(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
- Introdução
- Tá Lá no Gráfico
- Monitor de Atos Públicos
> Governança
> Mitigação
> Adaptação
> Financiamento - Destaques do Mês
👎 Atravessou o samba!
👍 Tá afinado! - Brasil
> Novos e antigos comandos no Congresso
> AdaptaCidades
> Caminhos abertos para agenda de Adaptação na COP30
> Mas que calor é esse? - Mundo
> Adiar e Melhorar - Monitor de Desastres
- Túnel do Tempo

O caminho da política quase nunca oferece uma linha reta, a menor distância possível entre dois pontos. Negociar, recuar e avançar fazem parte do jogo. Uma liderança eficiente sinaliza com clareza o sentido para o qual está direcionando suas políticas públicas, e eventuais solavancos não atrapalham a percepção de que estamos na rota certa. Todos os agentes que precisam trilhar esse caminho entendem os sinais, contribuindo para desbravar mais facilmente a trilha projetada. Porém, se o percurso se torna excessivamente tortuoso, deixamos de vislumbrar aonde se quer chegar.
Em fevereiro, o roteiro da agenda climática brasileira teve sinalizações ambíguas e até contraditórias. O mês começou com a eleição das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado – um prato cheio para as negociações políticas. O resultado foi dentro do esperado: as vitórias do deputado Hugo Motta e do senador Davi Alcolumbre – este com especial interesse na pauta do petróleo na Foz do Amazonas, já que se vende a ideia de que o Amapá, seu estado, seria um dos principais beneficiados economicamente com a exploração.
No mesmo período do mês, aumentou consideravelmente a pressão para que o Ibama concedesse a licença exploratória à Petrobras. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que esse óleo ajudaria a financiar a transição energética. Um tremendo paradoxo. É uma combinação incompatível: liderar a transição energética e – no mesmo bioma que sediará a COP30 – investir esforços políticos e institucionais para abrir uma nova fronteira de exploração fóssil.
Lula disse que faria isso sempre com respeito “a cada árvore, a cada ser vivo”, mas não há declaração que retifique a estrada se a direção tomada for na contramão do que precisamos. Não se reduzem emissões furando novos poços de petróleo.
Outro sinal trocado foi o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) ter aprovado o ingresso do Brasil na Opep+, uma espécie de “clube de segunda classe” da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). O país tem acesso aos núcleos da organização, mas não se vincula às decisões dos membros efetivos e também não tem direito a voto.
Mas fevereiro também trouxe sinais de avanço como o lançamento do Adaptacidades – um esforço para enfrentar aquilo que a emissão de fósseis causa.
Entre erros e acertos, espera-se que o caminho para a COP30 e para além do marco em Belém seja mais direto e reto, com claras sinalizações do que o país prioriza para uma transição justa para longe dos combustíveis e uma transformar o Brasil numa sociedade mais preparada para um planeta mais quente. E que os buracos da estrada sejam tampados, sem mais perfurações.
Boa leitura!
Tá Lá no Gráfico
Durante fevereiro, o Tá Lá no Gráfico tratou da importância deste ano para a elevação da agenda da adaptação como prioridade na COP30 e nas políticas nacionais, visando a um futuro resiliente. O novo Fundo Clima, com orçamento recorde em 2025, foi tratado para apontar os desafios para o instrumento que pode ser um marco no financiamento climático no Brasil e modelo para o mundo. No clima muito quente de Carnaval, o TLnG mostrou como as altas temperaturas trazem necessidades de adaptação em todos os aspectos da nossa vida, incluindo momentos de cultura e lazer. E foi apresentado como o aumento da gravidade e da frequência de incêndios impactam as políticas de prevenção e resposta a esses eventos extremos.
Monitor de Atos Públicos
Em fevereiro, foram captadas 55 normas relevantes para a política climática brasileira, quase o dobro de janeiro, que fechou com 30. A classe mais frequente do mês foi Terras e Territórios novamente, com 15 atos, seguido de Infraestrutura e Oceano e Zonas Costeiras, cada uma com 8 normas.
A distribuição das normas entre as agendas climáticas segue a tendência do maior número de normas estarem alocadas em Governança: 32. No entanto, neste mês a agenda de adaptação ficou em segundo lugar, com 9 atos. Financiamento apresentou uma tendência de queda: 8. Mitigação teve 6 normas, sendo a agenda menos registrada em fevereiro.
Agendas
Governança
Neste mês, o MMA concentrou a agenda de governança na declaração de emergência ambiental nos diferentes biomas, a fim de antecipar as medidas de contenção aos incêndios florestais. Publicou também sua agenda regulatória para 2025 e as Metas Nacionais de Biodiversidade para 2030. Em ambos os planejamentos, a bioeconomia e a redução do desmatamento aparecem como agendas prioritárias.
A agenda de governança de outras pastas, que indiretamente impactam na política climática, deram sinais importantes. A Funai passou a ter poder de polícia, e assim determinar a retirada compulsória de não-indígenas de dentro de terras indígenas.
O Ministério da Defesa promoveu uma reforma na governança de GTs e Comitês ligados a agenda da da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar.
As ações de resposta aos conflitos fundiários, por meio do emprego da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), seguem constantes. Em fevereiro, foram autorizadas operações em apoio à Funai, ao ICMBio e ao Ibama.
Na seara da transição energética, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) emitiu posições importantes, entre elas a criação do Comitê Técnico do Programa de Aceleração da Transição Energética – CT-Paten.
A agenda mais frequente do mês precisa ainda de coordenação e centralidade.
Mitigação
A agenda de mitigação percorreu caminhos já conhecidos, passando pela criação de mais uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) no estado de Goiás – a primeira do ano – e um assentamento no Paraná. Além das ações recorrentes, reconheceu o Mosaico do Baixo Rio Madeira. A formação de mosaicos é uma determinação prevista na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação para fortalecer a gestão das Unidades de Conservação, ao compartilhar meios e recursos necessários à sua implementação. É parte de uma estratégia importante para conter o desmatamento e toda sorte de ilegalidades em terras públicas e privadas dentro e no entorno de áreas protegidas, garantindo a continuidade destes importantes sumidouros de carbono.
No setor de transportes, que é um dos que mais participam das emissões nacionais, o Ministério do Transportes criou o Programa MelhorAR, que tem como objetivo principal reduzir emissões de poluentes atmosféricos provenientes de veículos de transporte rodoviário de cargas e de passageiros, o Novo PAC também entrou no clima e lançou a seleção de propostas para mobilidade urbana, que prevê a aquisição de ônibus elétricos e equipamentos para recarga.
Ao mesmo tempo, foi criado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), o Programa Nacional de Estradas Rurais, a ideia é recuperar e expandir as estradas vicinais, conectando as regiões produtoras da cadeia agropecuária aos centros consumidores nacionais. Uma das metas é abrir 10 mil km de estradas rurais por ano, porém não estão mencionadas condições socioambientais e climáticas para que essa expansão aconteça. Ou seja, o programa não prevê riscos climáticos, nem estradas minimamente resilientes.
Resta saber se nas novas estradas rurais continuaremos queimando os velhos combustíveis fósseis.
Adaptação
Em fevereiro a agenda de Adaptação deu um salto em relação ao mês anterior, ficando na frente, inclusive, da agenda de Mitigação. Foram 9 normas captadas neste mês, contra um total de zero atos captados em janeiro.
A grande maioria dessas normas estão atreladas ao Novo PAC e ao processo de contratação de operações de crédito para a execução das ações do programa. Entre as ações elencadas estão obras para contenção de encostas, urbanização de favelas, drenagem urbana e mobilidade urbana. Além disso, foi aberto o processo seletivo para propostas de prevenção de desastres, no âmbito do programa Cidade Verdes Resilientes.
Reduzir a vulnerabilidade das periferias é fundamental e exerce impacto positivo na resiliência das cidades, porém toda e qualquer iniciativa deve considerar o contexto territorial específico, o tecido social existente e as iniciativas já implementadas historicamente pelas comunidades a fim de evitar a maladaptação.
Indo na contramão da agenda positiva, o Ministério do Esporte desconsiderou quaisquer diretrizes de Adaptação Climática na orientação das propostas a serem apresentadas para receberem recursos públicos do Programa Novo PAC – Desenvolvimento e Sustentabilidade para implementação de Espaços Esportivos Comunitários. Mesmo com o Brasil há sucessivos anos batendo recordes de temperatura e progressivo aumento da frequência de dias mais quentes no ano em todas as regiões, o MEsp nada traz sobre as propostas levarem em conta conforto térmico, insumos de construção sustentáveis, seleção de áreas de baixo risco climático, entre outros tópicos ligados à Adaptação Climática.
Para além do PAC, foi instituído o programa do Ministério dos Transportes chamado de Pró-Adapta Vias, que pretende promover a adaptação e o aumento da resiliência da infraestrutura federal de transportes terrestres frente à mudança do clima. Entre as ações elegíveis do programa constam a avaliação de riscos e impactos climáticos e as soluções baseadas na natureza.
Diante de tais contradições, é preciso reforçar que a mensagem da Adaptação Climática precisa chegar a todos os ministérios e governos subnacionais. Ou nos adaptamos todos, ou não haverá adaptação no Brasil.
Financiamento
A agenda de financiamento segue concentrada na liberação de créditos extraordinários, que neste mês foram destinados tanto para a reparação do estado do Rio Grande do Sul, com foco no ordenamento territorial, quanto para o combate ao desmatamento e criação e gestão de UCs na Amazônia.
Ainda em resposta ao impacto da mudança do clima, o Banco Central do Brasil autorizou a prorrogação de débitos de produtores rurais da Região Nordeste que tenham sua produção afetada por eventos climáticos extremos.
👎 DESTAQUES DO MÊS 👍
👎 DESTAQUES DO MÊS 👍
👎 Atravessou o samba!
- O Ministério do Esporte (MEsp) ainda não incorporou o espírito da Adaptação Climática semeado na Esplanada dos Ministérios há quase dois anos, desde a criação do Grupo de Trabalho Técnico sobre o tema, em setembro/2023, e que está elaborando um abrangente Plano Clima Adaptação para o Brasil. Em abertura de processo seletivo para construção de centros esportivos comunitários Brasil afora, o MEsp ignorou solenemente a necessidade de adequação desses espaços a altas temperaturas e outros “B.O.s” climáticos. Se a Esplanada é uma orquestra, o MEsp está desafinado. A Política por Inteiro analisou em detalhes esse movimento.
- O Conselho Nacional de Política Energética – CNPE aprovou a entrada do Brasil na OPEP+, uma espécie de antessala de apoio das nações que fundaram a Organização dos Países Exportadores de Petróleo. O Brasil jura que, uma vez que se torne parte do clube, convencerá as petro-nações a acelerarem a descarbonização de suas matrizes energéticas. “Anram…”. Sobre esse assunto, a Política por inteiro teceu uma análise com vários elementos por trás dessa decisão.
👍 Tá afinado!
- A Fundação Nacional dos Povos Indígenas – Funai passou a ter regulamentado por um Decreto presidencial o seu poder de polícia. A medida faz com que a autarquia possa agora, ela própria, a determinar a retirada compulsória de não-indígenas de dentro de terras indígenas, procedimento conhecido como desintrusão. No entanto, esse poder não é absoluto: a autarquia precisa fundamentar que há “evidência de prejuízo ou risco iminente” para os povos e/ou as terras indígenas em questão.
BRASIL
Novos e antigos comandos no Congresso
Tivemos mudança no comando do Congresso, com a volta de Davi Alcolumbre (União Brasil, AP), no Senado, e a eleição de Hugo Motta (Republicanos, PB), na Câmara. Alcolumbre, natural do Amapá, é favorável à expansão da exploração de combustíveis fósseis com a abertura da frente na Foz do Rio Amazonas, sob o antigo pretexto de desenvolvimento econômico – como se não houvesse outro caminho para gerar riqueza que não aquele que resulta em emissões de gases de efeito estufa (GEE), o que torna questionável o conceito da riqueza gerada. A velha dicotomia entre natureza e dinheiro que insiste em se perpetuar até virar contradição. Porque, no mundo do século XXI, os impactos da emergência climática nos mostram que a lógica é outra.
AdaptaCidades
Enquanto a agenda de mitigação está mais encrencada para dar as caras no Plano Clima, a adaptação dá seus passos. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) lançou uma iniciativa para fazer emergir políticas de adaptação de Norte a Sul: o Programa AdaptaCidades. A partir da adesão voluntária, Estados e Distrito Federal indicam municípios que atendam aos critérios técnicos de priorização, considerando vulnerabilidade, exposição e ameaça climática. Algo que deve ser aplaudido, incentivado e monitorado para fins de lapidação. Como mostrou a análise da Política por Inteiro, o cabo da adaptação está sendo puxado, mas ainda tem fio solto. E, nunca é demais lembrar, adaptação tem limite e, por isso, depende que a mitigação caminhe em passos largos para não ser em vão.
Caminhos abertos para agenda de Adaptação na COP30
Por aqui, celebramos a confluência de mentes que se somaram à equipe Talanoa para lembrar que a agenda de Adaptação Climática deve ser a prioridade na COP30. As propostas para que isso se consolide foram entregues em mãos ao embaixador e presidente da conferência no Brasil, André Corrêa do Lago, que participou do evento realizado em Brasília, no dia 25 de fevereiro. A Ministra Marina Silva e a diretora-executiva da COP30, Ana Toni, também compuseram a programação – além de diversas lideranças globais, como a presidente da COP16, Patricia Espinosa; Richard Muyungi, chefe do Grupo Africano de Negociadores na COP 30 e enviado especial para o clima da Tanzânia; Avinash Persaud, assessor especial para mudança do clima no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); e Ali Shareef, enviado para o clima das Maldivas.
Mas que calor é esse?
E no fechamento do mês, nem os negacionistas conseguiram negar a dificuldade para aguentar o calor extremo registrado no Carnaval. Teve recordes nos termômetros na maior parte das capitais brasileiras, com mais de 30ºC na semana de pré-Carnaval. Rio 40ºC virou padrão. E a sensação térmica de insalubres 58,3ºC foi sentida na pele pelos cariocas e turistas.
MUNDO
Adiar e melhorar
Marcado para 10 de fevereiro, o prazo para entrega das NDCs foi adiado. A ONU decidiu estender a agenda para que as nações que ainda não entregaram o documento – ou seja, a maioria – pudessem se engajar no processo e aumentar a ambição. O Brasil faz parte dos 5% que cumpriram o prazo. A previsão é de que até setembro as partes apresentem as novas metas de mitigação e adaptação, a tempo de que os dados possam ser usados no relatório síntese de NDCs a ser divulgado próximo à COP30.
Troika do Clima em defesa do multilateralismo
Uma carta assinada por Emirados Árabes Unidos, Azerbaijão e Brasil – os anfitriões das COPs 28, 29 e 30, que juntos formam a “Troika do Clima” – reafirma que os pactos alcançados nas últimas duas COPs significam fôlego, mas agora demandam maior engajamento coletivo para as diferentes agendas em progresso no âmbito da Convenção do Clima.
Para quem quiser ler nas entrelinhas, a mensagem também rebate a esquisita quadra da História em que vive o multilateralismo no mundo, com a truculência querendo ganhar espaço no debate de problemas complexos, ou a ignorância como falso alento para a emergência que vivemos. Exemplo disso foi a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impedir que uma das cientistas líderes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e da NASA Katherine Calvin participasse do primeiro encontro do grupo em 2025, em Hangzhou, na China. E também de rescindir contratos de cientistas que apoiam tecnicamente o painel que é o guia científico das negociações climáticas globais.
MONITOR DE DESASTRES
Em fevereiro, o Monitor de Desastres captou 58 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que atingiram 308 municípios, um aumento de 78% em relação ao mês de janeiro.
Enquanto o Sudeste registrou inúmeras ocorrências de Tempestades, o Nordeste sentiu os impactos da falta de chuva, resultando em Estiagem e Seca, assim como no sul do Brasil, que concentrou registros de Estiagem no estado do Rio Grande do Sul. Inundações e Alagamentos foram registrados em diversas regiões do país, de maneira mais pontual.

TÚNEL DO TEMPO
A edição de fevereiro de 2022 trazia como um dos destaques a criação, por decreto, de um “Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala”, um dos ecos de uma noção de desenvolvimento que leva a lugar nenhum, senão a passivos ambientais imensos, ao empobrecimento local e à intensificação dos conflitos em municípios onde ocorre a atividade garimpeira. O Decreto foi revogado no 1º dia do ano seguinte, com a posse do atual governo.
A regulamentação do poder de polícia à Funai, concretizada neste fevereiro de 2025, colide frontalmente com o estímulo ao garimpo de três anos atrás. Hoje em dia, uma das “heranças” desse tipo de ato é o gasto volumoso de recursos públicos, tempo e pessoal para a retirada de garimpeiros de terras indígenas e Unidades de Conservação. O ultrapassado modelo de exploração até a exaustão, em detrimento de atividades baseadas na perenidade – como a bioeconomia e o turismo – ainda é uma realidade a ser combatida, sobretudo na Amazônia.