(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
Quando especialistas dizem que a questão climática não é meramente ambiental, e, sim, econômica, muita gente duvida. Nesta semana, a pretexto de conter a inflação, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou em mais 1 ponto percentual a Selic no Brasil, fazendo o país chegar a uma taxa básica de juros de 14,25% ao ano, patamar que não ocorria desde o longínquo 2016. Essa elevação, entre outras reações, torna mais alto o custo de se pegar dinheiro emprestado no país. Os financiamentos, necessários para alavancar a produção até mesmo dos grandes, agora coloca o tomador do empréstimo ainda mais atento a reveses que podem lhe custar mais caro do que no cenário de menor taxa de juros.
Tá, mas e o clima com isso?!
Se a emergência climática que vivemos for adicionada à equação, o risco das operações pode ser melhor compreendido. Junto com ele, pode-se entender melhor também o “pedaço” da inflação estimulado pelo desande do clima. A questão é que, num mundo em desordem climática, não se pode prever o que, onde, quando, por quanto tempo e com que intensidade eventos climáticos extremos causarão danos à produção. E isso tem um potencial duplamente ruim: além de sacudir a balança pelo lado da oferta (de serviços e bens, incluindo alimentos), aumenta o risco dos tomadores de empréstimos (que pode também ser o próprio governo), desincentivando o investimento e, portanto, o próprio ritmo de crescimento e desenvolvimento da economia.
Crédito vem de crer, de confiança, que é a matéria-prima mais básica de qualquer relação comercial desde que o mundo é mundo. Acontece que, se no contexto de emergência climática a confiança é chacoalhada, o dono do dinheiro vai elevar os juros, para fazer valer a pena o risco que se corre. Não é à toa que quem empresta é chamado credor, aquele que crê. Crê que irá receber de volta o que emprestou. Imersos na desordem climática, as garantias diminuem, basicamente porque não dá mais pra confiar como antes. Que o digam as seguradoras…
Aparentemente, as análises de Teoria Econômica que propõem a incorporação das externalidades negativas do processo de produção ao equilíbrio de preços ainda não foram assimiladas pelo Copom. Ao apontarem os riscos econômicos e os choques inflacionários não se contempla, ainda, o planejamento monetário em um mundo de clima em desequilíbrio. E agora?
Ao que parece, a conta das mudanças climáticas não faz parte dos assuntos sobre a mesa do comitê, conforme o próprio conselho ilustra numa arte em sua página oficial.

Apesar disso, o último Relatório de Inflação do Copom, de dezembro de 2024, cita que “fatores climáticos” concorreram para a inflação no ano que passou. Mas, no comunicado oficial desta semana, nadica de nada. Quando o Copom diz considerar o cenário externo, seus membros estão debruçados sobre as tendências globais da própria economia – e especialmente do FED, o homólogo estadunidense do Banco Central brasileiro – e não do clima.
Enquanto isso, desde o 2º semestre de 2024, o Ministério da Fazenda reconhece que a questão climática já tem incomodado, porque sabe que ela influencia no custo da energia e da produção de alimentos, entre outros fatores. Ou seja, a pasta atesta que uma das causas da inflação de custos deriva da emergência climática. Visto o esforço colocado por intermédio da política fiscal, em retirar a economia brasileira do ciclo vicioso da estagnação econômica, considerar, em todas as instâncias, o custo inflacionário da inação climática não deveria ser inovador: é mera aplicação da análise de riscos macroeconômicos
A autonomia do BC deve continuar sendo respeitada, claro. Mas isso não se confunde com qualquer possibilidade de o conselho responsável pela política monetária do país estar alheio ao que se passa com o clima para fundamentar suas decisões.
Não há exceções à transversalidade da questão climática.
Boa leitura!
TÁ LÁ NO GRÁFICO
Neste sábado (22), Dia Mundial da Água, temos mais uma oportunidade para lembrar o quanto esse recurso é essencial para o equilíbrio do clima e da vida no planeta. O Tá Lá no Gráfico mostra a relação entre a substância – em seus três estados – e a mudança climática que estamos vivenciando. Apresenta também onde são necessárias ações emergenciais para a gestão adequada dos recursos hídricos a fim de que, num país que tem 12% da água potável do planeta, não se sofram as graves consequências de sua escassez. A superfície de água no território está diminuindo, apontam dados do MapBiomas. O plano temático de Recursos Hídricos, no âmbito do Plano Clima, está em consulta pública traz um diagnóstico e aponta ações para lidar com o problema.
FRASES DA SEMANA


ABC DO CLIMA
Transformação Ecológica: É o processo pelo qual a economia de um país caminha em direção à descarbonização de seus principais setores. Para isso, a guinada de uma economia “tradicional” para uma nova economia de baixo carbono deve utilizar pressupostos da Ecologia, como a circularidade e a resiliência, aplicadas a matérias-primas, ao ambiente e demais fatores de produção. É, também, o nome escolhido pelo governo para sinalizar a intenção de remodelar a economia brasileira em baixas emissões. Dessa forma, o termo virou o título de um Plano que eleva o status político do enfrentamento da crise climática, ao lado do combate às desigualdades sociais, como centro de um projeto de desenvolvimento do país. Para dar certo, o Plano de Transformação Ecológica (PTE, também chamado de Novo Brasil) deve estar alinhado à NDC do Brasil e ao Plano Clima, com estratégias e ações detalhadas tanto de mitigação, para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, como de adaptação aos impactos cada vez mais intensos e frequentes das mudanças climáticas. Um dos primeiros resultados contabilizados no PTE foi a emissão de R$ 10 bilhões de títulos verdes no mercado internacional para ajudar a financiar tanto a mitigação como a adaptação. Apesar de não figurar em Lei, o PTE tem status de macropolítica e sob seu guarda-chuva encontram-se políticas importantes como o Nova Indústria Brasil (NIB), o Mobilidade Verde (Mover) e o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia (PNDBio).
MONITOR DE ATOS PÚBLICOS
O Monitor de Atos Públicos captou apenas 6 atos relevantes para a política climática nesta semana. O tema Terras e Territórios foi o mais frequente da semana, por conta de duas designações de Força Nacional para atuar em terras indígenas no Rio Grande do Sul.
Diferentemente das três semanas anteriores, Financiamento não passou em branco. Uma lei aprovou (mais um) crédito orçamentário para a reconstrução do Rio Grande do Sul, ante os eventos extremos sofridos pelos gaúchos em 2024. Os recursos são destinados à defesa civil no estado. Dos R$ 383 milhões alocados, R$ 130 milhões vão para investimentos nesse sistema; o restante, custeio.
Abril, julho, dezembro… Março de novo!
Nesta semana, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) designou, pela quarta vez em menos de um ano, efetivo da Força Nacional para conter animosidades na Terra Indígena Nonoai, no extremo norte do Rio Grande do Sul. As hipóteses investigadas pela Polícia Federal dão conta de que a motivação iria de disputas por liderança entre os Kaingang até o arrendamento de lotes para não-indígenas, dentre os quais, sojeiros, que estaria sendo praticado pelo atual cacicado.
A Política por Inteiro já tratou em conteúdo gráfico dos acionamentos à Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), que se multiplicaram nos últimos anos e estão longe de ser “episódicos e planejados”, como usualmente registram as portarias.
Minas e Energia e novos paradoxos
A Portaria MME Nº 829, de 20 de março de 2025, estabelece a Agenda Regulatória do Ministério de Minas e Energia para o período de 2025-2027, com foco em fontes renováveis. O Ministério de Minas e Energia (MME) visa a aumentar a participação de energias limpas e combustíveis menos intensivos em carbono na matriz energética nacional.
Entre as principais medidas, destacam-se incentivos fiscais para projetos de energia solar e eólica, a otimização do uso de energia gerado por fontes termelétricas, financiamento de projetos de transformação de minerais estratégicos para a transição energética e tecnologias inovadoras no setor energético.
O grande destaque da portaria é, na verdade, as regulamentações infralegais sobre a Lei do Combustível do futuro, a qual visa adicionar etanol e biocombustíveis complexos em mistura aos combustíveis fósseis com vistas a reduzir a intensidade de emissões do setor de transportes.
Entretanto, como pontuado em outras oportunidades, o ministério pensa em descarbonizar o sistema energético brasileiro, mas não transicionar para longe dos combustíveis fósseis. As iniciativas reforçam o compromisso brasileiro com a transição energética, porém, muito aquém do necessário para apontar o país na trajetória rumo à neutralidade de emissões até 2050. Não obstante, ainda há duas ressalvas negativas:
1. a revisão de Portarias Interministeriais que tratam da regulamentação de Manifestações Conjuntas e de Avaliação Ambiental de Áreas Sedimentares, bem como definição de diretrizes para eventual dispensa para sua aplicação;
2. criterização de medidas de incentivo à descarbonização das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural.
Ambas as medidas almejam a facilitação da abertura de novos poços de perfuração e utilizar o dinheiro do contribuinte para tentar descarbonizar a indústria fóssil.
Não há tempo para tentar salvar o que nos trouxe até a emergência climática. A determinação é clara: expandir a geração elétrica a partir de fontes renováveis; duplicar os índices de eficiência energética e transicionar os sistemas energéticos para longe dos combustíveis fósseis. Quaisquer subterfúgios desalinhados com esses axiomas são uma distração perigosa e custosa, dado o preço da inação. A única garantia de soberania e segurança energética para o século XXI é desacoplar o país da perigosa geopolítica do petróleo, fechar lacunas de infraestrutura, alavancar a digitalização e proteger cadeias de suprimentos para dimensionar a implantação de energia renovável por todo o território nacional. E ponto.
Florestas Produtivas – e um pouco atrasadas
Após oito meses da instituição do Programa Florestas Produtivas, seu Comitê Gestor foi criado nesta semana. O Programa, criado um dia após o anúncio do Plano Safra 2024-2025, tem como finalidade recuperar áreas que foram alteradas ou degradadas para fins produtivos, por meio de sistemas agroflorestais, contribuindo para a regularização ambiental da agricultura familiar.
Será implementado de forma direcionada de acordo com cada bioma brasileiro e é restrito aos agricultores familiares beneficiários da Política Nacional de Reforma Agrária. Dessa forma, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa – Planaveg servirá como orientador para os arranjos de implementação do Florestas Produtivas e o Comitê será responsável por toda a estruturação da política pública, incluindo articulação, meios de implementação e monitoramento. O relatório de andamento do Programa deve ser realizado semestralmente, para a Conaveg e também para o Condraf, visto que é uma iniciativa conjunta do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).
LEGISLATIVO
Comissões definidas
Nesta semana, as 30 comissões permanentes da Câmara dos Deputados foram oficialmente instaladas e distribuídas entre os partidos que assumiram as lideranças.
A principal Comissão, de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), responsável por analisar a maioria das propostas da Casa, ficou com o partido União Brasil, na presidência de Paulo Azi (BA). A Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, com o PT, sob a liderança de Dandara (MG).
Já a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS), a mais relevante para a política climática, estará sob a liderança do MDB, de Elcione Barbalho, mãe do governador do estado-sede da COP30. Outra comissão de relevância, a CAPADR, de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, será liderada pelo PL, com Rodolfo Nogueira (MS).
Além disso, a Comissão de Minas e Energia será comandada pelo PSD, com Diego Andrade (MG). No fim das contas, o Partido dos Trabalhadores (PT) estará no comando de apenas quatro comissões, contra cinco do maior partido da oposição, o Partido Liberal (PL).
Finalmente, habemus Orçamento
Demorou, mas veio. Prevista para sair em fevereiro, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LOA) de 2025 foi aprovada na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional na quinta-feira (20), prevendo um teto de até R$ 2,2 trilhões para o ano. A LOA segue agora para sanção presidencial.
Embora ausente no detalhamento orçamentário inicial, as mudanças climáticas foram contempladas com crédito extraordinário por meio da aprovação de duas Medidas Provisórias. A primeira (MP 1269/24) garante R$ 5 bilhões para ações de adaptação às mudanças climáticas e de reconstrução do Rio Grande do Sul após as enchentes do ano passado, enquanto a segunda (MP 1268/24) garante R$ 938,4 milhões para para ações relativas ao combate à seca e aos incêndios florestais no Pantanal e na Amazônia. As Medidas Provisórias seguem para o Plenário da Câmara dos Deputados e do Senado.
MUNDO
O Petróleo traz outro desastre, de novo e de novo e de novo
O vazamento de petróleo no Equador, em 13 de março, afetou significativamente a província de Esmeraldas. O incidente foi causado pelo rompimento do Sistema de Oleoduto Transequatoriano (SOTE) devido a um deslizamento de terra, resultando no derramamento de milhares de barris de petróleo que contaminaram pelo menos cinco rios, incluindo o rio Esmeraldas, que deságua no Oceano Pacífico. A contaminação impactou a segurança hídrica e as necessidades básicas de cerca de 500 mil pessoas, afetando o abastecimento de água potável e atividades econômicas dependente deste recurso como o comércio, a indústria, a pesca e o turismo.
Para além dos danos imediatos, o petróleo representa riscos significativos à biodiversidade e às economias regionais. A contaminação de rios e oceanos prejudica ecossistemas aquáticos, levando à morte de espécies marinhas e comprometendo a pesca, o comércio regional e a indústria a eles associadas. Áreas turísticas, como a praia de Atacames, também foram afetadas, prejudicando o turismo local sem previsão de retorno ao cenário normal de funcionamento.
No Brasil, a Margem Equatorial volta à tona. Na semana em que Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, defendeu que a COP30 aponte um “mapa do caminho” para longe dos combustíveis fósseis, a segurança da exploração petrolífera voltou à boca do povo. Abrir uma fronteira petrolífera em uma região empobrecida, com um mercado do turismo como espinha dorsal, com diversas populações dependentes da pesca e com ressalvas do Ibama ao risco da operação, soa irresponsável tanto com o regime climático e as pressões inflacionárias derivadas da inação, como com a economia regional. As soluções baseadas em renováveis estão à mão, não persegui-las é uma opção. Opção essa que interfere diretamente na vida e nos bolsos de todos nós.
Fundo de Perdas e Danos ganha novo investimento
No dia 17 de Março, o Japão anunciou uma contribuição de US$ 5 milhões para o Fundo para Resposta à Perdas e Danos – FRLD. Ela se soma aos US$ 10 milhões de provisão feitos no ano de 2023. Criado em 2022, o FRLD (Fund for Responding to Loss and Damage, em inglês) é um mecanismo financeiro da UNFCCC para apoiar países vulneráveis às mudanças climáticas diante das perdas e danos, econômicas e não-econômicas decorrentes de eventos extremos. Atualmente, o Fundo conta com mais de US$ 700 milhões em caixa, decorrentes de doações de países desenvolvidos. No entanto, esse valor segue longe das necessidades reais de perdas e danos em países vulneráveis. Espera-se que os repasses para países em desenvolvimento comecem ainda em 2025.
Esquenta para a COP 30 em Fóruns Globais
Nesta semana, ocorreram dois importantes eventos internacionais que reuniram negociadores, especialistas e observadores para tratar da implementação de compromissos do Acordo de Paris no caminho até Belém. Adaptação climática, como vemos anunciado, teve grande peso nas discussões.
Em Paris, ocorreu a Reunião de Especialistas em Mudanças Climáticas (CCGX) da OCDE. As sessões deste Fórum Global se concentraram em temas relacionados a indicadores de adaptação no âmbito do programa de trabalho UAE-Belém, na análise dos relatórios bienais de transparência (BTRs) e nos desafios para a submissão de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) das Partes.
Não muito distante, em Bonn, ocorreu o Workshop dos Especialistas com mandato para apresentar os indicadores da Meta Global de Adaptação, no âmbito do Programa de Trabalho UAE-Belém. Até maio, os indicadores serão apresentados às Partes, que deverão levá-los em consideração nas negociações da SB62 em Bonn, e na COP 30, em Belém.
MONITOR DE DESASTRES
O Monitor de Desastres captou 05 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que atingiram 28 municípios.
Nota explicativa: os dados registrados no Monitor de Desastres referem-se única e exclusivamente às situações de emergência ou calamidade pública reconhecidos oficialmente pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil/MDIC nesta semana. Eventualmente, é possível que desastres ocorridos na mesma semana não sejam contabilizados, dado que o reconhecimento do governo federal leva alguns dias para ser publicado.
TALANOA NA MÍDIA
Formação sobre Projetos de Carbono para Advogados e Lideranças Indígenas | Realizado por de meio de uma parceria entre Instituto Talanoa, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Rede de Cooperação Amazônia e Rainforest Foundation Norway, o treinamento reuniu 40 pessoas de todas as regiões do país em atividades ao longo de três dias. |
Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO