estabelecimento de critérios para enquadrar e incentivar projetos de ganho de infraestrutura natural e/ou artificial em Unidades de Conservação que mereçam prioridade para a emissão de debêntures, papéis com juros a menor em relação a empréstimos bancários tradicionais, emitidos por empresas para alavancar negócios privados, nesse caso, infraestrutura para visitação de UCs e recuperação de vegetação nativa.
BALANÇO 2024:QUADRO DE MEDALHAS
(DO ACORDO) DE PARIS
Já pode parecer distante no radar, mas lembra que 2024 foi ano de Olimpíadas?! Pois é. Unindo nosso dever de ofício em acompanhar as ações de governo que caminhem em direção às metas climáticas previstas no Acordo de Paris, com a satisfação de ver nossos atletas brilhando nas Olimpíadas de Paris, durante o ano que passou tivemos a seção Quadro de Medalhas. Uma forma de dar visibilidade a órgãos e entidades da Administração Pública federal que tenham se esmerado em atuar pelo clima, mês a mês.
Após a derradeira Análise Mensal, chegamos a um campeão: o Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA) obteve 3 medalhas de ouro e 1 de bronze, totalizando 4 medalhas. Em 2º lugar, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que apesar de “medalhar” mais, ficou atrás no número de ouros (percebeu que a gente conta igualzinho como nas Olimpíadas, mesmo?!). Em 3º lugar, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, com 2 ouros.
A verdade é que, ao longo do ano, a dupla MDA-INCRA acelerou entregas ligadas a ordenamento territorial, que repercutem diretamente na capacidade da sociedade em conter as chagas do desmatamento e da degradação florestal, sempre com finalidades que ignoram que o planeta fica mais quente (e desregulado!) sempre que um hectare de floresta se vai. Juntos, são a principal causa de emissões de gases estufa no Brasil – o chamado setor de “Uso da terra e florestas”. De quebra, a institucionalidade trazida pela ação da dupla reforça o tecido coletivo, como as Comunidades Remanescentes de Quilombos e outros povos e comunidades tradicionais, cujos meios e modos de vida são alinhados à sustentabilidade e, na linguagem do clima, à resiliência climática.
Que a dupla MDA/INCRA siga firme nas entregas, passando a limpo uma história brasileira longa em acentuar desigualdades.
Pódio final

🥈
Ministério do Meio Ambiente (MMA)
2 ouros
10 no total
🥇
Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA)
3 ouros
4 no total
🥉
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)
2 ouros
2 no total

👎 DESTAQUES DO MÊS 👍
👎 Atravessou o samba!
Inaugurando a nova seção das Análises Mensais da Política por Inteiro em 2025, quem atravessou o samba com vontade em janeiro foi a trupe Trump-Big Techs. Palmas, só-que-não! Quando Trump tomou posse, em 20 de janeiro, os CEOs das principais empresas de tecnologia do Vale do Silício estavam todos lá. Todos bilionários, ladeados e uníssonos em reverência a uma autoridade que não só nega a Ciência do Clima, como tratou de, nos primeiros minutos de sua nova administração, dar ordem oficial para que os EUA se retirem (novamente) do Acordo de Paris.
Com o mundo em tendência de desglobalização – ao mesmo tempo em que precisa ser mais unido do que nunca para enfrentar a questão climática que toca a todos – aqueles que detêm as grandes arenas digitais do planeta deveriam gerar meios para estimular o empoderamento social e evitar grandes estragos coletivos. Políticas climáticas deveriam, por motivos de sobrevivência dos próprios usuários das redes, ser bandeira principal nessa luta. Não vemos isso nas big techs. Travestida de liberdade de expressão, a sanha pela criação de mundos paralelos e que encomendem qualquer verdade conveniente não jogará a favor do clima.
👍 Tá afinado!
O primeiro Tá Afinado! de 2025 não poderia ser outro: vai para a dupla formada pelo economista e diplomata de carreira André Aranha Corrêa do Lago e a Secretária Nacional sobre Mudança do Clima, Ana Amélia Campos Toni, nomeados para presidência e diretoria-executiva da COP30, respectivamente. Um alívio e ao mesmo tempo um fôlego de esperança para quem, como nós, da Política por Inteiro, esperava experiência, conhecimento sólido e habilidade de interlocução para conduzir os rumos de uma Conferência que precisa ser o ponto de virada da agenda climática global.
Discorremos mais sobre a acertada escolha da dupla em um artigo especial.
BRASIL
Difícil “descer para BC” 🎶
Alívio institucional, porém, sem descanso para a crise de ansiedade que a emergência climática gera. Janeiro trouxe manchetes de chuvas intensas, enchentes e enxurradas: o litoral de SC ficou debaixo de água e, quem “desceu pra BC”, teve dificuldades para subir. A Secretaria de Estado da Proteção Defesa Civil de Santa Catarina reconheceu surpresa diante do volume de chuva registrado, admitindo que a quantidade de água superou todas as previsões. Em nota, clamou por adaptação dizendo que “é urgente que a meteorologia, assim como outras ciências, se adaptem a essa nova realidade do clima no planeta. É urgente que nos preparemos para medidas futuras de investimento global, preparação e resiliência das cidades”.
E a chuva não caiu apenas no Sul. O mês de janeiro mais quente da história, segundo o Serviço Climático Europeu Copernicus, também registrou chuva na maior parte do território brasileiro. Teve seca no nordeste, enchentes em São Paulo, onda de calor nos Rios de Janeiro e Grande do Sul.
2055: Cenários da Transição Energética
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) lançou, em janeiro, o primeiro caderno do Plano Nacional de Energia (PNE) 2055. O estudo traz as principais tendências e incertezas para o futuro energético do Brasil e será insumo para a elaboração do Plano Nacional de Transição Energética (Plante).
No caderno, cinco cenários exploram diferentes futuros para a descarbonização no país:
- Transição para todos: Bem-sucedida, ancorada em uma governança multilateral fortalecida e equilibrada.;
- Transição para quem? Parcialmente sucedida, com priorização desigual de setores e grupos.;
- Transição desperdiçada: Cenário de oportunidades perdidas e retrocessos.;
- Transição para quê? Governança fraca limita e lentifica o progresso.;
- Transição bloqueada: obstáculos e aumento da oferta de combustíveis fósseis impedem a descarbonização.
Vale (o próprio MME) conferir.
MUNDO
Take America from the past again (Traga a América do passado de novo)
Trump voltou à Casa Branca oficialmente no dia 20 de janeiro, “daquele jeito”: chegou chegando. E já tomou posse assinando um lote de decretos que radicalizam a política americana e obstaculizam a política climática em todo mundo. Com nada de diplomacia, o trumpismo concretizou o pedido de saída dos EUA do Acordo de Paris (yes, again) e se comprometeu com o passado ao apostar no “Drill, baby, drill!” (um de seus slogans, algo como “Perfure, meu bem, perfure!”), em incentivo à exploração de combustíveis fósseis e minérios no subsolo estadunidense.
Na ironia de um destino que já é há tempos alertado, no mesmo mês o fogo se alastrou (em pleno inverno!) em regiões da Califórnia, causando perdas, danos e comoção aos eleitores de um dos maiores porta-vozes do negacionismo climático: 150 mil pessoas tiveram de deixar suas casas e chegou a haver cerca de 1,5 milhão de outras residências sem energia elétrica em toda a região. Veículos de imprensa locais noticiam que 29 pessoas morreram.
Trump preferiu culpar o governo estadual (liderado pelo democrata Gavin Newsom, foto a seguir) e seus pronunciamentos ignoraram qualquer percepção sobre a necessidade de esforços de adaptação climática. Insistiu na reação, argumentando que Newsom não se importou com a quantidade de água que seria necessária para conter as chamas. Newsom, in loco, respondeu: “Não existe mais temporada de incêndios. É ano de incêndio, o ano inteiro”.

O tom imperialista característico de Trump ameaça o sistema multilateral e uma diplomacia pelo clima, além de esvaziar fontes humanitárias importantes – como a USAID, agência de cooperação estadunidense que aportava recursos em projetos pelo mundo – sob pretexto de que “a América vem primeiro”.
E não foi só Acordo de Paris, não
Para além da saída do Acordo de Paris, o 1º mês do governo Trump trouxe a revogação de 11 políticas ambientais e climáticas da gestão anterior, entre ordens executivas e memorandos. Essas políticas tratavam de temáticas transversais à pauta climática, tais como saúde pública frente à crise climática, refugiados climáticos, justiça ambiental, combustíveis limpos e proteção de plataformas continentais frente à exploração de petróleo e gás, entre outras. A retirada dos EUA do Acordo de Paris tem sido contestada por amplos setores da sociedade civil, amparadas pela Climate Coalition Campaign, Natural Resources Defence Council e um grupo de mais de 125 representantes democratas, em uma iniciativa que demanda a reversão da decisão.
“Sala de Comando” do capitalismo global já entendeu o risco climático
Ainda em janeiro, o Fórum Econômico Mundial (WEF) divulgou seu habitual Relatório de Riscos Globais. Entre os itens da edição 2025, uma pesquisa de percepção chamou a atenção: representantes do Grande Capital entendem que, no curto prazo (próximos 2 anos), eventos climáticos extremos serão o 2º maior risco aos negócios, perdendo apenas para a desinformação. A médio prazo (próximos 10 anos), metade dos 10 maiores riscos globais será proveniente de fatores ambientais. O “exaurimento de recursos naturais” e uma “mudança severa nos sistemas terrestres” estão na lista de preocupações do Grande Capital.
Então… O que está faltando?

MONITOR DE DESASTRES
Em janeiro, o Monitor de Desastres captou 61 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que atingiram 173 municípios. As Tempestades (chuvas intensas, granizo, raios, vendavais e tornados) foram os eventos mais registrados, iniciando a tendência do primeiro trimestre do ano.
Só em Minas Gerais, estado que sofreu com a seca no final de 2024, foram registradas 53 situações de emergência devido ao grande volume de chuvas neste mês. No entanto, a Estiagem e a Seca ainda são recorrentes, principalmente na Região Nordeste, bastante concentrada nos estados da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

TÚNEL DO TEMPO
Na edição de janeiro de 2022, um dos destaques era o decreto que regulava a cessão de uso em ambiente offshore (isto é, no mar, longe da terra, mas ainda dentro dos limites territoriais de um país), para que empresas privadas explorem o potencial brasileiro de gerar energia a partir da força dos ventos. À época, a norma era aguardada pelo empresariado do setor como garantia de maior segurança jurídica. Com o decreto, o Ministério de Minas e Energia (MME) assumiu a competência para a cessão das áreas. Três anos mais tarde, em janeiro de 2025, o Brasil dá um salto adiante e passa a ter uma Lei que disciplina o aproveitamento eólico offshore. A lei absorve conceitos do decreto de 2022 e indica direções para detalhamentos regulatórios adiante. Uma evolução da Lei, em relação ao Decreto, é que, a partir de agora, a autorização (“outorga”) para exploração energética das áreas marinhas (“prismas”) não poderá ser feita sem que as propostas estejam alinhadas ao Planejamento Espacial Marinho (PEM), principal instrumento de gestão do ecossistema marinho do Brasil. O PEM é elemento central de conciliação entre o desenvolvimento da chamada Economia Azul e a manutenção dos serviços ecossistêmicos oferecidos pelos mares à Humanidade. Grande parte desses serviços é vital para mitigar as causas das mudanças climáticas.
TERMÔMETRO DO MÊS
Janeiros costumam ser “de baixa” em matéria de política climática no Brasil, muito por conta do recesso da atividade legislativa, de férias em parte do Executivo e de compromissos internacionais, como o Fórum Econômico Mundial de Davos, que colaboram para um “espalhamento” do foco do governo. Ainda assim, o mês trouxe discretos avanços na governança de políticas criadas em 2024 – como os Programas Cidades Verdes Resilientes e Periferia Viva – e que podem ser bons instrumentos para acelerar a adaptação climática em áreas de baixa capacidade adaptativa, e altos risco e vulnerabilidade.
Com a nomeação da dupla Corrêa do Lago/Toni para liderar as negociações a serem puxadas pelo Brasil perante os países até a COP30, uma série de desdobramentos é aguardada, a começar da indicação dos high-level champions, que são, em verdade, articuladores com olhar e ação estratégicos que auxiliam o país a caminhar na costura por acordos multilaterais que empurrem o mundo pra frente em ambição pelo clima. O governo, que tem o imperativo moral de fazer o país arrastar pelo exemplo em nível doméstico, deve considerar esse contexto para promover uma Reforma Ministerial que não só adapte o governo ao “modo Eleições” visando 2026, como também acelere as entregas do ciclo de governo atual. Até porque um motivo retroalimenta o outro.
Em certa medida, essas entregas ainda se mostram represadas. Bons indicadores disso são atos formais ainda muito basilares sendo lançados em pleno “Ano 3”, como os de criação de comitês gestores e de regimentos internos de instâncias-motor de políticas relevantes, além de editais para preenchimento de assentos em fóruns vitais (vide o Fonte) que, por óbvio, ainda nem começaram a funcionar na prática. É razoável que os atos classificados como Planejamento sempre tenham espaço, posto que conjugar o verbo planejar na Administração Pública brasileira é sempre um constante reinventar-se diante de mudanças e contingências. O que não parece razoável é que a frequência de atos dessa natureza supere a frequência de atos de Regulação, que são desdobramentos necessários para que as políticas públicas sigam seu ciclo e entreguem resultados no mais breve tempo.
Quanto à conjuntura internacional, é manter o olhar atento e os cintos apertados. O Brasil precisará calibrar bem a energia dedicada entre BRICS, G20 e COP30, sem esquecer de desviar-se das minas terrestres colocadas no terreno da diplomacia por extremistas de caneta nas mãos. Apesar de o BRICS ser conduzido sob a lógica de que países emergentes devem reafirmar seu peso e influência político-econômica numa ordem global que flerta com uma “neo-bipolaridade” entre EUA e China, o amplo domínio chinês e a presença árabe no bloco podem ser usados como pretextos pelo resto do mundo para um corpo-mole diante das pretensões brasileiras de não só liderar a geopolítica climática, como também de lutar para que ela não se esfacele.