Nesta semana, 18 normas relevantes foram captadas pelo Monitor de Atos Públicos da POLÍTICA POR INTEIRO. A classificação com mais ocorrências foi “Regulação”, com oito normas. Entre elas, destaque para a publicação da minuta do Plano Decenal de Expansão de Energia 2030 (PDE 2030), que se encontra agora em consulta pública por 30 dias. A única norma considerada de “Desregulação” da semana é do tema “Pesca” e refere-se à cessão de uso de espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura. Confira uma análise detalhada sobre a nova norma em nosso site. Entre os pontos de desregulação, está a exclusão do Ibama da análise para as cessões. O decreto também possibilita à União repassar aos Estados a gestão da aquicultura nesses reservatórios. A essa norma soma-se, na mesma temática Pesca, decisão do ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedendo liminar que autoriza a pesca de rede de arrasto nas 12 milhas náuticas (mar territorial) da faixa marítima da zona costeira do Rio Grande do Sul. O ministro Celso de Mello em dezembro do ano passado já havia negado liminar. E, no mês passado, como contamos em um boletim anterior, o procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestara-se pela improcedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.218, proposta pelo Partido Liberal (PL), contra lei gaúcha que proíbe a pesca com rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, nas 12 milhas náuticas. Os empresários da pesca industrial não aceitam a proibição. Esta é mais uma questão polêmica envolvendo a Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e os Estados, que buscam respaldo para implementar leis mais restritivas que as federais visando à proteção ambiental.No Congresso, o Senado aprovou o Projeto de Lei 5.028/2020, que cria a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA). A matéria institui pagamento, monetário ou não, para serviços que ajudem a conservar áreas de preservação, informa a Agência Senado. De origem na Câmara e aprovado com modificações no Senado, agora retorna aos deputados para nova análise. Há mobilização para que o PL seja votado já na segunda-feira (21), às 14h.Em sentido contrário, aprovada na Câmara e agora encaminhada para o Senado, caminhou nesta semana a Medida Provisória 998, que reorganiza o setor elétrico. Um dos pontos questionados pelos setores ambientais é a retirada de subsídios para energia solar, eólica e de biomassa. O texto foi alterado, segundo a Agência Câmara, e os benefícios, que se encerrariam em setembro, foram prorrogados por 12 meses após a publicação da lei.Por último e não menos importante nesta semana: lançamos o Monitor da Política Ambiental em parceria com a Folha de S.Paulo. É mais uma ferramenta para você acompanhar as ações do governo federal na área ambiental e de mudança do clima. Na estreia, foram publicados gráficos com análises quantitativas e qualitativas de mais de 2.000 atos captados no Diário Oficial da União desde janeiro de 2019. Acesse aqui o Monitor. Para saber sobre nossa metodologia esse projeto, confira este post em nosso site. Atos por tema: Institucional (9), Energia (3), Meio Ambiente (2), Pesca (2), Cidades (1) e Desastres (1) Abaixo, os principais atos captados: Segunda-feira (14 de novembro) PORTARIA Nº 450, DE 11 DE DEZEMBRO DE 2020 – RegulaçãoPORTARIA Nº 451, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2020 – RegulaçãoNa segunda-feira, foi publicada a portaria do Ministério de Minas e Energia (MME) que divulga, para consulta pública, a minuta do Plano Decenal de Expansão de Energia 2030 – PDE 2030. O prazo para contribuições ao documento é de 30 dias, a partir da publicação da norma, por meio do site do MME. No site da POLÍTICA POR INTEIRO, um breve comentário sobre a minuta, destacando, entre outros pontos, a controversa inclusão da incineração de resíduos sólidos urbanos como fonte de energia renovável. Nesta semana (quinta-feira), outro destaque em Energia foi a portaria aprovando o Relatório do Plano Nacional de Energia 2050 – PNE 2050, que está disponível aqui.INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 13, DE 9 DE DEZEMBRO DE 2020 – Reforma InstitucionalPORTARIA Nº 1.126, DE 9 DE DEZEMBRO DE 2020 – Reforma InstitucionalNa temática Institucional, foi publicada a Instrução Normativa do ICMBio acerca de normas e procedimentos para editais e contratos das concessões de serviços, áreas ou instalações de apoio à visitação em Unidades de Conservação federais. A norma revogou a Instrução Normativa nº 9/2018/GABIN/ICMBio, de 10 de julho de 2018, que regulamentava a matéria, promovendo, então, reforma em competências e estruturas dos comitês de acompanhamento do processo licitatório. Com a revogação da IN anterior, houve a necessidade de publicação de outra portaria do ICMBio para criar o Comitê Especial de Concessão (CEC), que é instância colegiada, de caráter consultivo e deliberativo, com a atribuição de estabelecer as diretrizes, estratégias e supervisionar o processo de concessão de serviços, áreas ou instalações de apoio à visitação em unidades de conservação federais. Isso porque a CEC estava instituída pela IN de 2018.Essas duas normas vêm na sequência de outras medidas governamentais relativas às concessões no âmbito do ICMBio, tal como a PORTARIA Nº 1.125, DE 9 DE DEZEMBRO DE 2020, que dispõe sobre o parcelamento de créditos do ICMBio oriundos dos contratos de concessão, reportado no nosso último boletim semanal. Terça-feira (15 de dezembro) DECRETO Nº 10.576, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2020 – DesregulaçãoNa temática “Pesca”, foi publicado decreto que dispõe sobre a cessão de uso de espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura. A questão era anteriormente regida pelo DECRETO Nº 4.895, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2003, que trazia os termos “autorização de uso” e não “cessão de uso”. Além dessa mudança, em relação ao texto anterior, foram trazidas diversas novidades, apontando no sentido da desregulação da atividade. Entre as principais diferenças, a exclusão do Ibama da análise para uso dos reservatórios para criação de peixes e possibilidade de passar aos Estados a gestão dos Parques Aquícolas – e o decreto coloca que não serão mais demarcados novos parques. Leia uma análise completa do decreto no site da POLÍTICA POR INTEIRO. Quarta-feira (16 de dezembro) PORTARIA Nº 6.612, DE 11 DE DEZEMBRO DE 2020 – RegulaçãoA Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) publicou portaria que aprova o Plano de Gestão Anual (PGA) da agência para o exercício 2021. Dentre os alinhamentos de planejamento estratégico, a maioria possui metas e orçamentos maiores que em 2020. Contudo, destacam-se as reduções para (i)
A liminar de Nunes Marques liberando pesca de arrasto no RS e as desregulações do governo no setor
Em mais um capítulo da disputa entre a Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e os Estados acerca das regulações sobre a pesca e dispositivos de proteção ambiental, o recém-empossado ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar suspendendo efeitos de lei do Rio Grande do Sul. Com a decisão, proferida na terça-feira (15), fica autorizada a pesca por meio de rede de arrasto nas 12 milhas náuticas (mar territorial) da faixa marítima da zona costeira, que havia sido proibida pela norma estadual. Na terça-feira (15), o magistrado acatou o pedido feito na Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.218, proposta pelo Partido Liberal (PL). A ADI tendo como objetivo questionar a legitimidade jurídico-constitucional do parágrafo único do art. 1º e da alínea “e” do inciso VI do art. 30, ambos da Lei estadual nº 15.223/2018, editada pelo Estado do Rio Grande do Sul, que “institui a Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca no Estado do Rio Grande do Sul e cria o Fundo Estadual da Pesca”. Tais artigos referem-se a: aplicação da norma a “toda atividade de pesca exercida no Estado do Rio Grande do Sul, incluindo a faixa marítima da zona costeira”; a proibição de pesca mediante utilização de “toda e qualquer rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, em todo território do Estado do Rio Grande do Sul, incluindo as 12 milhas náuticas da faixa marítima da zona costeira do Estado”. Pela liminar, o ministro suspendeu “a eficácia dos arts. 1º, parágrafo único; e 30, inciso VI, alínea ‘e’, ambos da Lei n. 15.223, de 5 de setembro de 2018, do Estado do Rio Grande do Sul”. Importante ressaltar que a liminar já havia sido indeferida pelo ministro Celso de Mello em dezembro do ano passado, conforme próprio relatório da decisão monocrática de Nunes Marques. Celso de Mello, no indeferimento anterior da liminar, havia pontuado importantes aspectos para o entendimento da questão da pesca e mar territorial: “(…) é vedado ao Estado-membro definir a largura do mar territorial brasileiro, ou estabelecer critérios e métodos a serem utilizados para medir a sua extensão, ou dispor sobre o direito de passagem inocente, no mar territorial brasileiro, em relação a navios e embarcações de qualquer nacionalidade, ou, ainda, explicitar em que consiste, para efeito de travessia marítima, o conteúdo da passagem inocente, pois tais matérias sujeitam-se, quanto à sua regulação normativa, à competência privativa de legislar da União Federal, fundada no poder soberano de que se acha investido o Estado nacional brasileiro.” (…) “Vê-se, portanto, que, mesmo que a Constituição Federal venha a atribuir a titularidade sobre determinados bens à União Federal (tal como efetivamente o fez em relação àqueles constantes do rol inscrito art. 20 do texto constitucional, como o mar territorial), isso não significa que o regime de dominialidade pública existente afaste a possibilidade de os Estados-membros exercerem, amplamente, no âmbito do seu próprio espaço territorial (vale dizer, no espaço de validade e de eficácia de sua própria ordem normativa), todas as competências materiais e as atribuições legislativas que lhes foram outorgadas pelo texto constitucional, especialmente em matéria de proteção ao meio ambiente (CF, art. 23, VI, e art. 24, VI), mesmo que tais atividades estaduais possam recair sobre bens do domínio da União Federal situados em território estadual.” (…) “Observa-se, desse modo, que o Estado do Rio Grande do Sul, ao estabelecer a “Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca” (Lei gaúcha nº 15.223/2018), instituindo a proibição da utilização de rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, parece ter agido em conformidade com a legislação nacional editada pela União Federal (Lei nº 11.959/2009), que, em relação à atividade pesqueira no Brasil, também prevê a vedação absoluta ao emprego de quaisquer instrumentos ou métodos de pesca de caráter predatório (art. 6º, VII, “d”), tal como a pesca de arrasto por tração motorizada, sendo de referir, ainda, que, em observância ao que estabelece o diploma legislativo que fixa as normas de cooperação entre a União Federal e os demais entes da Federação no tema (LC nº 140/2011), compete aos Estados-membros o exercício do controle ambiental da pesca em âmbito estadual (art. 8º, XX).” O presidente da República, Jair Bolsonaro, comemorou no Twitter a decisão de Kassio Nunes Marques, expressando que “a pesca do camarão na costa do Rio Grande do Sul foi restabelecida”. Nesta semana, o governo também celebrou o decreto nº 10.576, que trouxe desregulações para cessão de reservatórios da União para aquicultura. Fica evidente que o Governo Federal vem adotando discurso de maior liberalização da pesca de forma predatória e contrário aos ecossistemas locais, como se verifica no planejamento de criar peixes em 73 hidrelétricas do país, dentre elas Itaipu, que receberia tilápias. Para essa liberação em Itaipu, entretanto, é necessário aval do parlamento paraguaio, uma vez que a usina é gerida de forma binacional.
Mais uma desregulação no setor de aquicultura: decreto Nº 10.576
Mais uma norma com impacto significativo para desregulação do setor de aquicultura e pesca foi publicada e comemorada pelo governo federal nesta semana. O DECRETO Nº 10.576, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2020 dispõe sobre a cessão de uso de espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura. A questão era anteriormente regida pelo DECRETO Nº 4.895, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2003, que trazia os termos “autorização de uso” e não “cessão de uso”. Em relação ao texto anterior, foram trazidas diversas novidades, apontando no sentido da desregulação da atividade. Na norma anterior, a autorização abrangia somente “pessoas físicas ou jurídicas que se enquadrem na categoria de aquicultor”. Com o novo decreto, agora as áreas aquícolas de interesse econômico são destinadas a pessoas físicas ou jurídicas que se enquadrem na categoria de aquicultor e que tenham como objetivo a produção comercial de pescado, dentro de uma classificação das áreas aquícolas : de interesse econômico; de interesse social; e de pesquisa ou extensão. Incluiu-se na definição de “área aquícola” que esta seria destinada “a projetos de aquicultura, individuais ou coletivos, de interesse econômico, social ou científico”. Foram retiradas as definições de aquicultura, faixas ou áreas de preferência, espécies estabelecidas e outorga preventiva de uso de recursos hídricos. Anteriormente, o pedido era analisado pela Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca, pela Autoridade Marítima, pelo Ibama, pela Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) e pela Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão. No novo decreto, a Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) realizará “sozinha” a análise preliminar do projeto técnico. Em seguida, encaminhará a solicitação de uso e os demais documentos necessários à Autoridade Marítima, para análise quanto à segurança ao tráfego aquaviário, e à Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU) do Ministério da Economia, para adoção das medidas necessárias para a entrega da área ao Mapa, que realizará a cessão de uso ao beneficiário. O Ibama, órgão federal responsável pela fiscalização ambiental no país, foi dessa forma excluído do processo de avaliação. Como critérios de classificação dos empreendimentos, anteriormente se tinham como indicadores: empreendimento viável e sustentável ao longo dos anos; incremento da produção pesqueira; criação de novos empregos; e ações sociais direcionadas a ampliação da oferta de alimentação. No novo decreto, há apenas dois critérios: oferta à União do valor mínimo global superior ao informado no parecer final de autorização de uso de espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura; e maior geração de empregos diretos ao informado no parecer final de autorização de uso de espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura. O novo decreto determina que a outorga a ser emitida pela ANA terá vigência de 35 anos e traz ainda a possibilidade de delegar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a gestão dos parques aquícolas. Também confirma que não haverá mais demarcações de parques. A ANA já encaminhou à Secretaria de Pesca uma relação dos 73 reservatórios analisados pela agência, apontando a capacidade máxima de toneladas de peixes que cada um poderá produzir e se estão aptos a receber tanques redes com espécies exóticas, nativas ou ambas, mostra reportagem do Estadão. A matéria destaca também que, para a criação de tilápia no reservatório de Itaipu – ideia bastante propagandeada pelo governo federal –, é necessária ainda a aprovação do parlamento paraguaio, uma vez que a gestão da hidrelétrica é binacional e é proibido por lei a aquicultura de espécies exóticas no local. Em 13 de agosto de 2020, a publicação da IN n. 19 já havia flexibilizado o processo para a cessão onerosa de áreas de domínio da União para fins de aquicultura, dispensando editais de licitação. Como alertado no nosso boletim daquele mês, ficou aparente a intenção de viabilizar a apropriação privada de corpos d’água. Evidência que se observou quando não é dada prioridade às comunidades tradicionais que já fazem uso das áreas a serem requeridas. Sobre isso, o Ministério Público Federal expediu recomendação para que áreas tradicionalmente utilizadas por pescadores artesanais, bem como de relevante interesse ambiental no arquipélago de Ilhabela (SP) não sejam cedidas para criação comercial de peixes e mariscos. Segundo o MPF, o processo de “licitações” iniciado com a publicação da IN foi feito sem nenhuma consulta ou diálogo com as comunidades caiçaras sobre os impactos que tal cessão pode gerar ao seu modo de vida tradicional, nem com a Fundação Florestal – órgão ambiental responsável pela região, no caso de São Paulo. É possível que essa norma leve a casos de judicialização. Vale alertar ainda que a introdução de espécies exóticas é considerada um dos maiores vetores de perda de biodiversidade global, regional e local. E o Brasil é considerado o país mais diverso do mundo, justamente pela enorme quantidade de espécies de água doce, fato relacionado à grande diversidade e tamanho de suas bacias hidrográficas. Abrigamos mais de 3.000 espécies de água doce, sendo uma parcela considerável endêmica, ou seja, que só ocorrem aqui. Com a possibilidade de cultivo indiscriminado de espécies exóticas no país, sem o acompanhamento dos órgãos ambientais, em quantos anos perderemos essa colocação mundial?