Tem mutirão que dê jeito?

(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)

E lá se foi a COP30, pessoal. Depois da intensa cobertura que fizemos em cada dia da Conferência (esperamos que vocês tenham acompanhado na página, no Instagram e no canal!), era natural que uma “ressaca” se instalasse. Dito e feito. Mas não por muito tempo… 

Em duas semanas, Belém entregou muito a quem soube aproveitar o que ela oferece. Sob o calor característico de uma cidade próxima à Linha do Equador, milhares de visitantes puderam viver a hospitalidade dos belenenses, sempre traduzida na comida, na música e no acolhimento; impressionar-se com a chuva diária e o quanto a natureza influencia diretamente o modo de vida; ver gente, e gente participando pra valer da COP, com sede de derrubar qualquer invisibilidade. Já quem esperava clima ameno, trânsito morto, ou que as comidas se parecessem com salsichas e chucrutes, não se deu bem. Pena. Felizmente, exceções a uma regra que se provou forte: Belém encanta mesmo.

Na COP, nasceu o Pacote Político de Belém em documentos consensuados sobre 16 itens entre 194 países, dentre os quais, o principal: a Decisão Mutirão

Nela, a demonstração de que tivemos, sim, a “COP da Adaptação” até aqui: foram adotados 59 indicadores para o Objetivo Global de Adaptação (GGA) que devem orientar o progresso da implementação mundo afora e um chamado a triplicar o financiamento para adaptação até 2035, do Norte para o Sul Global. Na linguagem da diplomacia, são avanços que merecem ser comemorados, ainda que não tenham ido ao ponto a que poderiam e não da forma como deveriam. No mundo real, são pontos de uma estrutura a ser desenhada, com linhas tortas que necessitam de correção e mesmo traços sem nitidez que precisam ser esclarecidos. 

Como vínhamos dizendo ao longo do ano: COP não é um evento, mas um processo. E o processo em Belém trouxe ganhos políticos. Ganhos que podem até não aparecer no texto final da Conferência, mas que abrem caminho para o trabalho de Presidência a ser executado por André Corrêa do Lago, até às vésperas da COP31, em Antalya, na Turquia. Os dois mapas do caminho (roadmaps) que ele afirmou que vai se esforçar para criar – um para a transição para longe dos combustíveis fósseis e outro para o fim do desmatamento – constituem o foco da Presidência brasileira daqui pra frente, com a vantagem de que já não largam do zero. Num dos pontos altos da Conferência, vimos uma simples coletiva de imprensa chamada pela Dinamarca se transformar em um verdadeiro movimento, de mais de 80 países, em endosso à proposta vocalizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em consonância com a ministra Marina Silva, de um roadmap para o fim dos fósseis. Esse movimento é um ativo que precisa ser cuidado e ampliado, no trabalho que Corrêa do Lago e o governo brasileiro acabam de começar. Assim como o Acelerador Global de Implementação (GIA), nova ferramenta lançada para catalisar as reações em direção à descarbonização nos países. Ah, e por falar em países, agora somam 122 os que têm metas nacionais (NDCs) atualizadas para o período 2030-2035, dentro do Acordo de Paris. Há poucos meses, não eram sequer 60. 

No entanto, em meio a uma conjuntura geopolítica delicada, toda COP tem um teto limitado de conquistas. E o governo brasileiro assente isso, como na fala da ministra Marina Silva, que reconheceu que o progresso da Conferência foi “modesto”. Nada, no entanto, que retire a relevância das COPs para o processo diplomático, que não é só pelo clima, mas pela sustentação da própria economia global. 

Mesmo com naturais embates, nenhuma delegação se retirou da Conferência. O multilateralismo está vivo e a COP30 em Belém provou isso. Contudo, o desfecho da Conferência sinaliza que uma reinvenção de novos espaços e de novas formas de tratar assuntos complexos de interesse global se impõe. Colômbia e Holanda decidiram iniciar um fórum específico sobre o fim dos fósseis, que dá seu pontapé inicial em abril de 2026, cujos debates e andamentos podem ser aproveitados para acelerar reações que o sistema ONU, por si, não tem conseguido oferecer. 

A COP30 também serviu como um “empurrão” em assuntos no plano interno. O governo brasileiro demarcou mais de 2,4 milhões de hectares de Terras Indígenas (TI) na Amazônia, nos estados de Mato Grosso, Amazonas e Pará, além de ter criado mais de uma dezena de Reservas Indígenas. Demandas de décadas, respondidas justamente no momento em que as reivindicações dos povos originários ganharam espaço e holofote mundial em Belém. 

Por outro lado, nem tudo é mobilização “por causa” da COP, mas “apesar” dela. A realidade se impôs e ficou por conta do Congresso Nacional provar verdadeiro esse outro aspecto, batendo pé para que a votação sobre os vetos presidenciais à Lei Geral do Licenciamento Ambiental se desse logo na semana seguinte à histórica Conferência no Brasil. É preciso lembrar que em Brasília, o assunto “licenciamento” vinha em banho-maria nos últimos meses porque, para além da atmosfera de COP na qual o país imergia entre setembro e outubro, o governo havia apresentado uma robusta Medida Provisória que vetava dispositivos inconstitucionais na nova Lei. Nesta semana, no entanto, Davi Alcolumbre, presidente do Senado, garantiu a sessão que derrubou quase todos os vetos que haviam sido apresentados pelo Executivo: 56, de 63. 

A MP já teria seu prazo expirado a partir de 6 de dezembro, mas os parlamentares fizeram questão de não deixá-la morrer por inanição. Hugo Motta, presidente da Câmara, e principalmente Alcolumbre fizeram questão de derrubar os vetos, ainda que advertidos da inconstitucionalidade de uma série de dispositivos no texto. Não importa. Se tem uma coisa que a atual legislatura federal sabe fazer é “pagar pra ver”, seja como motivo para esgarçar a corda contra qualquer chance de harmonia entre os Poderes, seja por método para se manter voraz na defesa de interesses particulares, alheios a qualquer compromisso de um mandato orientado pelo zelo à coisa pública. 

Das muitas preocupações que o tema licenciamento levanta, a que mais grita nesta semana é a ausência de reação do setor agropecuário que trabalha corretamente. Isso porque congressistas ligados ao agro que vive pelo ilegal estão entre os principais artífices das derrubadas dos vetos. Não seria espantoso se esse segmento também estivesse por detrás da recusa do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e da Casa Civil em concluir o Plano Clima, um dos compromissos de Estado que nem “o espírito de COP30” conseguiu fazer o Brasil entregar. Aliás, esse foi um impasse que testemunhamos in loco, em Belém.

Conforme havíamos dito nos 11 Alertas da Política por Inteiro quando o desmoronamento do Licenciamento Ambiental no Brasil ainda era só Projeto de Lei, o enfraquecimento da institucionalidade nacional também traz um prejuízo reputacional às exportações brasileiras. Paradoxalmente, dessa reputação depende o próprio setor agropecuário. Quantas leis antidesmatamento de blocos econômicos – a exemplo da EUDR, aprovada, embora com vigor postergado, pela União Europeia – serão necessárias até que o setor agropecuário perceba que a longevidade de seus negócios depende cada vez mais da integridade ambiental e social em seus processos produtivos e cadeias de valor? 

Sempre vale reforçar: já faz tempo que não se trata de um debate ambiental (o que, por si só, já seria crucial). A decisão de enfraquecer o Licenciamento Ambiental – em vez de racionalizá-lo e modernizá-lo a valer – é uma afronta à ordem econômica brasileira. O artigo 170 da Constituição determina que a “defesa do meio ambiente” seja um dos princípios da economia nacional não por acaso, mas justamente porque o Poder Constituinte Originário sabia que uma economia baseada nos serviços ecossistêmicos, como é a nossa, não haveria de ir longe sem fortes garantias ambientais. Aliás, o texto é explícito e está situado dentro do capítulo de Economia da Constituição justamente para que não haja qualquer chance de divergências interpretativas. Uma revisão em 180º no modo de licenciar – ainda que a pretexto legítimo, embora de fachada, como a agilização dos procedimentos – tende a reduzir a capacidade do Estado em resguardar a própria saúde pública e, com ela, a sustentabilidade dos negócios no país. É o popular “tiro no pé”. 

Agora, o descompasso forçado pelo Legislativo será objeto de judicialização no Supremo Tribunal Federal (STF). Já não é a primeira vez desde 2023, como bem sabem, por exemplo, os povos indígenas

Boa leitura!

TÁ LÁ NO GRÁFICO

O financiamento climático internacional sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) é organizado em cinco fundos que cumprem funções distintas na resposta global à crise: Fundo Adaptação (AF), Fundo para Países Menos Desenvolvidos (LDCF), Fundo Especial para Mudança do Clima (SCCF), Fundo de Perdas e Danos (FRLD) e Fundo Verde para o Clima (GCF). Além desses instrumentos, na COP30 foi assinada, sob a liderança do Brasil, a Declaração de Lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF). Confira no Tá Lá no Gráfico desta semana como eles operam e quais foram os montantes anunciados pelos países para esses fundos durante a COP30.

FRASE DA SEMANA

“É um profundo fracasso da coragem política.”

Eva Zabey, chefe da coalizão Business for Nature, que reúne mais de 100 organizações que buscam conectar conservação ambiental a negócios, em nota sobre a decisão do Parlamento Europeu em postergar – de novo – a entrada em vigor do Regulamento Europeu Antidesmatamento, o EUDR. Foto: LinkedIn/Reprodução.

ABC DO CLIMA

Mapa do Caminho: também conhecido como roadmap (em inglês), essa expressão representa um roteiro a ser seguido, com uma visão estratégica e sequencial, para se alcançar uma meta específica dentro de um prazo determinado. Não há um conceito fechado de Mapa do Caminho na terminologia da Convenção do Clima (UNFCCC), mas é um conceito que tem sido cada vez mais frequente no regime climático. O primeiro grande Mapa do Caminho na estrutura da UNFCCC foi o Bali Roadmap, resultado da COP13, na Indonésia, em 2007. Ele continha o Plano de Ação de Bali, de dois anos, com o objetivo de traçar um caminho para a estruturação de um novo processo multilateral de negociações para lidar com as mudanças climáticas, que deveria substituir o Protocolo de Quioto dali a cinco anos. Outro Mapa do Caminho conhecido, já no contexto do Acordo de Paris, é o Roadmap to US$ 100 Bilhões. Na histórica decisão em que se adotou o Acordo, na COP21, em 2015, os países desenvolvidos se comprometeram a apresentar o Mapa do Caminho “concreto para alcançar a meta de prover conjuntamente US$ 100 bilhões anuais até 2020 para mitigação e adaptação”. O roteiro foi lançado no ano seguinte. Essa meta valia até 2025, e, por isso, foi revista na COP do ano passado, no Novo Objetivo Quantificado Coletivo de Financiamento Climático (NCQG), que estabeleceu US$ 300 bilhões como o mínimo que os países desenvolvidos deveriam fornecer às Partes em desenvolvimento. Em Baku, surge um novo roadmap: o Mapa do Caminho de Baku a Belém (B2B) para US$ 1,3 Trilhão. Esse montante diz respeito ao total de financiamento climático necessário para suprir as necessidades atuais dos países em desenvolvimento, incluindo os US$ 300 bilhões do NCQG e outras fontes (públicas, privadas, domésticas e internacionais).

Na COP30, no Brasil, mais dois Mapas do Caminho entraram na discussão: um para o abandono dos combustíveis fósseis (transition away from fossil fuels) e outro para o fim do desmatamento. Esses roteiros ainda não existem, mas serão discutidos ao longo da Presidência brasileira da COP30, que se encerra na próxima COP.

MONITOR DE ATOS PÚBLICOS

Nosso Monitor de Atos Públicos captou 18 atos relevantes para a política climática nesta semana, com a retomada do protagonismo das normas ligadas ao tema Terras e Territórios, que foi o mais frequente, com 8 normas. A semana sinaliza atos preocupantes em Energia e Finanças, com a transformação da MP do Setor Elétrico em Lei e a oportunidade desperdiçada pelo Brasil em colocar Adaptação como critério para incentivos tributários em prol do esporte nacional. A classe mais captada foi Regulação, com 12 atos.

Política de Outorgas em ferrovias considera Adaptação

Nesta semana, uma Portaria do Ministério dos Transportes (MT) lançou a Política Nacional de Outorgas Ferroviárias. A norma traz determinações importantes sobre Adaptação: primeiro, tanto a modelagem quanto os contratos de outorga para exploração de ferrovias deverão prever a “adoção de incentivos ao desenvolvimento de uma infraestrutura resiliente, ambiental e economicamente sustentável”. Em seguida, é um dos objetivos da política “adotar medidas de adaptação às mudanças climáticas, com vistas a aumentar a resiliência da infraestrutura ferroviária”.

No Esporte, perdemos um gol (mas não o jogo)

Aprovada nesta semana a Lei Complementar nº. 222/2025, que regula a concessão de incentivos fiscais para o esporte brasileiro. Ela revoga a Lei de Incentivo ao Esporte, de 2006. Cientes de que a mudança do clima tem tornado cada vez mais difícil os esportes no Brasil darem jogo, nossos congressistas poderiam ter pautado, entre outros instrumentos, investimentos em adaptação climática como parte dos critérios que irão nortear a concessão de incentivos. 

A lei centra em conceder incentivos a pessoas (físicas ou jurídicas) que patrocinem projetos esportivos e paraesportivos (o que é louvável, claro), mas poderia ter olhado com carinho para atrair investimentos à melhoria das condições que tornam as práticas esportiva e paradesportiva possíveis. Felizmente, pela Lei, os estados, municípios e o Distrito Federal estão liberados para determinar critérios próprios e, portanto, ainda podem inserir aspectos de adaptação climática no pacote para calibrar os benefícios tributários. O uso da chamada extrafiscalidade – concessão de benefícios ou imposição de carga tributária adicional com a finalidade de gerar resultados positivos em outros aspectos da vida em sociedade, que não meramente o econômico – é mais do que bem-vindo. A Adaptação Climática precisa estar na lógica desta e de outras normas com finalidade semelhante. 

Sobre a pasta, a curadoria de atos da Política por Inteiro relembra que, no início do ano, o próprio Ministério do Esporte estava lançando seleção para a construção de espaços esportivos comunitários sem qualquer previsão de adaptação climática atrelada às orientações construtivas. 

O Instituto Talanoa acredita no poder da extrafiscalidade para moldar comportamentos e investimentos pró-clima no país. Ministérios como o do Esporte e o da Educação – alheios ou, no máximo, tímidos para a questão climática, até aqui – também precisam acreditar.

Biodiversidade 2025-2030

Nesta semana foi publicada a Estratégia e o Plano de Ação Nacional para a Biodiversidade (2025-2030), alinhada aos instrumentos existentes e às metas recomendadas pela CONABIO (Resolução nº 9/2024).

O plano reúne metas para 2030, objetivos para 2050 e uma tabela de compromissos distribuídos entre os órgãos responsáveis. Entre as metas de 2030, destaca-se zerar o desmatamento e a conversão da vegetação nativa para conter a perda de biodiversidade e os impactos das mudanças climáticas. Para 2050, prevê-se que a transferência de tecnologia e a cooperação técnica garantam o financiamento da biodiversidade no país.

Com metas ambiciosas e uma agenda transversal, será essencial fortalecer a articulação política e acelerar a implementação. 2030 chega rápido.

Novas áreas para habitação: e a Adaptação?

É preciso ficar de olho: a Superintendência de Patrimônio da União (SPU) tem multiplicado os atos de “declaração de interesse público” em terrenos de seu domínio para a finalidade de criação de conjuntos habitacionais (a exemplo desse no RJ e desse no AM, entre tantos). É essencial que organizações da sociedade civil e o segmento acadêmico cruzem a geografia dessas áreas com “o passado e o futuro” ligados à vulnerabilidade a eventos climáticos (que nem precisam ser extremos para causar prejuízos). O ideal é avaliar se habitações nas áreas concedidas terão risco climático reduzido. Como risco climático é uma variável atrelada a três elementos básicos – ameaça, exposição e vulnerabilidade – políticas públicas orientadas por boas práticas em adaptação climática devem ser capazes de manejar (com fins de reduzir) os dois últimos desses três fatores. Cruzar os dados geográficos com dados do passado e cenários de eventos extremos, além de atrelar a essas áreas políticas sociais que tragam maior repertório a populações já vulneráveis, são medidas inescapáveis para evitar danos de toda ordem.

De quantos “90 dias” precisarão os Avá-Guaraní, no Paraná?

O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) determinou, pela terceira vez só em 2025, o emprego da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) em apoio à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) na região da Terra Indígena Tekohá Guasu-Guavira, no estado do Paraná. Assim como nas ocorrências anteriores, em fevereiro e em maio, a intervenção se dará por 90 dias. Como tem frequentemente alertado a curadoria de atos da Política por Inteiro, os destacamentos da FNSP para conter a escalada de conflitos em territórios com população indígena estão longe de ser ação “episódica e planejada”, como costumeiramente expresso nesse tipo de ato. Os indígenas do povo Avá-Guaraní reivindicam territórios na região há décadas, expropriados em função das consequências da construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, assim como de invasões. A própria Itaipu Binacional – que financiou obras em Belém, no contexto da COP30, e recentemente teve oficializada uma linha do Programa Minha Casa, Minha Vida para aportar capital para a construção de habitações Brasil afora – admite publicamente um pedido de desculpas aos Avá-Guaraní. Enquanto isso, a tensão persiste. Quantos “90 dias” ainda veremos até que a situação seja minimamente contornada?

BRASIL

A outrora “MP do Setor Elétrico” vira Lei

Pois é, aconteceu. O Governo Federal sancionou a Medida Provisória 1.304/2025 com mais de dez vetos considerados centrais pelo mercado. As supressões atingiram temas sensíveis como mecanismos de compensação para geradores renováveis, mudanças na metodologia de cálculo de royalties do petróleo e regras que atribuíam responsabilidade individual a agentes públicos por falhas relacionadas à segurança do sistema elétrico.

O veto mais controverso foi o do mecanismo que previa indenização integral para usinas eólicas e solares em casos de restrições operativas por incapacidade da rede de transmissão. Para o governo, essa medida poderia gerar um impacto bilionário na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), onerando consumidores. Entretanto, ações urgentes sobre como resolver o curtailment para atingir a meta de emissões líquidas neutras até 2050 seguem ignoradas. 

Ainda, em outra contramão das exigências climáticas, a lei autoriza a contratação de usinas a carvão até 2040, garantindo reserva de capacidade e consumo mínimo do combustível, além de prorrogar por mais 25 anos as concessões de empreendimentos a carvão. O pacote pode mobilizar cerca de R$ 28 bilhões até 2040. O setor produtivo no Rio Grande do Sul, detentor de 89% das reservas nacionais, celebra a medida como janela de oportunidades e promotor de cadeias de valor associadas ao carvão. Mas, sem dizer como farão uma transição energética justa que livre a região da dependência desse combustível obsoleto. 

O prolongamento da matriz carbonífera desafia a coerência da política climática brasileira. A manutenção do carvão até 2040 contrasta com a expectativa global de redução acelerada dos combustíveis fósseis e com o próprio discurso do presidente Lula na COP, ao defender um roteiro para superar o uso de fósseis de forma justa e ordenada. Ao reforçar infraestrutura intensiva em carbono, a lei cria risco de ativos obsoletos, sinaliza ambiguidade sobre a ambição climática do país e dificulta a construção de uma trajetória compatível com 1,5°C.

Vetos foram discriminados aqui.

“A Petrobras de que precisamos”

Quem já assistiu ao vídeo de Bela Gil sobre o “toque amigo” à Petrobras pode reclamar de qualquer coisa, menos de falta de clareza. O vídeo é parte de uma campanha do Observatório do Clima (OC) e do ClimaInfo, a partir de um estudo do OC, com participação do Instituto Talanoa, para alertar à sociedade – e à própria Petrobras – a urgência de uma transição energética verdadeira, com menos marketing e mais ação. Expõe com bom humor e analogias impecáveis o quanto a maior estatal brasileira ainda tem chance de se reposicionar na História, ampliar sua força e empurrar o país para uma transformação ecológica genuína. 

Além de explicar a situação em que o mundo se encontra e demonstrar os benefícios de uma reconfiguração da Petrobrás em linha com a emergência climática do nosso tempo, a peça também sugere caminhos práticos, como o aumento do percentual de investimentos da empresa em fontes renováveis de energia e o uso de áreas já desmatadas para o país avançar na produção de biocombustíveis. 

A iniciativa “A Petrobras de que precisamos” é propositiva e tem um pacote de recomendações que vale a pena acompanhar.

MUNDO

Tratado do Alto Mar é ratificado pelo Brasil 

O Brasil formalizou um passo decisivo na governança global dos oceanos ao ratificar, durante a COP-30, o “Tratado do Alto-Mar” (BBNJ, na sigla em inglês). Com as 60 ratificações necessárias alcançadas em setembro, o tratado entra em vigor em 2026 e o Brasil se junta ao grupo de países que reconhecem a centralidade dos oceanos para a permanência da vida humana no planeta. O alto-mar, que começa a 200 milhas da costa e representa mais de 60% do oceano, é patrimônio comum da humanidade, mas historicamente carecia de regras robustas para proteger sua biodiversidade frente a ameaças como mineração em mar profundo e potenciais projetos petrolíferos.

O BBNJ cria um regime jurídico vinculante, ou seja, com força de lei e possibilidade de sanções, estruturado em quatro pilares: 1.) transferência de tecnologias marinhas; 2.) repartição de benefícios de recursos genéticos; 3.) manejo baseado em áreas; e 4.) avaliação de impacto ambiental. O tratado também abre margem para criação de Áreas Marinhas Protegidas em alto-mar, fundamentais para conservar ecossistemas sensíveis e garantir a resiliência oceânica.

Com a COP trazendo os oceanos para o centro da agenda climática, o BBNJ tende a fortalecer salvaguardas ambientais e impor barreiras adicionais a atividades de alto impacto, inclusive a expansão da exploração de petróleo em áreas internacionais. Uma inovação jurídica internacional que pode servir de modelo para leis domésticas, que livrem os mares nacionais, sob jurisdição de cada País, da destruição causada pela exploração petroleira.

União Europeia decide postergar lei antidesmatamento 

O Parlamento Europeu decidiu adiar novamente a entrada em vigor de sua principal lei contra o desmatamento importado, após pressão coordenada da direita e da extrema direita. A regulamentação, que proibiria a entrada no mercado europeu de produtos associados a desmatamento após 2020, já havia sido postergada de 2024 para o fim de 2025. Agora, a implementação foi empurrada para o fim de 2026, com possibilidade de novo adiamento já no ano que vem. Organizações ambientais e empresas de alta integridade reagiram com indignação, acusando a União Europeia de minar sua própria credibilidade climática justamente em um momento crítico dada a ausência de planos concretos para reverter o desmatamento na COP30. 

Para o Brasil, o recuo europeu tem implicações particularmente graves. O país vinha tentando reposicionar sua imagem internacional pós-Bolsonaro e avançar na negociação do acordo Mercosul–União Europeia, o qual contempla salvaguardas ambientais robustas no texto. No entanto, o enfraquecimento da lei europeia ocorre no momento em que o Brasil também fragiliza seus próprios instrumentos de proteção ambiental, incluindo a recente flexibilização do licenciamento ambiental e a retirada da exigência de manifestação técnica para supressão de vegetação da Mata Atlântica. A coincidência desses dois movimentos cria um cenário de retrocesso bilateral. Enquanto a UE reduz a pressão regulatória sobre cadeias de desmatamento, o Brasil envia sinais contraditórios ao desmontar salvaguardas domésticas, o que pode agravar a desconfiança europeia nas negociações e enfraquecer a posição brasileira em temas comerciais e climáticos.

Mar do Norte sem petróleo: o futuro é agora 

O governo britânico apresentou o North Sea Future Plan, que veta novas licenças para exploração de petróleo e gás e estabelece mecanismos rigorosos para garantir que qualquer produção adicional se limite exclusivamente a campos já existentes ou a áreas adjacentes conectadas a essa infraestrutura. O plano é um marco decisivo na construção de uma transição energética justa e economicamente viável, num momento em que o esgotamento natural dos reservatórios do Mar do Norte já resultou na perda de mais de 70 mil empregos entre 2016 e 2023. Além de um claro sinal da descarbonização no Reino Unido, a reforça a consolidação de uma nova onda virtuosa de políticas climáticas, capaz de redefinir o centro de gravidade da transição energética global. A declaração da Colômbia, proibindo novos projetos de petróleo e mineração em sua Amazônia, somada à pressão coordenada de 84 países na COP30 por um Mapa do Caminho global para abandonar os combustíveis fósseis, estabelece um marco político incontornável. Leia nossa análise no Blog da Política por Inteiro.

China, maior emissor do mundo, aprova seu 15º Plano Quinquenal

As recomendações para o 15º Plano Quinquenal (2026-2030) deixam explícito que a China entende as mudanças climáticas não apenas como uma variável ambiental, mas como um eixo estruturante da disputa por poder econômico, tecnológico e geopolítico no século XXI. O maior emissor do mundo posiciona seu 15º Plano como uma plataforma para disputar a liderança em setores que estruturam o futuro da indústria global: semicondutores verdes, armazenamento de energia, hidrogênio, veículos elétricos, redes inteligentes, manufatura avançada, biotecnologia climática, materiais de baixo carbono e tecnologias digitais críticas. Confira nossa análise do planejamento da China para a segunda metade desta década no Blog da Política por Inteiro.

DESASTRES

Nota de esclarecimento: Nosso Monitor de Desastres tem apresentado instabilidades nas últimas semanas e teve de ser submetido a reparos. Retornaremos com ele o mais rápido que pudermos.

TALANOA POR AÍ

Nesta semana pós COP30, o Talanoa por Aí se transforma em Talanoa por Belém! Em quase 20 dias – somando a Cúpula de Líderes até o fim oficial da COP30 – a delegação da Talanoa esteve concentrada nas decisões políticas mais relevantes do mundo climático. Doze de nossos colaboradores estiveram em Belém acompanhando presencialmente as negociações, promovendo debates, analisando decisões e compartilhando inteligência por meio de nossos canais. Tudo isso em sintonia com nosso time de operações e mais quatro profissionais de comunicação que prestaram suporte remoto, sempre conectados às informações em tempo real. 

No canal de WhatsApp, diariamente nossos seguidores eram acordados com um áudio que trazia as expectativas do dia e recebiam informações instantâneas sobre as declarações mais relevantes. Aqui no nosso blog, o resumo do dia era compartilhado pela manhã e atualizado no fim do dia, com um balanço das últimas 24h. Além disso, nossas redes sociais digitais repercutiram fotos, vídeos e cards com o placar diário das negociações, para facilitar a compreensão de temas densos de forma visual e objetiva. Atendemos à imprensa do Brasil e do mundo, participando de coletivas de imprensa, programas ao vivo e reportagens gravadas, tanto para TV, como rádio, impresso e veículos online. 

Nos corredores da COP, líderes mundiais e brasileiros vestiram a camisa da nossa campanha em prol da adaptação climática; enquanto jornalistas nacionais e internacionais receberam em mãos o Guia para Cobertura Jornalística. Confira algumas fotos do time da Talanoa na COP30!

TALANOA NA MÍDIA

The Economist Natalie Unterstell considera que, a COP30 teve um avanço real em termos de adaptação, mas ainda está aquém do que é realmente necessário.
The Guardian Natalie analisa o bem-vindo compromisso para triplicar o financiamento da adaptação, mas destaca que jogá-lo para 2035, em vez de 2030, não traduz urgência necessária.
Valor Econômico Natalie e Daniel Porcel, especialista da Talanoa, falam sobre adaptação e GGA em avaliação sobre a COP30.
O Globo Caio Victor Vieira, especialista da Talanoa, comenta sobre o resultado da COP30 para transição energética.
Cidades e Soluções Natalie Unterstell participa do programa especial, direto de Belém, com um balanço da COP30.
Jornal Nacional Natalie fala do descompasso entre a velocidade da crise climática e o ritmo do processo multilateral – ressalvando que, felizmente, ele não colapsou.
Agência Brasil Sobre a falta de ambição climática nos textos finais da COP30 foi a fala da Natalie Unterstell ao final da Conferência.
O Liberal Vice-presidente da Talanoa, Liuca Yonaha, fez um balanço da segunda semana da COP30 e falou de avanços e incertezas.
ECOA – UOL Especialista sênior da Talanoa Benjamim Abraham aponta avanços nas iniciativas de financiamento para transição energética na COP30.
InfoAmazônia “A adoção dos indicadores do GGA é um progresso real”, disse Natalie em reportagem sobre resultados da COP30.

Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO

Equipe Editorial (Liuca Yonaha, Marta Salomon, Melissa Aragão, Ester Athanásio, Marco Vergotti, Renato Tanigawa, Taciana Stec, Wendell Andrade, Daniel Porcel, Caio Victor Vieira, Beatriz Calmon, Rayandra Araújo e Daniela Swiatek).

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