Nesta semana, o Monitor de Atos Públicos captou 17 normas relevantes. Os temas Mudança do Clima, Desastres e Institucional foram os mais recorrentes (3 atos cada). Entre as classes, a Regulação teve mais atos (7). O tema Mudança do Clima tem seguido em alta desde o último trimestre de 2021, coincidindo com o período pós-COP26. Ainda resta praticamente uma semana de monitoramento em março e já temos o recorde mensal da categoria, com 11 atos até aqui. As três normas desta semana estão relacionadas ao Programa Metano Zero, lançado pelo governo federal (leia mais abaixo). EVOLUÇÃO DE ATOS – TEMA: MUDANÇA DO CLIMA Metano ZeroO Governo Federal lançou oficialmente as iniciativas em relação a biometano e biogás, com o Programa Nacional de Redução de Metano de Resíduos Orgânicos – Metano Zero. Foram publicadas no DOU normas sobre o incentivo ao uso sustentável, redução de emissões e inclusão da atividade de produção de biometano no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI). Essas regras têm relação com o compromisso global de redução de 30% da emissão de metano na atmosfera, assinado pelo Brasil na COP26 em Glasgow (Escócia), ocorrida no final de 2021. Metano a milNa próxima semana, vence o prazo estabelecido pela Resolução CNPE 28/2021 para que o Ministério de Minas e Energia (MME), a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) elaborem e publiquem edital para qualificação de projetos de “poço transparente”, de que trata o Decreto 10.336/2020. “Poço transparente”, assim como exploração e produção de “recursos não convencionais”, é uma das denominações para projetos de fraturamento hidráulico (fracking). Conforme já apontamos em boletim semanal anterior, o Brasil tem se movimentado para liberar empreendimentos de fracking – técnica que causa grande impacto socioambiental, com elevada emissão de metano. No início do mês, servidores do MME realizaram visita técnica à província de Neuquém, na Patagônia, principal polo de fracking na Argentina. FBMCO Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC) se reuniu pela primeira vez sob a coordenação de Marco Antônio Fujihara. Foram duas reuniões, com uma pauta aberta, em que os presentes foram divididos em grupos para discutir quais temas seriam mais relevantes para a atuação do órgão. No segundo dia, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, participou, assim como o secretário de Clima e Relações Internacionais do MMA, Marcus Paranaguá, e seu secretário-adjunto, Marcelo Freire. À véspera do anúncio do programa Metano Zero, Leite reforçou as temáticas relacionadas a metano e ao mercado de carbono, mas sem grandes novidades. Afirmou que “estão desenhando” um consenso no Congresso Nacional quanto ao Projeto de Lei sobre carbono (PL 2148/2015 e seus apensados, incluindo o PL 528/2021). As duas reuniões do FMBC estão disponíveis no YouTube em: https://youtu.be/vv7YO5HaC04 (vídeo não listado no canal do MMA) e https://youtu.be/C6YHodAan0s. PL do Mercado de Carbono travadoEssa tentativa de busca de um consenso para os PLs do mercado de carbono na Câmara movimentaram bastante os bastidores do Congresso, mas com nenhum reflexo em andamentos legislativos. Há informações de que o governo elaborou um substitutivo, mas que desagradou diferentes atores que já tiveram acesso a esse conteúdo. Há um esforço para que a matéria seja aprovada no primeiro semestre. Pauta verde no STFNa próxima semana, a agenda socioambiental e climática terá um espaço inédito no Supremo Tribunal Federal (STF). A sessão de julgamentos de quarta-feira (30) está inteiramente tomada pela pauta verde, com a análise de sete ações. O Instituto Talanoa, do qual a Política Por Inteira é uma das iniciativas, avalia que a aceitação da procedência de todas as ações tem potencial de aproximar o Brasil do cumprimento das metas/compromissos climáticos, bem como de se construir uma jurisprudência de base sólida quanto a temáticas extremamente relevantes como desmatamento, investimento em órgãos ambientais e qualidade do ar. Nota Técnica elaborada pela equipe será publicada na próxima semana, analisando cada ação e trazendo dados, fatos e argumentos que demonstram a oportunidade que o STF tem em mãos para um passo fundamental nas políticas públicas brasileiras. Esquenta para a pauta verdeOs ex-ministros de Meio Ambiente anteriores ao governo Bolsonaro se reuniram nesta semana com o presidente do STF, ministro Luiz Fux, para discutir a pauta verde. O STF (ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes) já havia recebido há duas semanas diversos artistas para também discutirem a pauta socioambiental. E não são somente os adultos que se movimentam nessa importante agenda. Numa iniciativa envolvendo escolas e organizações da sociedade civil, crianças elaboraram desenhos e cartas com as razões para que o STF atue na proteção ambiental. Imbróglio dos AbrolhosO IBAMA publicou uma portaria normativa para anular um ato de 2006 que, por decisão judicial, estava suspenso há mais de dez anos e definia os limites da Zona de Amortecimento (ZA) do Parque Nacional Marinho de Abrolhos. A anulação cumpre determinação judicial emitida no início deste mês. No Blog da Política Por Inteiro, explicamos os embates que duram mais de 15 anos sobre o estabelecimento desta área em torno de uma das regiões mais biodiversas do mar brasileiro. Arrastão na pescaHá duas semanas, apontamos a publicação de norma que estabelece as medidas de ordenamento, registro e monitoramento da pesca de arrasto de praia no Mar Territorial no Estado de Santa Catarina. Agora a celeuma é no Rio Grande do Sul. Portaria da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAP/MAPA) estabeleceu “regras adicionais para a pesca sustentável de arrasto motorizado de camarão na faixa marítima da zona costeira adjacente ao Estado do Rio Grande do Sul, das 3 (três) milhas náuticas até as 12 (doze) milhas náuticas”. A questão já está no STF por conta de uma legislação estadual que proíbe a pesca de arrasto. Atualmente, há uma liminar concedida pelo ministro Nunes Marques para manter a atividade liberada na região, conforme já comentamos. A norma desta semana provocou mais reação na Assembleia Legislativa gaúcha,
Abra os olhos para o imbróglio dos Abrolhos
Fonte: ICMBio Nesta semana, o IBAMA publicou uma portaria normativa para anular um ato de 2006 que, por decisão judicial, estava suspenso há mais de dez anos e definia os limites da Zona de Amortecimento (ZA) do Parque Nacional Marinho de Abrolhos. A anulação nesta semana cumpre determinação judicial emitida no início deste mês. É o desfecho de embates que duraram mais de 15 anos. Para entender a norma editada agora, é necessário recuperar o histórico da elaboração da Portaria IBAMA no 39, de maio de 2006 e os imbróglios que se seguiram até sua suspensão. Para começar, por que foi criada a ZA de Abrolhos? O que são os recifes de coral Os recifes de coral são estruturas vivas, formadas pelo acúmulo de esqueletos de animais e vegetais, como corais, moluscos e algas calcárias. Para sua construção, é necessária a atuação conjunta de uma infinidade de seres que formam uma complexa teia de associações e eventos em sucessão. Os corais são os seres que prevalecem neste ambiente – animais marinhos, que se mantêm fixos no mesmo local até o fim de suas vidas, por isso o nome genérico de recifes de coral. Os recifes estão em permanente crescimento e formam enormes ecossistemas, sendo o mais diverso habitat marinho. Por isso, possuem grande importância econômica, social e cultural, representando fonte de alimento e renda para milhares de comunidades costeiras. Os recifes estão para o ambiente marinho como as florestas tropicais estão para os ambientes terrestres – os maiores centros de biodiversidade do planeta. Devido às exigências ambientais de crescimento desses organismos, as condições ideais para o desenvolvimento dos recifes de coral encontram-se entre 23°C e 25°C de temperatura média anual da água, na faixa tropical da Terra. Mas exatamente por toda essa intrincada teia de vida, os recifes de coral estão entre os ambientes mais ameaçados do mundo. Estudos registram que já foram perdidos aproximadamente 50% desses ambientes. E as previsões do IPCC apontam que, com 1,5oC de aumento da temperatura, já teremos o desaparecimento de 70% a 90% dos recifes. Com o aumento de 2,0oC, perdem-se praticamente todos. Dessa forma, esses ambientes são apontados como os primeiros ecossistemas a serem funcionalmente extintos com os atuais níveis de emissão dos gases de efeito estufa. Criar e ampliar áreas marinhas protegidas são as principais ações para aumentar a saúde desses ambientes, propiciando o aumento de sua capacidade de resiliência frente ao aumento de temperatura. O Brasil possui os únicos ambientes recifais do Atlântico Sul, que ocorrem do Maranhão até o sul da Bahia, mapeados pela primeira vez em 2003. Nesses ambientes, destaca-se o banco dos Abrolhos¹, o maior banco de corais e mais importante berçário das baleias jubartes do Atlântico Sul. Além disso, abriga e recebe espécies de tartarugas e aves marinhas, e uma infinidade de peixes e invertebrados, compondo a maior biodiversidade marinha do Brasil. Abrolhos possui ainda as únicas formações recifais no formato de grandes cogumelos, os chamados “chapeirões”. Eles formam colunas de coral de até 20 metros de altura, que se erguem abruptamente do fundo, abrindo em arcos perto da superfície. A principal espécie formadora dos chapeirões é o coral-cérebro, endêmica da Bahia. Um levantamento rápido da biodiversidade da região registrou aproximadamente 1.300 espécies, 45 delas consideradas ameaçadas, segundo as listas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e a ainda atual, publicada pela Portaria 445/2014, do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Parque dos Abrolhos: o primeiro Parque Nacional Marinho do Brasil Em 1983, foi criado o primeiro Parque Nacional Marinho do Brasil, o Parque dos Abrolhos, por meio do Decreto n° 88.218, representando um marco para a conservação marinha brasileira. No entanto, o parque, abarcando dois polígonos distintos, cobre apenas 87.943 ha desse enorme banco, representando 0,92% de toda sua área. No banco dos Abrolhos, encontram-se também três Reservas Extrativistas Marinhas: Canavieiras, mais ao norte; Corumbau, contígua aos limites do Parque Nacional de Monte Pascoal; e Cassurubá, nos manguezais mais ao sul, no município de Caravelas, onde fica a sede do Parque Nacional (ver figura). Petróleo no banco de Abrolhos e a zona de amortecimento Em 2003, aconteceu a primeira ameaça de leilão de um bloco de petróleo na área do banco. Na época, o MMA reuniu os maiores especialistas em biodiversidade marinha, que elaboraram um parecer contrário ao leilão. O ministério ganhou, então, a queda de braço com o Ministério de Minas e Energia, afastando momentaneamente o fantasma que rondava os Abrolhos. E o Ministério Público Federal obteve o congelamento das ofertas da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em uma ação civil pública movida pela sociedade civil. Entendendo a fragilidade da situação, visto o tamanho reduzido da unidade de conservação, foi organizado um grande e completo estudo para subsidiar a delimitação das zonas de amortecimento do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e da RESEX Marinha do Corumbau por meio da avaliação de impactos potenciais de derramamentos de óleo. O estudo realizou simulações para o caso de algum tipo de vazamento em alguma das possibilidades de colocação de blocos de exploração. Desse modo, de maneira ousada, o IBAMA, gestor das UCs federais à época, definiu a Zona de Amortecimento do Parque abrangendo toda a área do banco dos Abrolhos, incluindo os manguezais adjacentes ao banco. Proibiu-se, em toda a sua extensão, “qualquer atividade de exploração e produção de hidrocarbonetos”. A ZA, estabelecida pela portaria IBAMA 39/2006, tinha o tamanho de 9,7 milhões de ha, sendo 100 vezes maior do que o Parque. Carcinicultura e o banco de Abrolhos Na mesma época, porém, outra ameaça se colocava na região: estava prevista a implantação do maior empreendimento de carcinicultura na área dos manguezais de Caravelas, com o aval do Governo do Estado da Bahia. Esse grupo, sentindo-se ameaçado pela instituição da ZA, subsidiou o MME e o governo do Espírito Santo a contestarem a legalidade da Portaria com base na justificativa de que o ato de tamanha expressão deveria ser definido em instrumento de igual poder hierárquico ao ato que criou a