O que a MP do Eco Invest quer no fundo?

Foto: Canva

Anunciado há dois meses, no fim de fevereiro, o programa Eco Invest Brasil foi oficialmente criado nesta semana por Medida Provisória. Apesar da intenção positiva de destravar o fluxo de capital privado externo para financiamento climático, a MP 1.213 precisa ser urgentemente corrigida, seja com uma nova medida ou emendas no Congresso, para garantir a segurança jurídica da operação do mecanismo e, consequentemente, seu sucesso.

Instituído no âmbito do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC ou Fundo Clima), seu funcionamento deve respeitar os ritos de governança já estabelecidos no fundo. Entretanto, a MP desta semana determina a criação de uma estrutura à parte, sob o Ministério da Fazenda. Confira na análise da Política por Inteiro os caminhos para corrigir esse equívoco.

Enquanto isso, no mundo, foi a vez de a Organização Internacional do Trabalho (OIT) alertar que não apenas trabalhadores, mas os próprios lucros estão sob risco com o avanço da mudança do clima, que causa prejuízos que ultrapassam a esfera individual e familiar, atingindo a produção de riqueza das corporações e dos países, que precisam, pra já, agir para mitigar os efeitos da emergência climática.

MONITOR DE ATOS PÚBLICOS

O Monitor de Atos Públicos captou apenas 3 normas relevantes para a agenda climática entre os dias 22 e 26 de abril. A única classe registrada na semana foi Planejamento, nos temas Institucional e Outros.

Nota metodológica: A partir de janeiro de 2024, as normas de desastres, referentes aos reconhecimentos de situação de emergência nos municípios por eventos meteorológicos e climáticos extremos, deixam de ser contabilizadas no Monitor de Atos Públicos. O monitoramento contínuo passa a ser realizado exclusivamente no Monitor de Desastres.

Vem Conferência grande por aí… Não, não é a COP 

A 5ª edição da Conferência Nacional do Meio Ambiente e Mudança do Clima – CNMA deverá ocorrer entre 4 e 7 de fevereiro de 2025, em Brasília. O MMA oficializou o evento por meio de convocatória. O tema da Conferência está definido: “Emergência climática: o desafio da transformação ecológica”. Até lá, são esperadas rodadas prévias, preparatórias à Conferência, nos próximos meses.

MUNDO

Brasil tenta ressuscitar vaca morta

Em entrevista sobre o mercado de gás natural, o ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), Geraldo Alckmin, defendeu que o país deve investir na importação de gás natural da Argentina, oriundo da formação geológica chamada de Vaca Muerta. O gás natural do campo produtor argentino é extraído através do fraturamento de rochas por injeção de jatos d’água, o chamado fracking, método altamente danoso ao ambiente, em razão dos impactos subterrâneos causados, incluindo a liberação de metano.

Para o ministro, a produção brasileira, que é offshore, ou seja, na plataforma marítima, tem um custo muito alto comparado ao do país vizinho, onde a produção se dá onshore (em terra). Por isso, do ponto de vista da competitividade, a importação, segundo ele, seria um bom negócio.

Lembrando que em 2022 um despacho presidencial, da gestão anterior do governo federal, aprovou uma resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) para que os ministérios da Economia e Minas e Energia, em conjunto com a ANP e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), publicassem um edital para a qualificação ao projeto Poço Transparente, autorizando a aplicação do fracking na produção de petróleo e gás natural em terra no país. Já em 2023, o presidente Lula sinalizou, em passagem pela Argentina, a intenção de financiar o gasoduto  Néstor Kirchner, que levaria o gás de Vaca Muerta, na província de Neuquén, até a província de Santa Fé, perto da fronteira com o Brasil. O projeto seria financiado via BNDES.

Entre as idas e vindas do assunto, fica clara a sensibilidade climática e política do assunto. O fracking se torna mais uma questão chave ligada à posição do Brasil em relação à exploração dos combustíveis fósseis. Apostar em Vaca Muerta coloca o Brasil completamente em sentido contrário à economicidade, à descarbonização e, portanto, à transformação ecológica anunciada pelo país desde o ano passado. Às vésperas de uma COP-30, tudo o que não precisamos é de um greenwashing governamental na conta.


Trabalhos, trabalhadores (e lucros) sob risco, pela mudança do clima

Um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgado nesta semana estima que 70% dos trabalhadores do mundo deverão ser afetados em termos de saúde ou segurança por conta dos efeitos da mudança climática intensificada pela ação humana no planeta. Uma estatística assustadora (mas não surpreendente) trazida pelo estudo indica que, até 2030, cerca de 2,2% do total de horas trabalhadas em todo o planeta terão sido desperdiçados em função da crise climática, uma perda de produtividade equivalente a 80 milhões de trabalhadores em jornada integral (full-time).

Além disso, é estimado que apenas o estresse térmico provocado pela mudança do clima seja responsável por uma redução do PIB global em 2,4 trilhões de dólares até 2030 (relatório, p. 21). O relatório continua, dizendo que regiões do globo serão afetadas em intensidades diferentes, com Sudeste Asiático e África Ocidental sendo impactadas em torno de 50 vezes mais horas-homem desperdiçadas do que na Europa, o que reforça a validade do conceito de justiça climática, segundo o qual regiões econômica e socialmente mais vulneráveis sofrerão mais com a mudança climática do que regiões mais aquinhoadas.

O posicionamento emitido pela OIT é mais um a engrossar uma vasta lista de documentos de organismos internacionais, baseados em Ciência, a darem conta dos enormes prejuízos econômicos – para além dos individuais, familiares, sociais, ambientais, culturais, territoriais – causados pelas mudanças climáticas.

É difícil imaginar que tipo de racionalidade poderia justificar inação ou compromissos abaixo do necessário por autoridades nacionais, para manter o mundo caminhando em direção a esse penhasco de consequências, com prejuízos trilionários, e custos de remediação cada vez mais elevados à medida que o tempo passa. Faz cada vez menos sentido não agir pelo clima.

BRASIL

Ministro Gilmar Mendes bate palma pro Legislativo dançar

O capítulo mais recente da novela do marco temporal foi, nesta semana, protagonizado pelo ministro Gilmar Mendes, que abriu procedimento de conciliação sobre o assunto. O rito de conciliação proposto pelo STF deverá envolver partidos, entidades, representantes do Executivo e do Legislativo, além de AGU e PGR.

Como bem trouxe o Balanço 2023 da Política por Inteiro, o marco temporal foi um dos ingredientes que acirraram o conflito entre o Judiciário e o Legislativo no ano que passou. Uma tentativa de abrandar esse acirramento pode explicar, em partes, a decisão de Gilmar, já que a proposta de conciliação, em tese, poderia ajudar a distensionar a relação entre os dois Poderes, com reflexos no Executivo, que tem por obrigação fazer cumprir as decisões deles provenientes.

Acontece que, junto à proposta de conciliação, a decisão de Gilmar também suspendeu a tramitação de todas as ações judiciais em curso que argumentem a inconstitucionalidade da tese do marco temporal, atrasando julgamentos aguardados por diversas etnias. Para completar, enquanto isso segue valendo a “Lei do Marco Temporal”, cujos vetos de Lula foram revogados pelo Senado no apagar das luzes de 2023, em desfavor do apelo indígena.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) comemorou os movimentos de Gilmar. No entanto, o ministro fixou prazo de 30 dias – juridicamente considerado exíguo para um debate tumultuado – para que todas as partes interessadas alcancem um suposto consenso.

A pergunta que fica é: se conciliação, até onde sabemos, consiste em todos os lados abrirem mão de algo em nome de um “meio-termo”, o que mais os indígenas teriam de perder em nome desse consenso?

AMAZÔNIA

Indígenas interditam rodovia federal no Pará

Nesta semana, um episódio no Pará mereceu atenção: cerca de 150 habitantes da Terra Indígena Mãe Maria, etnia Gavião, interditaram a rodovia BR-222, na altura do município de Bom Jesus do Tocantins, sudeste paraense, uma das principais vias de abastecimento e escoamento da produção naquele estado. A interdição foi a forma que indígenas encontraram para reivindicar a construção de uma escola indígena que atenda às comunidades, bem como a contratação de professores. O governo paraense, por meio de sua Secretaria de Educação, respondeu que a construção da escola está no cronograma de obras do estado, sem contudo dizer quando, precisamente, a demanda será atendida.

O episódio ilustra o que o Instituto Talanoa tem trazido com frequência nos conteúdos produzidos: a agenda climática não é e não pode ser somente sobre carbono. De nada adiantará as emissões serem reduzidas sem que direitos básicos da vida em sociedade sejam alcançados por todos, especialmente os historicamente mais fragilizados. O conceito de justiça climática, afinal, inclui garantir proteção e direitos fundamentais a segmentos vulnerabilizados ao longo da trajetória de desenvolvimento global, como é o caso da população indígena, no Brasil.

O caso deixa explícito que nem só de demarcação de terras vive a pauta indígena. É preciso que a sociedade pressione governos sobre a necessidade de o Brasil pensar política pública por inteiro, oferecendo aos povos indígenas os elementos básicos para o desenvolvimento de suas capacidades e liberdades, quer seja antes, quer seja após a demarcação de suas terras.

Em tempo: o artigo 14 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e o eixo 7 da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (PNGATI) salvaguardam os direitos à educação reivindicados pelos Gavião, no Pará.

LEGISLATIVO

Comissão de Meio Ambiente da Câmara tem nova presidência

Nesta semana, foi eleito o deputado Rafael Prudente (MDB/DF) para a Presidência da Comissão de Meio Ambiente da Câmara (CMADS), gestão 2024. Seus Vice-Presidentes ainda não foram definidos.

A primeira reunião da CMADS está agendada para 8 de maio, com pauta a ser definida. A Comissão é composta por titulares conhecidos, como Ricardo Salles (PL/SP), Baleia Rossi (MDB/SP) e Duda Salabert (PDT/MG).

MONITOR DE DESASTRES

O Monitor de Desastres captou 6 atos de reconhecimento de situação de emergência ou calamidade pública decorrentes de eventos climáticos ou meteorológicos extremos, ocorridos em 40 municípios. As tempestades foram registradas em várias regiões do país, principalmente no sul e sudeste. A estiagem segue permanente nos estados do nordeste, principalmente em Pernambuco, com um episódio de seca no Rio Grande do Norte. A classe Outros segue presente, nesta semana, apenas na região sul, devido à epidemia de dengue.

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Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO

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