Análise mensal – Novembro 2023

Num mês preparatório para a COP 28, o governo brasileiro anunciou a redução do desmatamento na Amazônia e na Mata Atlântica. Contudo, no Cerrado a devastação segue em alta. Na busca por levar resultados e ações para a conferência em Dubai, o Executivo buscou enfatizar medidas englobadas em eixos do Plano de Transformação Ecológica – todavia sem apresentá-lo em suas minúcias.

Contribuindo para destacar a gravidade da crise climática, os eventos extremos se avolumam: ondas de calor no Rio de Janeiro e em São Paulo, tempestades no Sul, incêndios no Centro-Oeste. No cenário global, dados do observatório europeu Copernicus indicaram que, no dia 17 de novembro, houve, pela primeira vez, uma variação de temperatura média global acima de 2ºC em relação ao período pré-industrial. E, pelo sexto mês consecutivo, foi registrado o recorde de temperatura para o respectivo mês na série histórica do Copernicus. Isto é, foi o novembro mais quente da história, assim como o foi outubro, setembro… desde junho deste ano.

Monitor de Atos Públicos

Em novembro, foram captados 67 atos relevantes para a agenda climática. A classe mais frequente foi Regulação com 32 normas, grande parte relativa aos atos de reconhecimento e declaração dos territórios quilombolas, em consonância com a efeméride do Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro. Em seguida, na classe resposta, foram captados 23 atos, a maioria referente às declarações de emergência dos municípios por eventos climáticos extremos. Planejamento ocupou o terceiro lugar neste mês, com 6 atos.

Dentre os temas, o mais recorrente foi Terras e Territórios, com 34, superando Desastres que somou 23, resultado do grande número de reconhecimentos de territórios quilombolas, levando o Ministério do Desenvolvimento Agrário a ser a pasta que mais publicou normas de interesse para a agenda climática em novembro. Em seguida, o tema Floresta e Vegetação Nativa com 7 normas captadas.

NOSSA DESCARBONIZAÇÃO

Foram identificados 39 atos considerados de impacto positivo no processo de descarbonização da economia brasileira. 

Destaque para normas relativas ao combate ao desmatamento e degradação florestal, como foi o caso da PORTARIA GM/MMA Nº 833, DE 9 DE NOVEMBRO DE 2023 e PORTARIA GM/MMA Nº 834, DE 9 DE NOVEMBRO DE 2023, sobre a listagem de municípios situados no Bioma Amazônia considerados prioritários para ações. 

Destaque também para a norma que instituiu o Grupo de Trabalho Emergencial de Enfrentamento à Crise Climática nos Territórios Indígenas com a finalidade de articular, gerenciar, monitorar in loco e propor ações de ajuda humanitária e de proteção social e territorial para os povos indígenas afetados. 

Na parte territorial, foram reconhecidos e declarados 27 territórios quilombolas.Os atos captados estão distribuídos por origem no gráfico abaixo.

desmatamento

Desmatamento
[“Mitigação”] [“Financiamento”] [“Governança”] [“Adaptação”]

precificacao-das-emissoes

Precificação das emissões
[“Financiamento”] [“Governança”] [“Adaptação”]

governanca

Governança
[“Governança”] [“Adaptação”]

orcamento

Orçamento e Financiamento
[“Governança”] [“Financiamento”]

energia

Energia
[“Governança”] [“Adaptação”]

nota metodológica

Dada a transição do governo federal, a metodologia da POLÍTICA POR INTEIRO passou por uma revisão, na qual foram reformulados temas e classes e inserido mais um nível de sistematização das normas captadas no Diário Oficial da União, relacionado especificamente às agendas de mudança do clima. A partir de agora, os Balanços Mensais contarão com identificações (tags) para cada agenda do clima da qual pertencem as análises.

  • “Mitigação”
  • “Adaptação”
  • “Governança”
  • “Financiamento”
Queda do desmatamento na Amazônia [“Governança”] [“Mitigação”]
Ao contrário do que ocorreu nos últimos anos, o governo brasileiro divulgou antes da COP a taxa de desmatamento anual na Amazônia. A estimativa do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), apontou uma queda de 22% na perda de floresta entre agosto de 2022 e julho de 2023 em relação ao mesmo período anterior. A taxa de 9.001 km² de desmatamento é a menor em cinco anos. Assim, foi evitada a emissão de 133 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente (CO2e) na atmosfera, o que representa cerca de 7,5% das emissões do país, tendo como base o ano de 2020, último dado oficial disponível.

Outros dados apresentados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) confirmaram que o esforço para reduzir o desmatamento na Amazônia tem ido na direção correta:

  • Redução de 58% da taxa de desmatamento em Unidades de Conservação e alta de 320% dos autos de infração aplicados pelo ICMBio no mesmo período.
  • Queda de 42,1% do desmatamento nos 70 municípios considerados prioritários pelo MMA, que concentram 73% do desmate. Em relação aos Estados, as maiores quedas foram registradas em Rondônia (42%) e no Amazonas (40%). Já no Pará houve queda de 21%, e em Mato Grosso o desmatamento aumentou 9%.

Mais do que os bons números do Prodes 2023, sobre os quais já havia uma expectativa positiva, apesar de conter ainda meses do governo anterior, há de se comemorar a inclusão da degradação florestal como critério na lista de municípios na Amazônia considerados prioritários para ações de prevenção, controle e redução dos desmatamentos – e, agora, degradação.

Estudos científicos já apontaram que não apenas o desmatamento deve ser coibido para evitar o ponto de não retorno da Amazônia. A degradação florestal também contribui agudamente para reduzir a capacidade ecossistêmica do bioma. E é um fenômeno mais difícil de ser monitorado do que o desmatamento porque a cobertura vegetal segue, mas mais esparsa e menos biodiversa. A degradação igualmente emite gases do efeito estufa.

A mudança de abordagem foi formalizada em duas portarias. A primeira estabelece os novos critérios para edição da lista de municípios prioritários: 

  • área total de floresta desmatada igual ou superior a 80 km², no último período de monitoramento realizado; 
  • área total de floresta desmatada nos últimos três anos igual ou superior a 160 km² no último período de monitoramento; 
  • aumento da taxa de desmatamento em pelo menos três, dos últimos cinco anos
  • área total de floresta degradada no último período de monitoramento realizado pelo INPE, incluindo todas as classes de degradação, exceto “corte seletivo tipo 2”.

Traz também os critérios para edição e atualização da lista de municípios com desmatamento monitorado e sob controle. Em relação à norma anterior, foram introduzidos mais critérios, além da degradação. Ou seja, para o município ter seu desmatamento “monitorado e sob controle”, deverá cumprir 6 requisitos, dentre os quais possuir pelo menos 20% da área dos imóveis rurais inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e ativos (situação de “analisado”, “em regularização” ou “passível de emissão de Cota de Reserva Ambiental”), além de possuir pelo menos 30% da área equivalente ao total desmatado no último período de monitoramento do Prodes/INPE embargada. Em relação à normativa anterior, foram mantidos os critérios de:

  • possuir 80%  de seu território excetuadas as unidades de conservação de domínio público e terras indígenas homologadas, com imóveis rurais devidamente monitorados por meio do CAR e monitorados pelo Sistema Nacional de Cadastro Rural (SICAR);
  • ter desmatamento inferior a 40 km² nos últimos quatro períodos de monitoramento.

E retornam à listagem aqueles municípios que constarem da lista de municípios monitorados e sob controle e atingirem desmatamento superior a 40 km² no último período de monitoramento realizado pelo INPE.

A outra norma publicada traz a lista dos municípios. Em relação à anterior, foi incluído Manoel Urbano (AC), totalizando 70 municípios. Dentre eles, estão Boca do Acre, Manicoré, Lábrea, Humaitá e Apuí, que tiveram recentemente atuação da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) em ações de combate aos incêndios florestais e às queimadas.


Queda do desmatamento na Mata Atlântica [“Mitigação”]
Segundo novo boletim do Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD) Mata Atlântica (iniciativa de parceria entre a Fundação SOS Mata Atlântica, a Arcplan e o MapBiomas), o desmatamento no bioma caiu 59% nos primeiros 8 meses de Governo Lula (9.216 hectares entre janeiro e agosto/2023, sendo que no mesmo período de 2022 foram 22.240 hectares).


PPCerrado foi lançado [“Governança”] [“Mitigação”] [“Adaptação”] [“Financiamento”]
Com a queda do desmatamento na Amazônia, o esforço de conter a devastação da vegetação nativa se volta ao Cerrado. Após consulta pública em outubro, foi lançada a 4ª versão do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Bioma Cerrado (PPCerrado), vigente para o período 2023/2027.

O Plano está estruturado em 4 eixos:

  • Eixo I: Atividades produtivas sustentáveis
    • 55 metas
  • Eixo II: Monitoramento e controle ambiental
    • 42 metas
  • Eixo III: Ordenamento fundiário e territorial
    • 35 metas
  • Eixo IV: Instrumentos normativos e econômicos
    • 48 metas

No Eixo IV, destaca-se a meta “13.16.1.1. Elaborar um instrumento normativo com vistas a orientar sobre a emissão, integração e publicização de ASV e UAS”, referentes às Autorizações de Supressão de Vegetação (ASV) e autorização para Uso Alternativo do Solo (UAS). Quando do lançamento da Consulta Pública, o Secretário Extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial (SECD/MMA), André Lima, apontou: “(…) tem o desmatamento ilegal, tem o desmatamento legal, mas tem uma categoria que poucos falam (ou quase não se fala) que é o desmatamento aparentemente legal, bastante denunciado pela sociedade civil, com relatórios recentes mostrando uma série de fraudes e irregularidades em autorizações de supressão que tem que ser foco também de ação forte”.

A medida tem extrema importância, mas traz consigo um debate profundo sobre a segurança jurídica da validade de atos emitidos pelo Poder Público ao cidadão, ou seja, a complexidade de relações e ações entre um ato autorizativo e a sua invalidade. Além disso, e ao exemplo de outros sistemas recentes de integração de informações como o Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar), vale refletir sobre as dificuldades operacionais e de atualização das informações compartilhadas, especialmente com dependência de outros entes federativos que também possuem gargalos e problemáticas próprias.

Sobre esse ponto, no Eixo II há a meta “8.2.1.1. Desenvolver soluções para integrar Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural com dados de autorização de supressão, multas, embargos e desmatamento do Inpe e ao Gov.BR”, com prazo de cumprimento para 2025, sendo seu indicador de sucesso o número de soluções desenvolvidas.

É de se ressaltar a ótima iniciativa do Governo Federal em, uma vez mais, olhar para o Cerrado e com tantos objetivos e metas a serem alcançadas até 2027.

  O Cerrado teve alta de 3% no desmatamento, no período de agosto/2022 a julho/2023 em relação ao mesmo período de 2021/2022, 4ª alta anual consecutiva, tendo perdido 11.011 km² segundo dados do Inpe. 


Florestas e vegetação nativa [“Governança”]
Foram publicadas duas normas que avançam na proteção e utilização consciente dos recursos naturais. 

A primeira institui o Plano de Ação para Recuperação e Manejo de Florestas (Plano Floresta + Sustentável) com objetivos de:

  • apoiar o desenvolvimento florestal por meio de ações de reflorestamento e recomposição florestal; 
  • organizar atividades para o alcance dos objetivos nacionais e ações indicativas do Plano Nacional de Desenvolvimento de Florestas Plantadas e da Rede Floresta + Iniciativa Conexão Florestal; e 
  • promover o uso sustentável das florestas, estimulando as cadeias produtivas florestais e promovendo sua estruturação sustentável através do fomento à economia de base florestal em todo o território nacional.

Dentre as diretrizes, há a de fortalecimento do plantio para comércio, de interligação com outras políticas públicas como o Plano ABC+ e incentivo a ações relacionadas ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), Programa de Regularização Ambiental (PRA) e Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). A norma entrou em vigor em 1º de dezembro de 2023.

Especificamente quanto ao PRA, foi aprovada a minuta do Termo de Compromisso de adesão ao Programa, no âmbito do Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SICAR). A norma estabelece que a minuta será disponibilizada, na forma de formulário eletrônico, no âmbito do SICAR, como proposta de Termo de Compromisso a ser celebrado entre os proprietários ou possuidores rurais que optaram por aderir ao PRA e os entes federados estaduais e distrital que utilizam o mencionado sistema federal para implementação do CAR. 

O PRA foi criado pela Lei Federal nº. 12.651/2012 (Código Florestal) e permanece com pendências de implementação, tanto no âmbito federal quanto entre subnacionais. Tanto o PRA quanto o CAR são instrumentos fundamentais para um correto diagnóstico das propriedades rurais do país, bem como para planejar políticas públicas e realizar a fiscalização de modo mais inteligente e eficiente.

Conforme dados do último Boletim do CAR, após 11 anos de operação do Código Florestal, apenas 1,4% dos cadastros tiveram sua análise de regularidade ambiental concluída, totalizando 20.7 milhões de hectares.


Mais territórios quilombolas reconhecidos [“Mitigação”]
No Dia da Consciência Negra, foram reconhecidas e declaradas 27 terras de comunidades quilombolas, passo fundamental no processo de titulação. Os territórios declarados variam desde 0,5 hectares até 62 mil hectares e estão distribuídos em diversos estados do Brasil, conforme o mapa a seguir:



Foi instituída também, via decreto, a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (PNGTAQ) e o seu Comitê Gestor, a qual se destina a todas as comunidades quilombolas com trajetória histórica própria, dotadas de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada à resistência à opressão histórica sofrida. Dentre os objetivos da política, há a de apoiar e promover as práticas de gestão territorial e ambiental desenvolvidas pelas comunidades quilombolas e a de fomentar a conservação e o uso sustentável da sociobiodiversidade. 

O PNGTAQ está estruturado em 5 eixos: 

  • Eixo 1 – integridade territorial, usos, manejo e conservação ambiental; 
  • Eixo 2 – produção sustentável e geração de renda, soberania alimentar e segurança nutricional; 
  • Eixo 3 – ancestralidade, identidade e patrimônio cultural; 
  • Eixo 4 – educação e formação voltadas à gestão territorial e ambiental; e 
  • Eixo 5 – Organização social para a gestão territorial e ambiental. 

A norma dispõe que a ausência de inscrição no CAR não impedirá o acesso das comunidades quilombolas a políticas públicas, ressalvadas hipóteses específicas previstas na legislação.
PL do Mercado de Carbono [“Governança”] [“Adaptação”] [“Financiamento”]
Novembro foi um mês indutor de ansiedade para os que se preocupam com a tardia precificação de emissões no Brasil. O PL 412/22 comemorou seu primeiro “mêsversário” na Câmara dos Deputados em meio a inúmeros ruídos, burburinhos e fofocas na Praça dos Três Poderes.

A decisão de retorno ou não da agricultura primária é a semente. A pacificação quanto ao reingresso dependeria da existência do que chamam de “métricas tropicais” para as devidas compensações e medições de emissões de gases de efeito estufa. Em nenhum país do mundo houve o ingresso da agricultura primária no texto, porém a criatividade é marca da Câmara dos Deputados. Sabe-se que a Frente Parlamentar da Agropecuária é contrária ao retorno.

Outros debates não permitem a calma institucional: a possibilidade de transferências internacionais; o regime jurídico dos créditos de carbono regulados; a participação do mercado voluntário no SBCE; os créditos de pagamentos por resultados de desmatamento evitado. Não há paz, mas o deputado Aliel Machado (PV/PR) segue empenhado na proposta de um cessar-fogo.

Em uma tentativa de atender aos pedidos de inserções textuais, o relator Aliel optou pela estratégia típica do pensamento político brasileiro: atender a ninguém totalmente e a todos suficientemente para que calem. Destarte, o texto torna-se mais robusto, mais complexo, tangencialmente pacificado e quimérico. 

Aliel Machado entregou no dia 28 de novembro de 2023 seu Relatório aos Líderes Partidários. No dia 29 de novembro, teve agenda com o Palácio do Planalto para apresentar o texto. Isto é, o Mercado de Carbono Regulado está a caminho, mas o caminho poderá ser percorrido antes do fim da Sessão Legislativa, em 22 de dezembro? Ficará para o próximo ano? 
E o Plano de Transformação Ecológica? [“Governança”] [“Adaptação”]
Foi realizado em São Paulo evento em que os movimentos sociais foram apresentados às ideias da proposta organizada pelos Ministérios da Fazenda (MF) e do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). A forma como a iniciativa vinha sendo elaborada, com algumas ações já até em curso (consulta pública realizada da Taxonomia Sustentável, lançamento de títulos verdes soberanos, elementos dentro do novo Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, por exemplo) sem participação e transparência foi alvo de críticas ao longo do ano. 

O evento foi dividido em dois momentos. O primeiro foi uma reunião com uma apresentação conceitual, trazendo eixos e algumas ações do plano. As organizações presentes apontaram lacunas. Entre elas, a ausência de uma governança, que estaria agora em construção para ser apresentada em 2024. 

O segundo momento foi um ato público, com a presença dos ministros Marina Silva e Fernando Haddad, o coordenador do plano. A escuta dos movimentos sociais é uma resposta tardia positiva do governo, tendo ocorrido às vésperas da COP 28. 

Ao que parece, dificilmente teremos um Plano estruturado num único documento, sendo lançadas “partes” que irão, num conjunto, compor o “todo”. Ainda que a dita transformação ecológica seja (ou possa ser) um processo dinâmico, é necessário um desenho inicial sistematizado para que a implementação e as mudanças de rumo necessárias possam ser discutidas a partir dele. Afinal, o ponto de chegada está posto: que o Brasil faça efetivamente sua parte para evitar o aquecimento global acima do limite de 1,5ºC e alcance a neutralidade climática.
Títulos verdes soberanos [“Financiamento”]
O Tesouro Nacional divulgou que foram emitidos US$ 2 bilhões em títulos verdes. O chamado “Global 2031 ESG” (título público sustentável cuja operação foi liderada pelos bancos Itaú, J.P. Morgan e Santander), com vencimento em 18 de março de 2031, estabelece como compromisso “alocar o montante equivalente aos recursos captados em ações que impulsionem a sustentabilidade e contribuam para a mitigação de mudanças climáticas, para a conservação de recursos naturais e para o desenvolvimento social”.


Tribunais de contas, gestão pública e emergência climática [“Governança”] [“Financiamento”]
O Instituto Talanoa e a Política por Inteiro teceram uma análise sobre a capacidade de ação dos Tribunais de Contas para o enfrentamento à crise climática. O Brasil conta com 33 tribunais que devem fiscalizar – diferentemente do que seus nomes levam a pensar – não apenas as contas públicas, mas sobretudo a qualidade (eficiência) e a efetividade (impacto) de políticas públicas nos três níveis de governo. Na altura em que todos estamos, o êxito dos mais variados setores dependem de uma percepção integrada dos desafios, dentro dos quais o clima conquistou espaço central. Por isso, é mais do que justo que a política climática faça parte do cotidiano de fiscalização destas cortes. 

A análise também chama a atenção para a sustentabilidade do orçamento público. Se não observada desde a montagem da plataforma de campanha, os custos decorrentes de eventos climáticos extremos podem inviabilizar um mandato de quatro anos, trazendo prejuízos de toda ordem para governantes, sociedade e setor empresarial.
“Jabutis” no PL sobre eólicas [“Governança”] [“Adaptação”]
Foi aprovado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) 11.247/2018, que visa instituir o marco legal das eólicas offshore. A aprovação foi polêmica, tendo em vista que “jabutis” (textos que desfiguram a finalidade da proposta) foram inseridos, os quais apontam para subsídios à geração de energia por térmicas a carvão.
Foto: SECOM/AM

GOVERNOS SUBNACIONAIS

Entre os dias 8 e 10 foi realizado em Manaus o 26º Fórum de Governadores da Amazônia Legal. Tido como um momento mais político, às vésperas da COP-28, e com poucos desdobramentos práticos em termos práticos, merecem atenção, pela correlação com a pauta climática:

– A celebração do protocolo do Plano Amazônia Segurança e Soberania (Plano AMAS) entre Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e estados amazônicos:  esta articulação promove boas expectativas por estimular, ao menos no papel, a atuação integrada entre níveis de governo (federal e estaduais) e suas pastas (meio ambiente, segurança pública). Como se trata de um investimento do BNDES Fundo Amazônia considerado vultoso – previsto em pouco mais de R$ 2 bilhões – dos quais até 80% (R$ 1,6 bilhão) poderão ser operacionalizados por estados, espera-se que as próximas taxas anuais de desmatamento, assim como a degradação, que segue sorrateira, sejam reduzidas, juntamente com os índices de violência, comumente consorciados a crimes ambientais;

– A aproximação entre estados e Ministério da Fazenda para o Plano Nacional de Transformação Ecológica: tido pelo governo federal como uma espécie de “rompedor de paradigmas”, governadores manifestaram à pasta o interesse de que o plano aproveite experiências já desenvolvidas nos estados. Com boa vontade de ambos os níveis, essa articulação pode gerar melhorias em políticas federais e estaduais. Uma recomendação tanto a governadores quanto ao ministro Haddad e sua equipe seria alinhar as ações do plano a boas práticas da OCDE consideradas no roteiro de acessão do Brasil àquela organização.

– A prorrogação da cooperação entre Consórcio da Amazônia Legal e Alemanha: os estados subnacionais renovam laços com um dos principais doadores do Fundo Amazônia. Os alemães são parceiros históricos do governos amazônicos desde os anos de 1990, nos idos do PPG-7, e atualmente estão presentes no apoio direto a estados nos âmbitos financeiro (especialmente o banco KfW) e técnico, no qual se destacam historicamente instituições como GIZ, GOPA e GITEC, em assuntos que interessam à reconstrução, como: gestão de áreas protegidas, ordenamento territorial, apoio a planos de prevenção e controle do desmatamento e estímulo à sociobioeconomia.

Em novembro, o Monitor de Desastres contabilizou 385 reconhecimentos de emergência por eventos climáticos extremos. O grande destaque de novembro foram os incêndios florestais que atingiram o Pantanal e a estiagem histórica na Amazônia. 

Os incêndios florestais, em áreas protegidas e não protegidas, levaram o estado de Mato Grosso a decretar situação de emergência em todos os seus 141 municípios. No Mato Grosso do Sul, os incêndios também foram registrados, porém em menor escala. No Nordeste, a estiagem avança e se agrava, resultando em declarações de emergência por seca, que neste mês também afetou o Sudeste. No norte de Minas Gerais, foram 91 municípios atingidos pela seca. Já a região Sul permanece em estado de emergência devido ao grande volume de chuvas, tempestades e consequentes inundações e alagamentos.



O estado de São Paulo foi atingido, em novembro, por um forte temporal, com rajadas de vento que chegaram a 103,7 km/h. O evento extremo derrubou árvores, causou mortes e um caos, especialmente no fornecimento de energia e, em diversas regiões, de água. Semanas depois, houve recorde histórico de calor para o mês de novembro, com temperaturas que chegaram a 37,7ºC, conforme medição realizada desde 1943 pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). 

Houve recorde de temperatura também no Rio de Janeiro, com sensação térmica  chegando a 53,3ºC, maior registrada desde 2014, quando o sistema Alerta Rio começou a fazer a medição. 

Com as ondas de calor, o Um outro grande impacto foi no consumo de energia, que segundo o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), foi atingido o recorde na demanda instantânea de carga do SIN (Sistema Interligado Nacional) com o patamar de 100.955 MW (megawatts), sendo a primeira vez que se registrou uma carga superior a 100.000 MW. Num mundo cada vez mais quente e populoso, é urgente que haja a discussão acerca da matriz energética e sua consequente descarbonização, pois o aumento de consumo e demanda por energia deve vir acompanhado com estratégias que não agravem a situação do clima e da vida da população. Inclusive, o ONS informou que usinas termelétricas tiveram que ser acionadas por conta da demanda por energia na alta de calor da semana.

No Sul do país, os eventos extremos foram tempestades severas e granizo, sendo informado pelo Inmet que 808 cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná tiveram alertas de perigo, sendo que em Santa Catarina os impactos dos temporais afetaram diversos municípios, especialmente por enchentes, alagamentos, deslizamentos de terra, queda de árvores e destelhamentos, comprometendo, inclusive, rodovias estaduais e federais, como a BR-470.

Com impacto na circulação de veículos, o turismo local e a biodiversidade, o Pantanal sofreu com o fogo, especialmente pelos incêndios de grande magnitude, tendo sido declarada situação de emergência em decorrência de Incêndio Florestal no Estado de Mato Grosso e o Governo recebido apoio do Governo Federal.

O monitoramento de alertas do sistema DETER, realizado pelo Instituto Nacional de Políticas Espaciais (Inpe), não cobria o Pantanal. No entanto, diante do avanço da degradação no bioma, foi lançada neste mês uma cobertura em fase de teste. Os dados têm início em agosto de 2023 e detectam ​​avisos de supressão (desmatamento) e degradação (cicatrizes de queimadas). No período de 03/08 a 14/11 foram registrados 7.035 km² de cicatriz de queimada, sendo 4.245 km² contabilizados nas duas primeiras semanas de novembro. Dessa forma, o Pantanal permaneceu em segundo lugar entre os biomas atingidos pelo fogo em novembro, perdendo apenas para a Amazônia, como demonstram os dados abaixo:



Desde o início de 2023, foram captadas 216 normas de reconstrução da agenda climática e socioambiental, originadas tanto na Presidência da República como em diversos ministérios, o que permite avaliar o nível de transversalidade da agenda.
Do total de 471 normas propostas pela POLÍTICA POR INTEIRO para revisão e revogação, foram efetivadas 39 até o momento.

TERMÔMETRO DO MÊS

Ao longo de todo ano, agentes públicos e privados atuaram sob as expectativas e preparativos do que apresentariam na COP 28, a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em Dubai. Em novembro, esse movimento se acentuou. O governo federal buscou chegar a Dubai já com os resultados do esforço de combate ao desmatamento na Amazônia divulgados (a queda da taxa anual do Prodes), assim como a indicação de que focará agora também em deter a devastação do Cerrado, publicando o PPCerrado. 

Na articulação transversal, enfatizou o Plano de Transformação Ecológica. Porém, sem estabelecer ainda sua governança e divulgar as ações que o compõem de forma sistemática.

A parte da bagagem para a COP que deveria ser empacotada no Congresso, não ficou pronta: o projeto de lei de regulamentação do mercado de carbono continua na Câmara. O que ficou pronto no Legislativo foram pontos que nada contribuem para as aspirações do governo Lula de colocar o Brasil como um líder mundial em clima e meio ambiente. O PL dos Agrotóxicos (PL do Veneno) foi aprovado – segundo reportagens, resultado de costura política envolvendo o próprio governo –, jogando para o Executivo mais um tema de pressão para veto. E, caso ele ocorra, será mais um na fila para análise do Congresso, retornando o tópico para articulações e negociações. Assim gira a roda das moedas de troca com cotações que sobem e descem de acordo com as forças políticas que a controlam – ou que não a conseguem controlar. 

Os retrocessos no Congresso devem acabar questionados no Judiciário. Por lá, haverá novidades com Flávio Dino, indicado por Lula para substituir a ministra Rosa Weber, apesar de todos os apelos para que outra mulher ocupasse a vaga com a aposentadoria da ministra. Ainda assim, não deixa de indicar um alento no que diz respeito à representatividade: Dino é natural de São Luís e foi governador do Maranhão de 2015 a 2022, além de presidente do Consórcio da Amazônia Legal entre 2021 e 2022. Tendo revelado sensibilidade a assuntos da pauta climática e compreensão do senso de urgência apontado pela Ciência, Dino liderou o grupo de governadores amazônicos a, por exemplo, elaborar e lançar o Plano de Recuperação Verde (PRV) da região, diante da dormência da agenda ambiental brasileira nos quatro anos que antecederam o atual governo federal. Trata-se, portanto, de um amazônida de nascença e de trajetória. Dado o histórico de predileção de presidentes da República em indicar ministros oriundos do Sul/Sudeste, Dino, se torna uma grata “exceção regional” vinda do Norte/Nordeste. Em tempos em que crescem as expectativas sobre diversidade e representatividade nas principais instâncias nacionais de poder no Brasil, espera-se que Dino repita, no Judiciário, a mesma postura de zelo ao patrimônio ambiental e proteção a povos da floresta que imprimiu durante seus anos de Executivo estadual. 

No cenário internacional, o prestígio do Brasil ao fim deste primeiro ano de retorno do país à cena internacional e busca de protagonismo na agenda climática dependerá do que sair da COP em Dubai. Nas primeiras discussões do GST, o país fez boas proposições, com destaque para a sugestão de que se retire a menção ao limite de 2ºC para o aquecimento global, alinhado com a missão de que o esforço deve ser em direção a 1,5ºC.

Por outro lado, continuar na rota de exploração dos combustíveis fósseis e a confirmação de adesão à Opep+ em 2024 reduzem a capacidade de o país ser um líder da transição global. 

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