Nesta semana, o Monitor de Atos Públicos captou 32 normas relevantes publicadas no Diário Oficial da União. Foi a semana com o maior número de atos publicados em 2022. Esse volume se deu, principalmente, por conta de portarias de criação e recriação de Grupos Técnicos (GTs) nos temas Marinho e Mudança do Clima. Não à toa, o tema mais recorrente foi Marinho (9), com atos originados na Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM). Entre as classes, Planejamento teve o maior número de normas (13), também devido aos atos relacionados aos GTs. Outro ato de destaque da semana, por conta da repercussão provocada pelo assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, foi a prorrogação da proibição da pesca e do comércio da piracatinga em todo o país. A moratória venceria em 2 de julho. A portaria da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAP/MAPA), estendeu o prazo de vencimento da medida por mais um ano. A pesca ilegal da piracatinga e do pirarucu era uma das ilegalidades denunciadas por Bruno Pereira no Vale do Javari, no Amazonas, onde ele foi morto no início do mês. Veja a nossa análise sobre a prorrogação da proibição e como a pesca ilegal é mais um nó no emaranhado de redes criminosas que agem na Amazônia: OCDEO Fórum Brasil-OCDE ocorreu em Brasília, com a participação do secretário-geral da organização, Mathias Cormann. Houve conversas entre diferentes agentes interessados na acessão do Brasil à OCDE, tal como a Confederação Nacional da Indústria (CNI). O evento foi visto como um inicializador das discussões para o ingresso num contexto pós-publicação do roteiro de acessão (“roadmap”). A iniciativa também teve o objetivo de divulgar esse processo de entrada perante a sociedade brasileira, que ainda não está engajada totalmente nas discussões que se darão ao longo desse caminho. O secretário-geral da OCDE se encontrou também com o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No encontro com Pacheco, enfatizou a necessidade de o Brasil cumprir os pré-requisitos para acesso à organização, em especial no que concerne à reforma tributária e ao meio ambiente. Neste mesmo encontro, o secretário-geral da OCDE mencionou que alguns países do grupo acreditam que o Brasil não tem se esforçado seriamente para cumprir as metas ambientais e os compromissos assumidos na COP 26, em Glasgow. Fundo AmazôniaO governo norueguês fez uma importante sinalização sobre o Fundo Amazônia. O dispositivo pode ser “descongelado” e a parceria ser retomada rapidamente, “desde que a oposição faça o que diz que vai fazer” se ganhar eleições, disse o ministro norueguês de meio ambiente e clima. A paralisação do Fundo Amazônia está pendente de julgamento na “Pauta Verde” do STF, conforme apontamos na Análise Mensal de maio e no Boletim Semanal. Acesse nossa Nota Técnica sobre a “Pauta Verde” do STF. Comissão Interministerial para os Recursos do MarNesta semana, foram publicados atos de criação e recriação dos Grupos Técnicos no âmbito da CIRM que não haviam sido reestruturados em agosto de 2020. O GT “PIB do Mar” foi recriado, mantendo inalteradas suas composição e finalidade, relacionada à Economia Azul ou Economia do Mar. Foi recriado o GT “Ártico”, com a inserção em sua composição da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que, segundo a norma, já contribuiu na qualidade de observador e será fundamental na possível adesão ao Tratado de Svalbard, conforme recomendado pelo GT e comentado na sessão das normas da semana. Além das recriações, foi criado o GT “Prevenção e Combate à Pesca INN (ilegal, não-declarada e não regulamentada)” para atuar no combate às fraudes e às irregularidades na atividade pesqueira. Seria esse ato já uma resposta à discussão levantada pela pesca ilegal neste mês, como apontado mais acima? Embaixadora rejeitadaCom um placar de 11 a 11, o nome da embaixadora Elizabeth Bagley não passou pelo Comitê de Relações Exteriores do Senado norte-americano para assumir a representação de Washington no Brasil. Bagley é uma indicação do presidente Biden e não costuma ser comum os senadores irem contra uma indicação presidencial. A rejeição teria relação com críticas feitas por Elizabeth a “lobby judeu”. Tributação de combustíveisFoi sancionada a LEI COMPLEMENTAR Nº 194, DE 23 DE JUNHO DE 2022, que altera a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), e a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), para considerar bens e serviços essenciais os relativos aos combustíveis, à energia elétrica, às comunicações e ao transporte coletivo. A medida visa a conter a alta dos preços dos combustíveis em ano eleitoral. Já alertamos para a questão do ICMS na nossa Análise Mensal de maio e no último Boletim, quando abordamos que a aprovação do projeto no Senado Federal era vista como uma vitória do governo federal, que vinha culpando os estados pela alta dos combustíveis, ignorando as altas causadas pela política de precificação do petróleo. Confira os sinais políticos relevantes relacionados à mudança do clima nos estados da Amazônia Legal Mato Grosso | Legislativo Projeto de Lei nº 3/2022 (apensado 561/2022) O PL que visa a permitir a pecuária extensiva em áreas de preservação permanente de pastagens nativas no Pantanal foi a plenário para votação em 22/6. Após o pedido de vistas do Dep. Lúdio Cabral, a votação será retomada na próxima semana (29/6). O projeto prevê ainda a liberação de obras de infraestrutura e abastecimento necessárias às atividades de pecuária e turismo e foi embasado em controverso estudo da EMBRAPA em parceria com a SEMA/MT. Twitter A alta dos combustíveis voltou a ser o assunto central da semana em nosso monitoramento do Twitter, que, em parceria com a Folha de S.Paulo, acompanha autoridades e políticos relacionados a clima e meio ambiente. Apenas em 2022, o preço do diesel já acumula aumento de 68% e a gasolina de 31%. Os reajustes têm sido causa de atrito entre a estatal e o governo federal, que teme efeitos em ano eleitoral. O presidente da Petrobras, José Mauro
Tem peixe grande? A pesca ilegal e a criminalidade na Amazônia
A pesca da piracatinga (Calophysus macropterus) seguirá proibida no Brasil. A moratória para captura da espécie, que venceria no dia 2 de julho, foi prorrogada por portaria da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAP/MAPA), publicada nesta quinta-feira (23). A pesca ilegal da piracatinga e do pirarucu (Arapaima gigas) ganhou o noticiário internacional nas últimas semanas, associada ao assasinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, na Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas. Ilustração: @crisvector A PORTARIA SAP/MAPA Nº 1.082, DE 22 DE JUNHO DE 2022 prorroga por mais um ano a proibição que havia sido estabelecida pela PORTARIA SAP/MAPA Nº 271, DE 1º DE JULHO DE 2021. Ambas foram capturadas pelo Monitor de Atos Públicos da POLÍTICA POR INTEIRO. Na prática, a pesca e a comercialização da piracatinga estão proibidas no país desde 1º de janeiro de 2015, pela Instrução Normativa Interministerial MPA/MMA (o antigo Ministério da Pesca e Aquicultura e o Ministério do Meio Ambiente) nº6/2014. Como explicamos neste post publicado no ano passado, quando um Grupo de Trabalho no MAPA analisou a moratória, na pesca da piracatinga utilizam-se como iscas o boto-vermelho (Inia geoffrensis) e o boto tucuxi (Sotalia fluviatilis), espécies ameaçadas de extinção e de caça também proibida. O veto à pesca da piracatinga é uma tentativa de proteger o boto. A piracatinga é exportada ilegalmente para a Colômbia. Já o pirarucu, um dos maiores peixes de água doce do mundo, considerado uma espécie ameaçada desde a década de 1980, pode ser pescado – ou melhor, caçado, dado o seu tamanho – somente dentro de sistemas de manejo. A pesca da espécie já chegou a ser totalmente proibida no Brasil, mas foi liberada após experimentos exitosos em lagos, em áreas protegidas, como na Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá. Mesmo com as normas federais, ocorrem tentativas de liberação nos Estados, como um projeto de lei proposto em Rondônia para alterar a Lei Estadual de 2011 e liberar a captura profissional do pirarucu sob a justificativa de superpopulação da espécie. A proposta visa à erradicação da espécie para reequilíbrio da fauna aquática nativa, considerando o pirarucu um peixe exótico no Vale do Guaporé. Movimentações como essa são capturadas pelo projeto de monitoramento subnacional da Política Por Inteiro, o Foco Amazônia. A pesca ilegal, mais um nó no emaranhado de redes criminosas na Amazônia A repercussão do assassinato reverberou as denúncias que Bruno Pereira vinha fazendo sobre as organizações criminosas atuando no Vale do Javari, onde o Brasil faz fronteira com Colômbia e Peru. Em entrevista ao Jornal Nacional nesta quinta, o superintendente da Polícia Federal (PF) no Amazonas, Eduardo Fontes, disse que não descarta a hipótese de que haja um mandante para o crime. No dia 17, a PF havia emitido nota afirmando: “As investigações também apontam que os executores agiram sozinhos, não havendo mandante nem organização criminosa por trás do delito”. As notícias de organizações criminosas na Amazônia geralmente estão associadas a madeireiros ilegais, grileiros e caçadores. Nas regiões fronteiriças, incluem o narcotráfico. Não é comum a pesca ilegal no centro das investigações de crimes como o homicídio de Bruno Pereira e Dom Phillips. Porém, o caso mostra que a intrincada rede de ilícitos no Vale do Javari, com invasões da segunda maior terra indígena do país, envolve também essa frente criminosa. A maior multa já aplicada pelo IBAMA nos últimos 30 anos por pesca ou comércio ilegal de peixe no Amazonas foi emitida em 2019, por transporte ilegal de pirarucu, na região do Vale do Javari, segundo levantamento da Agência Pública. Um barco que se dirigia à Colômbia com mais de duas toneladas de pirarucu ilegal foi multado em R$ 10 milhões. Muitas vezes, a pesca e o comércio ilegais do pescado estão associados à lavagem de dinheiro ou na logística do narcotráfico mundial, como no caso desbaratado pela Operação Mar Aberto, da PF, no ano passado. Peixes enormes como o pirarucu podem acabar sendo usados como “mulas” para esconder drogas por essas quadrilhas. A pesca ilegal, não declarada e não regulamentada A pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (em inglês, IUU: illegal, unreported and unregulated fishing) é considerada pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) como um dos pontos fundamentais a serem enfrentados para reconstituição dos estoques pesqueiros de espécies vulneráveis. “Não é um fenômeno novo na pesca de captura nem está confinada à pesca em alto mar. Ela também ocorre nas zonas econômicas exclusivas (ZEEs) dos Estados costeiros por embarcações nacionais e estrangeiras e na pesca fluvial e continental”. No Brasil, a situação é ainda mais preocupante por não haver sequer estatística pesqueira oficial desde 2009. Sem dados, nenhuma medida de ordenamento pesqueiro pode ser eficiente. Não à toa, as listas de espécies aquáticas ameaçadas só crescem. >> Leia também: Governo prepara modificação nas normas sobre o uso de espécies ameaçadas Em meio ao caos da ausência de dados da pesca marinha e continental e ao desmonte e enfraquecimento dos órgãos ambientais, as áreas protegidas despontam como um último reduto de ordenamento pesqueiro. Nelas, em tese, quem é de fora não pode pescar, e os estoques pesqueiros conseguem aumentar ali, como é o caso da Terra Indígena do Vale do Javari. No entanto, exatamente por serem áreas mais abundantes de recursos naturais, viraram o foco da criminalidade, atraindo pescadores ilegais. O quadro das políticas para o setor, que já não era dos melhores, piorou a partir de 2019, quando a gestão da área saiu da seara ambiental, passando a ser coordenada apenas pelo setor produtivo, sem nenhum tipo de apoio para ações de comando e controle. As desregulações e flexibilizações e outras normas em Pesca – um dos assuntos mais comentados pelo presidente Jair Bolsonaro em suas lives – nos dois primeiros anos de governo foram analisados na publicação especial da Política Por Inteiro: Pesca por Inteiro. A pesca e a ambição de entrar na OCDE A análise da política pesqueira está no roteiro a ser