O Plano de Recuperação de Pastagens no Brasil e os debates sobre sistemas alimentares na COP 28

Foto: Reprodução/Canva
O papel central dos sistemas alimentares para o alcance dos objetivos climáticos tem ficado cada vez mais evidente na COP 28. Já nos primeiros dias, a declaração dos Emirados Árabes sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática foi assinada por 134 países, incluindo o Brasil. 

No entanto, no último rascunho do balanço global GST divulgado antes do dia da pausa nas negociações no meio das duas semanas de evento, a menção a agricultura e alimentação foi removida, contrariando a expectativa de que o assunto fosse, de maneira inédita, protagonista na Conferência das Partes da Convenção do Clima da ONU. A exclusão causou a reação de mais de 50 organizações, que se manifestam agora para tentar garantir o retorno da pauta ao texto final do GST.

Enquanto isso, no Brasil, foi publicado no Diário Oficial da União, o Decreto 11.815 que instituiu o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas em Sistemas de Produção Agropecuários e Florestais Sustentáveis (PNCPD). A iniciativa já havia sido anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na COP 28. Seu objetivo principal é promover e coordenar políticas públicas destinadas à conversão de pastagens degradadas em sistemas menos emissores: florestas plantadas, agroflorestas, integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), integração lavoura-pecuária (ILP), integração lavoura-floresta (ILF) e ainda, pecuária convencional intensiva em solo regenerado.

O PNCPD prevê o acesso a crédito, viabilizando financiamentos com recursos externos sem subvenção ou com recursos de programas existentes, que deverão estar vinculados à obrigação de investimento na conversão de pastagens degradadas em sistemas de produção agropecuários e florestais sustentáveis. De acordo com a norma, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), deverá auxiliar na captação de recursos externos, sem a necessidade de subvenção do Governo federal, para financiar as atividades desenvolvidas no âmbito do PNCPD.

O acesso ao programa é restrito às propriedades rurais em processo de regularização dos passivos ambientais, inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e com prioridade para os imóveis que tenham excedente de reserva legal e aos empreendimentos do agronegócio que contribuam para a segurança alimentar e o aumento da resiliência climática.

De acordo com o governo, a pretensão é recuperar e converter até 40 milhões de hectares de pastagens de baixa produtividade em áreas agricultáveis no período de 10 a 15 anos. O decreto diz que as metas serão estabelecidas por resolução, 90 dias após a primeira reunião do comitê gestor, também criado pelo decreto. O comitê é composto pelo governo (incluindo pastas e órgãos da ciência e das finanças), com o Mapa na coordenação,  participação de representantes do setor agropecuário, da agricultura familiar e da sociedade civil. Além de definir diretrizes e metas, o comitê deve monitorar e avaliar o programa.

Ao apresentar o plano, em Dubai, o Lula também assumiu como meta a recuperação de 40 milhões de hectares de pastagens degradadas, que superam os 30 milhões de hectares da meta de recuperação de pastagens degradadas do Plano ABC+ (2020- 2030). Porém, não chegam a metade dos 90 milhões de hectares de pastagens degradadas contabilizadas pelo Mapa no Brasil, sendo um terço desse total de pastagens “severamente” degradadas. Atualmente 78% das pastagens do país apresentam algum nível de degradação.

A estratégia mira na captura de carbono por meio da recuperação de pastagens degradadas, mas deixa subentendido que poderá haver ampliação do rebanho nessas áreas recuperadas, e não há política clara para as emissões de metano, decorrentes do processo de fermentação entérica do gado – depois do desmatamento, nossa principal fonte de emissão de GEE. As emissões de metano são ainda uma grande lacuna na política climática.

A questão agora é como vão se articular os diferentes planos (ABC+, PNCPD, Plano Safra, Planaveg) com os planos de mitigação que ainda estão sendo definidos pelos grupos técnicos de trabalho criados pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM).  

O governo já sinalizou que a agricultura de baixa emissão de carbono deveria ser uma prioridade no Plano Safra, mas isso ainda não virou realidade no primeiro plano do governo Lula, para as safras de 2023/2024. Em relação à vegetação nativa, o decreto coloca dentre os objetivos a recuperação da vegetação nativa de acordo com metas previstas nos compromissos internacionais assumidos, bem como as estabelecidas no Planaveg. No entanto, ainda não está claro como se dará a integração dessas políticas, evitando possíveis sobreposições das metas e dos resultados.

Do mesmo modo, o governo afirma que o decreto está conectado à política de transição ecológica do Governo Federal.  O Plano de Transformação Ecológica, apesar de muito anunciado, ainda consiste num conjunto de iniciativas divididas em eixos sem consolidação.

Assim como negociadores trabalham para incluir a agricultura efetivamente na conta no balanço global, ao Brasil signatário dessa agenda e grande contribuidor das emissões oriundas dos sistemas alimentares, cabe tomar medidas efetivas que posicionem o país na vanguarda de um novo modelo capaz de responder às necessidades do futuro.

Acesse todos os boletins da COP 28

Assine nossa newsletter

Compartilhe esse conteúdo

Realização

Apoio

Apoio