Como lidar com a produção de minerais estratégicos e promover a transição energética?

Planta da Sigma Lithium no Vale do Jequitinhonha (Foto: Sigma Lithium/Divulgação)

Desde 2023, o Ministério de Minas e Energia (MME) apresenta o país como detentor de grande potencial de minerais críticos e estratégicos para a transição energética. Nesse contexto, há uma questão crucial: até que ponto é possível explorar “de forma sustentável” os minérios dentro de um plano eficiente de transição para energias limpas?

Parte do potencial mineral brasileiro encontra-se na Amazônia, em áreas protegidas da floresta e terras indígenas. Há ainda a frente de exploração mineral no oceano. Dessa forma, o licenciamento ambiental é um ponto delicado e crítico.

O licenciamento da exploração mineral é feito, em grande parte, pelos Estados, como aconteceu no caso do lítio no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, uma espécie de cartão de visita para a produção de minerais estratégicos no Brasil. Em setembro, foi exportado para a China o primeiro lote de lítio denominado “de verde”, para uma empresa que produz baterias de carros elétricos. O projeto catapultou o país para o grupo dos maiores produtores do minério no mundo.

Ainda durante o governo anterior, o MME discutiu um novo plano nacional de mineração para o período até 2050, objeto de uma consulta pública. Esse plano ainda não substituiu o lançado em 2011, sem menção à transição energética. Gostaríamos de ressaltar alguns riscos e lacunas do documento:

  • Conhecimento geológico: A falta de conhecimento geológico, que faz o potencial estimado no Brasil ser pouco preciso: “Na avaliação da execução do mapeamento geológico do Brasil ao longo de três ciclos de mapeamento (1969-1993, 1994-2002, 2003-2021), observa-se que o país ainda encontra-se em estágio deficitário de conhecimento geológico, estando com apenas 48% de seu território mapeado na escala 1:250.000 e 27% na escala 1:100.000″;

  • Áreas críticas: Parte do potencial mineral encontra-se na Amazônia, na parte preservada e protegida da floresta e em terras indígenas. “Na Amazônia, apenas 37% e 8% está mapeado nas escalas 1:250.000 e 1:100.000, respectivamente, e os setores menos conhecidos representam as áreas mais ínvias, com bioma preservado, que em geral englobam terras indígenas e áreas de fronteira e/ou de proteção ambiental”;

  • Exploração no oceano: O avanço da exploração mineral no oceano encontra-se relativamente atrasado frente a outras nações. “Apesar da pesquisa mineral no mar ainda se caracterizar como estratégica, especialmente, em águas mais profundas, é importante a abordagem das demandas de substâncias minerais cada vez mais escassas no continente, que podem vir a ser supridas pelos recursos minerais marinhos”.

Um documento divulgado em 2023 sobre o potencial brasileiro em minerais estratégicos (An Overview of Critical Minerals Potencial of Brazil) integra a política de estímulo ao investimento privado que vem do governo anterior. A lista de minerais com alto potencial começa pelo cobre, com incidência na Amazônia:

Importante ressaltar que a rápida implementação de tecnologias de energia limpa como parte das transições energéticas implica um aumento significativo na procura de minerais. Documento de 2023 da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA, na sigla em inglês) sobre a geopolítica da transição energética mostra o Brasil com potencial na mineração de lítio, níquel, manganês e neodímio, além de grafite.

A rápida implementação de tecnologias de energia limpa como parte das transições energéticas implica um aumento significativo na procura de minerais.

Há movimentos na direção de conferir à exploração dos minerais estratégicos um papel de destaque na transição energética e também como peça da nova política industrial brasileira, ainda a ser detalhada. Mesmo sem uma política, o Brasil já conta, neste ano, com R$ 54,3 milhões do Orçamento da União para avançar no mapeamento geológico em busca de possíveis reservas desses materiais. A previsão de gasto com esses levantamentos geológicos é três vezes mais do que o valor inicialmente proposto pelo governo para esses estudos, num sinal do apoio político à pauta. No início de março, o BNDES lançou um fundo de até R$ 1 bilhão, com aporte parcial do banco, para financiar a exploração desses minerais.

Por aqui, no Blog da Política por Inteiro, já destacamos a falta de transparência na política, agravada pela falta de representante da área ambiental no comitê interministerial então criado, em 2021: “A política Pró-Minerais Estratégicos foi formulada para viabilizar um ‘desenvolvimento’ do país sem realizar as devidas conexões e sinergias entre as agendas envolvidas no tema” (a exemplo da falta de inserção de entidades ambientais na governança).

Dessa forma, na nossa visão, o Brasil ainda detém uma política pouco transparente de estímulo a minerais estratégicos; instituída por decreto no governo Bolsonaro e sem revisão formal pelo governo Lula. Essa política não lida com desafios de explorar de modo seguro minerais críticos disponíveis em território brasileiro e que seriam indispensáveis à transição energética.


Leia o documento que lançamos sobre isso.

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