Caça ao tesouro: Brasil busca pistas e encontra apoiadores do “Mapa do Caminho” para abandono dos fósseis
- COP30
- 17 de novembro de 2025
(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
O Brasil jogou um verde e, com muito otimismo, pode colher maduro. Na abertura da Cúpula de Belém, na semana que antecedeu o início da COP30, o presidente Lula trouxe para seu discurso a intenção de elaborar um “Mapa do Caminho para acabar com a dependência dos combustíveis fósseis”, mencionando a necessidade de elaboração de um cronograma que traga materialidade prática à decisão assumida em Dubai, quando os países decidiram pela transição para longe dos combustíveis fósseis (TAFF). O problema é que o parágrafo 28 não registrou prazos claros, nem um roteiro para que os países efetivassem a promessa. Dois anos se passaram e, agora, em Belém, o Brasil parece conseguir organizar um crescente mutirão pelo fim dos fósseis.
O Mapa do Caminho que o governo brasileiro está tentando emplacar na COP30 é o embrião para que um cronograma robusto seja estruturado nos próximos anos, estabelecendo uma data final de despedida dos combustíveis que alimentam o efeito estufa. A Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, tem sido a principal porta-voz da bandeira, insistindo em encontrar espaço para o tema que permanece fora da agenda formal de negociações da COP30. “Ainda não ganhou efetividade, mas não podemos nos acostumar a tomar decisões que depois não tenham consequência”, afirmou Marina lembrando que a transição para longe dos fósseis já foi decidida na COP28.
Em eventos na semana passada ela recebeu apoio de lideranças políticas e cientistas europeus, com destaque para Dinamarca, Reino Unido e Alemanha. “Eu gosto de metáforas. Talvez a gente possa dar a oportunidade a todos nós de construirmos juntos uma espécie de Arca de Noé. Só que não é uma arca, é um mapa do caminho para onde ela pode se direcionar”, defendeu Marina na coletiva de imprensa com a presidência da COP nesta segunda-feira (17).
Ao contrário do que muitos poderiam apostar, Marina não está sozinha. Além das repetidas declarações de Lula – tanto na Cúpula de Belém quanto na abertura oficial da COP30 – o chamado “Mapa do Caminho” se tornou habitual na boca das lideranças de alto-nível do governo federal brasileiro e já obteve apoio de mais de 60 nações. Na sessão de abertura dos trabalhos do segmento ministerial, o vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou aos ministros que “nosso compromisso – de todos nós – é elaborar “Mapas do Caminho” para Transição Energética e o fim do desmatamento ilegal”, disse. “O tempo das promessas já passou”. Ao mesmo tempo, o cientista Carlos Nobre fez coro pedindo que países “se unam para entregar o Mapa do Caminho para o fim dos combustíveis fósseis e assim manter o compromisso da COP30 com o 1.5º C”.
Quem tem observado o tema crescer percebe que Marina costura uma caça ao tesouro, uma espécie de “mapa do mapa do caminho”, buscando pistas para conseguir encaixar o roteiro na lista de resultados da COP30. Uma etapa importante tem sido somar, dia após dia, mais endossos explícitos à proposta. Além dos europeus, as ilhas em desenvolvimento (SIDS) já manifestaram interesse para que a caminhada do TAFF comece. Na América Latina, Colômbia articula uma declaração política conjunta para mapear o caminho para a transição de energias fósseis para fontes limpas. “Reconhecemos que implementar tal transição requer ação coordenada e coletiva entre os Estados, conduzida de boa-fé e por meio de uma cooperação reforçada, contínua e sustentada, que reflita suas respectivas circunstâncias, capacidades e necessidades”, argumenta o documento. “Nesse sentido, apoiamos o chamado para avançar em um roteiro para a transição para longe dos combustíveis fósseis, a fim de ampliar a ação coletiva e a implementação”.
A posição também compôs o discurso do presidente colombiano, Gustavo Petro, na Cúpula de Líderes. Embora a AILAC ainda não tenha posição formal, o sinal dado pela Colômbia é de busca de um consenso no bloco que resulte em um apoio à iniciativa. Países como México, Peru e Chile ainda não se manifestaram explicitamente, mas já contabilizam apoio avulso de suas empresas, governos subnacionais, instituições e povos indígenas, que aumentam a pressão de forma positiva.
Soma forças também o Tratado de Não-proliferação dos Combustíveis Fósseis, que com a inclusão do Camboja, alcançou 18 signatários nesta segunda-feira. Ademais, o começo desta segunda semana de COP30 reuniu manifestações de ativistas liderados pelo Center for Biological Diversity que pediram a desativação financiada dos combustíveis fósseis e transição justa, citando a crescente pressão por um roteiro de eliminação dos combustíveis fósseis.
A sociedade civil de diversos países e continentes também organiza manifesto por escrito pedindo que a COP30 estabeleça um novo processo para desenvolver um roteiro de implementação de uma transição justa, ordenada e equitativa, “focado em implementação, não em novas declarações”. O documento pede que esse processo assuma a forma de um Diálogo Presidencial de alto nível e inclusivo que produza um roteiro global e roteiros por país. O roteiro deve abordar: emissões, produção, subsídios, financiamento não oneroso, impactos sociais, barreiras sistêmicas e melhores práticas internacionais. O processo seria formalizado por decisão da COP30, conduzido ao longo de três presidências, sem presença da indústria fóssil, com resultados preliminares na COP31 e contribuição até 2028.
Em coletiva de imprensa, Maurício Lyrio, Secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, reforçou que, na COP, o “processo de negociação é coletivo e deve considerar todos os países e características nacionais”. Ao lembrar do chamado de Lula em prol do Mapa do Caminho, disse que o discurso refletiu a “direção que Brasil quer seguir” e tratou-se de “uma conclamação e amadurecimento do processo” e que “estamos no momento inicial desse processo, começamos a conversar, mas é preciso respeitar o momento”, afirmou.
A decisão já foi tomada em 2028, mas a COP da Verdade e da Implementação deve fazer valer seu slogan: o primeiro passo do caminho para o fim dos fósseis deve ser dado a partir de Belém.