“Quantum” falta para uma COP29 bem-sucedida?

UNclimatechange/Flickr

No caminho para a 29ª Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), a 60ª Reunião dos Órgãos Subsidiários (SB60) não acelerou o  trajeto para alcançarmos em Baku um consenso sobre um dos temas mais espinhosos da agenda climática: o financiamento. Após as duas semanas de discussões na Alemanha, seguimos na rota para o Azerbaijão sem uma robusta proposta para a Nova Meta Quantificada Global de Finanças (NCQG) estruturada.

Por outro lado, a primeira atuação da Troika  – grupo criado em Dubai e que reúne representantes das presidências das COPs 28 (Emirados Árabes Unidos), 29 (Azerbaijão) e 30 (Brasil) – mostrou que o comando de um grupo assim pode ser uma boa estratégia política para manter pressão sobre os compromissos, para garantir novos acordos e para evitar que se retroceda nos resultados alcançados. Só é necessário que seus integrantes estejam alinhados.


Financiamento climático: caminho espinhoso até Baku

A SB60 deveria ser uma reunião técnica, para resolver questões procedimentais, mas que também trouxesse propostas concretas e pavimentasse um caminho mais suave rumo à COP29. Não foi exatamente o que aconteceu.

A expectativa era de que as partes começassem a estruturar uma proposta para a NCQG – que visa a substituir aquele ultrapassado e já insuficiente acordo de financiamento climático de US$ 100 bilhões anuais entre 2020-2025, que os países nunca entregaram de fato. Só que o “quantum”, o valor dessa nova e necessária meta de financiamento, nem chegou a ser discutido. O assunto travou na já velha discussão sobre quem deve pagar o quê, e para quem. 

Enquanto os países desenvolvidos focaram as conversas em temas como mobilização de recursos do setor privado e reformas dos bancos multilaterais de desenvolvimento, as nações em desenvolvimento pressionaram para que o foco se mantivesse no montante de dinheiro a ser disponibilizado. Outro impasse foi o papel das economias emergentes e de alta emissão, como a China, nesse cenário. Há uma pressão para que essas nações comecem a contribuir, mas convencê-las disso será difícil.

Um dos poucos pontos em que as partes avançaram foi na concordância de que é preciso um acesso facilitado a esse dinheiro – que ninguém até agora sabe quanto será e nem como deverá ser alocado.

Nos bastidores, em meio à rusga tradicional entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, as cifras que circulavam variavam entre US$ 1 trilhão a US$ 2 trilhões anuais, e isso provavelmente assustou alguns dos grandes emissores, que enfrentam um período de incerteza política. Bonn ocorreu em paralelo às eleições do parlamento europeu, que ficaram marcadas por um avanço da extrema-direita e pela perda do Partido Verde de um quarto dos seus assentos. Ocorreu, também, a poucos meses das eleições americanas, que tem Donald Trump como principal pré-candidato pelo Partido Republicano – o mesmo que, quando esteve no comando na Casa Branca, retirou o país, segundo maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, do Acordo de Paris.


NDCs 3.0: quando e como vêm

A dificuldade de avançar nas conversas sobre financiamento climático paralisa outras discussões-chave, como as atualizações das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), cujas chamadas versões 3.0 devem ser entregues até fevereiro de 2025 e necessariamente aumentar o nível de ambição dos países. A União Europeia, por sinal, já até sinalizou que pode não cumprir o prazo estabelecido devido à instabilidade política do bloco.

Durante a SB60, as conversas sobre as NDCs 3.0 não fizeram parte da agenda oficial da conferência, mas ocorreram em eventos paralelos. A expectativa na entrega desses compromissos atualizados é grande, pois serão as primeiras revisões após os resultados do primeiro Balanço Global (Global Stocktake, GST), que é o mecanismo de transparência do Acordo de Paris, previsto no artigo 14, que objetiva avaliar e divulgar o progresso coletivo nas metas de longo prazo do acordo entre os países-membros. A sensação durante o encontro na Alemanha, no entanto, é de que as Partes não estão muito motivadas com o tema.

A exceção foi a atuação dos representantes da Troika, que participaram de eventos sobre a NDC, onde foram lançadas algumas ferramentas para ajudar na elaboração dos documentos.


Troika: azedada ou azeitada?

Além das conversas sobre as NDCs 3.0, a Troika também liderou algumas das importantes discussões sobre os legados da COP28 e sobre financiamento. A relação entre os três países aparentemente azeitada pode e a ideia de que cada um protagonize a defesa de um tema central nas negociações – o tema principal da COP sediada em seu país – podem contribuir para o avanço dos debates caso haja disposição política para liderar as respectivas agendas.

O imbróglio sobre o financiamento também atrapalha a agenda de adaptação, um assunto cada vez mais urgente e que ninguém quer falar. A expectativa é de que, se a COP29 entregar algo concreto sobre financiamento climático em novembro de 2024, o tema adaptação possa ser a grande agenda da COP30, que ocorre em 2025 no Brasil, país que vem sofrendo intensamente com eventos climáticos extremos. É principalmente nesta frente que recaem as expectativas sobre o Brasil. A pressão é grande para que saia de cima do muro, exerça o papel de liderança no G20 e apresente uma NDC exemplar.

Apesar da frustração sobre os resultados de Bonn, ainda há tempo de melhorar o cenário para a COP29. Há uma Força-tarefa para a Mobilização Global contra a Mudança do Clima, estabelecida pela presidência brasileira do G20, que vem promovendo ao longo do ano reuniões entre governos, instituições financeiras e organismos internacionais para catalisar o alinhamento macroeconômico e financeiro global no sentido de implementar os objetivos do Acordo de Paris. Em julho, haverá as reuniões de mid-term do T20, C20, B20, etc, no Rio de Janeiro, às margens das reuniões das trilhas do G20. Em setembro, às margens da Assembleia Geral da ONU, há a Climate Week NYC, nos Estados Unidos. Em outubro, outras reuniões técnicas e ministeriais sobre a NCQG ocorrem no Azerbaijão. Ou seja, oportunidades de avanços não faltam. Basta saber se vai sobrar vontade política.

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