Parâmetros frágeis criam incerteza na gestão de desastres climáticos

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A aceleração do aquecimento global, com o aumento da frequência de eventos extremos em todo o país, cobra uma política clara de gestão dos riscos climáticos. Até aqui, no entanto, encontram-se sinais confusos, a começar pelo indicador de capacidade adaptativa dos municípios. O Plano Plurianual 2024-2027, lei que orienta os gastos públicos da União no período de 4 anos, apresenta um indicador duvidoso para medir o sucesso da política pública.

Fonte: Nota técnica dos indicadores e metas do PPA 2024-2027/Reprodução
Esse indicador projeta o aumento de 40,93% para 43% da capacidade dos municípios de se adaptarem às mudanças climáticas. Além de um avanço muito pequeno, o indicador do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR) não reflete toda a ciência climática disponível no governo. Segundo a nota técnica sobre os indicadores e metas do PPA, o Índice de Capacidade Municipal (ICM) de prevenção, gestão de riscos e resposta a desastres e adaptação às mudanças climáticas dividiu os 5.570 municípios brasileiros em grupos, inicialmente por porte (pequenos até 100 mil habitantes e médios/grandes acima de 100 mil) e depois por prioritários ou críticos (lista da CPRM – atual Serviço Geológico do Brasil – de 2012 com 821 municípios, diz documento anexo ao PPA) e não prioritários. Essa lista de 821 municípios elaborada há mais de uma década trata-se de uma meta colocada à ocasião de se delimitar, nesses territórios, “os setores da região urbana com riscos alto e muito alto a deslizamentos e enxurradas”.

O ICM sozinho não tem calibragem para indicar o progresso da agenda de adaptação e a resiliência dos municípios, ainda que tenha sido realizada em 2023 uma atualização dos itens por ele avaliados. Trata-se de um instrumento que pode mensurar o preparo para uma resposta a desastres e intensidades sentidas hoje. Na elaboração do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil, atualmente em curso, por exemplo, o índice é abordado de forma conjunta com outros dois componentes na metodologia proposta de identificação de risco de desastres, em cenários de curto, médio e longo prazos.

O governo federal também tem trabalhado com uma lista de 1.942 municípios considerados críticos, como antecipado no relatório Política Climática por Inteiro, publicado pela Talanoa em novembro de 2023. Essa relação também foi estabelecida como uma ação emergencial, sendo elaborada com base na ocorrência de desastres decorrentes de enchentes, inundações e deslizamentos de terra. Ela não incorpora nem modelagens climáticas já disponíveis nem eventos como secas, como as que ocorreram na Amazônia recentemente, característicos de mudanças climáticas.

A plataforma AdaptaBrasil, do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), traz um volume maior de municípios com capacidade adaptativa baixa e vulneráveis às mudanças climáticas. Por exemplo, 66% dos municípios brasileiros (gráfico abaixo) têm baixa ou muito baixa capacidade de que seu sistema socioecológico se ajuste a possíveis desastres geo-hidrológicos de inundações, enxurradas e alagamentos. Isso delimitado somente a esse tipo de evento extremo. Os riscos climáticos englobam uma série de outros impactos, alguns já modelados no Adapta Brasil, como impactos em recursos hídricos (seca), saúde (epidemias) ou segurança energética.
Fonte: AdaptaBrasil, acessado em 19/01/2024 – https://sistema.adaptabrasil.mcti.gov.br/60004/2/2015/null/BR/municipio/
Sabe-se que o governo prepara, no âmbito do Conselho Interministerial sobre Mudança do Clima, uma estratégia e planos setoriais de adaptação. Essa definição ainda leva alguns meses de debates internos.

É recomendável que haja políticas emergenciais, de Proteção e Defesa Civil, que já orientem gastos públicos previstos no Plano de Aceleração do Crescimento, que prevê R$ 1,4 trilhões em investimentos até 2026. Mais recomendável ainda é que essas políticas sejam baseadas na melhor ciência disponível. Os cenários usados até aqui requerem não apenas maior precisão como resultados mais robustos diante da crise climática.

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