Fundo Clima como fonte de financiamento da transição ecológica

Foto: criador de imagens do Bing
A primeira reunião do ano do Comitê Gestor do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC, ou Fundo Clima) está marcada para 24 de agosto. É um passo fundamental para destravar de vez o instrumento e fazer os recursos fluírem para a descarbonização. Em julho, o instrumento, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), cujos recursos reembolsáveis são aplicados pelo BNDES, registrava saldo de R$ 1,4 bilhão no banco de desenvolvimento, além dos R$ 634 milhões previstos na Lei Orçamentária de 2023, ainda não repassados ao agente financeiro. Além disso, o Tesouro Nacional registra paralisia no MMA da dotação de R$ 3,4 milhões deste ano para a modalidade não reembolsável. 

A capitalização do Fundo Clima com títulos soberanos vem sendo considerada parte do pacote de transição ecológica. Em julho, o diretor de Planejamento e Estruturação de Projetos do BNDES, Nelson Barbosa, informou que o governo estuda o lançamento de green bonds (títulos soberanos) pelo Tesouro Nacional para capitalizar o fundo, que poderia chegar a 2026 com R$ 20 bilhões para o financiamento da transformação necessária para uma economia de baixo carbono. O presidente do banco, Aloizio Mercadante, aposta no fundo como uma das fontes de recursos para financiar esse processo. A equipe do Ministério da Fazenda envolvida com o Plano de Transformação Ecológica estima que a emissão de green bonds renda R$ 10 milhões ao Fundo Clima. 

O Fundo Nacional sobre Mudança do Clima foi criado em 20091 com a finalidade de apoiar projetos ou estudos e financiamento de empreendimentos que visem à mitigação dos gases de efeito estufa e à adaptação às mudanças climáticas. O Fundo Clima destina recursos públicos ao financiamento de projetos nas modalidades reembolsável e não reembolsável e sua regulamentação foi alterada pelo decreto 11.549, de 20232, que mudou a composição do comitê gestor e passou a prever a habilitação de fintechs pelo BNDES para atuar nas operações de financiamento.

Cabe ao Comitê Gestor do FNMC definir, anualmente, a proporção de recursos a serem aplicados em cada uma das modalidades. A última reunião ocorreu em outubro de 20223. O comitê é atualmente presidido pelo secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco. 

A principal fonte de recursos para o Fundo Clima é a participação especial da exploração de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, além de receitas de rendimentos de aplicações das disponibilidades e pelos pagamentos de juros e amortização dos empréstimos pelo BNDES, agente financeiro do fundo. O banco pretende ampliar os aportes ao fundo por meio de lançamento de green bonds pelo Tesouro Nacional. 

O Orçamento da União registra a previsão anual de gastos para as duas modalidades dentro do programa orçamentário sobre Mudança do Clima. É possível acompanhar a execução dessas despesas via Tesouro Nacional. Até 10 de agosto, data da consulta ao sistema, não havia nenhum movimento na dotação autorizada para 2023. No caso dos recursos reembolsáveis, o Tesouro registra apenas a transferência do dinheiro para o BNDES, o que não aconteceu até o momento com os R$ 634 milhões previstos na lei orçamentária. Mercadante citou valor próximo a esse como dinheiro novo no Fundo. Tampouco houve empenhos da parcela de R$ 3,4 milhões previstos para a modalidade não reembolsável em 2023. Esse dinheiro não está sujeito aos cortes orçamentários impostos ao MMA, que atingirão outras despesas com baixo desempenho neste ano.  

Por meio da Lei de Acesso à Informação, o BNDES informou um saldo de R$ 1,4 bilhão no Fundo Clima no final de junho deste ano. Consulta às bases do banco mostra que oito contratos de financiamento foram fechados em 2023; os dois principais, de R$ 80 milhões cada, preveem a produção de biometano em Olímpia (MT) e o apoio ao desenvolvimento de veículos elétricos de pouso e decolagem verticais em São José dos Campos (SP). A data da última atualização disponível no site do BNDES é 31 de maio.

O Fundo Clima já foi objeto de ação no Supremo Tribunal Federal. Em 2020, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 708, movida por quatro partidos políticos, reclamou da paralisia dos recursos do fundo em 2019 e 2020 durante a gestão Bolsonaro, quando foi excluída a participação da sociedade civil no comitê gestor do fundo. Em julho de 2022, o STF determinou4 que o funcionamento do fundo fosse restabelecido. “Os documentos juntados aos autos comprovam a efetiva omissão da União, durante os anos de 2019 e 2020. Demonstram que a não alocação dos recursos constituiu uma decisão deliberada do Executivo, até que fosse possível alterar a constituição do Comitê Gestor do Fundo, de modo a controlar as informações e decisões pertinentes à alocação de seus recursos”, escreveu o ministro-relator, Luís Roberto Barroso durante o julgamento inédito na histórica da política climática. 

Consulta a registros do Tesouro Nacional permite visualizar a série histórica do Fundo Clima. Em dez anos, foram desembolsados, na modalidade não reembolsável, R$ 79,6 milhões, em valores já corrigidos pela inflação. Desde 2017, foram repassados ao BNDES para financiamentos pouco mais de R$ 2 bilhões, também em valores corrigidos pelo IPCA. Os detalhes podem ser vistos no painel abaixo. O último relatório de gestão do Fundo Clima disponível data de 20215. Já os empréstimos concedidos via BNDES podem ser consultados em operações contratadas de forma direta e indireta não automáticas nesta página web.


Considerações finais

A demora para a retomada do fluxo de desembolsos e empréstimos do Fundo Clima pode estar associada ao fato de que o Comitê Gestor do fundo ainda não se reuniu no atual governo. Dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação e de consultas a diferentes bases de dados do Tesouro Nacional mostram um saldo de R$ 1,4 bilhão para empréstimos antes mesmo do repasse ao BNDES de R$ 634 milhões previstos no orçamento deste ano para novos financiamentos. Tampouco houve qualquer movimento na parcela (menor) destinada à modalidade não reembolsável. 

Detalhes da execução orçamentária, a série histórica dos desembolsos e os projetos contemplados nos últimos anos pelo Fundo Clima podem ser visualizados no painel abaixo.


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