O Brasil dificilmente será aceito na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) se não reduzir o desmatamento, afirmaram o embaixador Carlos Marcio Cozendey (na foto acima), delegado do Brasil na entidade, e o embaixador norueguês no Brasil, Odd Magne Ruud (foto abaixo), em evento promovido pelo Instituto Talanoa, nesta terça-feira (14).
A exigência deve ocorrer mesmo que não haja ainda um critério ou uma decisão da OCDE a respeito do tema, ressalvou Cozendey. “OCDE não tem uma tradição sobre isso, terá de aprender e decidir no que está interessada a respeito”, afirmou.
Segundo Cozendey, florestas e clima serão pontos de especial atenção dos membros na avaliação brasileira. O embaixador comentou o roadmap da acessão do país à Organização (um roteiro de avaliação para a entrada), divulgado na semana passada. De 30% a 40% dos instrumentos elencados no documento – comum aos atuais postulantes a ingressar (além do Brasil, Bulgária, Croácia, Peru e Romênia) – são na área de meio ambiente e clima. “Não basta o membro chegar e dizer quero aderir. Ele tem que mostrar que suas políticas, legislação, práticas são compatíveis com este acervo que os membros definiram como as melhores práticas”, disse Cozendey, que detalhou como ocorrem as avaliações e negociações para a acessão
Cozendey falou diretamente de Paris, no evento online. De Brasília, falou o embaixador da Noruega no Brasil, Odd Magne Ruud, dando uma visão de um país-membro, confirmando que florestas é tema relevante. O embaixador elogiou os compromissos assumidos pelo Brasil em Glasgow, na COP 26, mas lembrou os recordes de desmatamento no ano passado.
“Apesar do discurso de Glasgow, os números que vimos no ano passado (de desmatamento) são mais altos dos que os vistos até então, portanto acaba soando contraditório com o que estão prometendo”, disse o embaixador, respondendo pergunta a presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell. “Esse processo deve gerar melhorias regulatórias e legais. Estamos otimistas, mas esperamos ver o comprometimento político do Brasil no assunto”, disse Rudd. Ele afirmou que a Noruega apoia totalmente a acessão do Brasil à OCDE.
O embaixador norueguês disse acreditar que incluir um país da dimensão brasileira é bom para todos da organização. Ele destacou não apenas as florestas, mas também o fato de o Brasil ser um “país oceânico”, como a Noruega. Assim como Cozendey, Ruud afirmou que o longo processo de ingresso é uma oportunidade para realizar importantes adaptações legais e de políticas. O Brasil é o terceiro mercado mais relevante para os investidores noruegueses, depois de Europa e América do Norte. Segundo o embaixador, os investidores, ao mesmo tempo que acreditam no Brasil e pretendem aumentar seus negócios no país, queixam-se dos complexos sistemas tributário e legal.
Cozendey endossou a fala do embaixador norueguês e acrescentou que cada vez os governos e autoridades estão mais convencidos de que o melhor caminho para manter as florestas é encontrar atividades econômicas que possam beneficiar a floresta, mas isso não é tarefa fácil. Ele afirmou que o Brasil já busca, atualmente, espaço na OCDE para discussões nesse campo, como bioeconomia.
Justamente um papel que o professor dr Alberto Pfeifer (IEA-USP), moderador do evento, acredita que o Brasil possa ter dentro da organização. Me atrevo a dizer que podemos liderar reflexões, proposições dentro da temática ambiental na OCDE”, disse o professor.
>> Confira análise sobre o roadmap do Brasil
As agendas ambientais e o comércio internacional
A professora Vera Thorstensen (CCGI-FGV), pesquisadora na área de comércio internacional, apresentou seu estudo sobre como o comércio entre os países é refletido pelas agendas ambientais, mostrando que os sistemas presentes não conversam. Há dados da Organização Mundial do Comércio (OMC), mecanismos da OCDE, práticas e indicadores ESG, entre outras agendas verdes. A pesquisadora enfatizou que, se o Brasil quer exportar precisa trabalhar a política de meio ambiente nas exportações. “Meio Ambiente é importante. Ou você exporta, tem uma política comercial ou tem uma política ambiental e se estas duas não se falarem o Brasil vai ter problemas”, destacou.
Karina Bugarin fechou as apresentações destacando sua publicação que enfatiza que necessitamos qualificar este debate e trazer estudos técnicos para embasar as decisões no que tange à agenda verde. O exercício de abrir o país gera ganhos de produtividade ao longo do caminho de ascensão à OCDE. “Se a gente fizer esse processo de ascensão corretamente, fazendo compatibilização normativa, ganhando transparência, fazendo com que a sociedade inteira entenda para que está servindo a OCDE, o Brasil consegue se tornar um país mais eficiente”.
Assista na íntegra ao evento “Brasil na OCDE: Perspectivas para florestas e mudanças climáticas”: