COP30 – DIA 1, SEMANA 2: Decisão do Mutirão é uma Decisão de Capa?
- COP30
- 17 de novembro de 2025
(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
A Presidência da COP30 divulgou, no domingo à noite, um sumário que rapidamente ganhou atenção entre delegações e observadores. Repercutimos hoje o que esse documento significa — e, sobretudo, o que ele não é. Diferente do que muitos imaginaram, o texto não se trata de uma Cover Decision (chamamos de “Decisão de Capa”), que costuma trazer uma mensagem política ampla da Presidência sobre os diversos temas em negociação. Uma Decisão de Capa exigiria uma visão consolidada de todos os assuntos em pauta — por exemplo, de oceanos a montanhas — algo considerado abrangente demais neste momento.
Pelo que observamos nas conversas de bastidores e nas coletivas acompanhadas hoje, a Presidência da COP está concentrando esforços em um pacote de decisões focado nos quatro temas acordados previamente pelos países:
- medidas unilaterais de comércio,
- NDCs,
- Relatórios de Transparência (BTR),
- financiamento relacionado ao Artigo 9.1.
É a partir desses eixos que deve surgir a proposta central a ser apresentada aos negociadores.
Nos parece que a Presidência está atuando em duas trilhas paralelas:
- A chamada “Decisão do Mutirão”, que reuniria todas as consultas conduzidas de forma conjunta. Essa consolidação deve aparecer no documento prometido para amanhã.
- E 14 temas que migraram do nível técnico para o nível ministerial, todos com mandato de negociação — entre eles, o Objetivo Global de Adaptação (GGA), o Programa de Trabalho de Transição Justa e o Balanço Global (GST). Cada um desses temas precisa gerar algum tipo de decisão, seja ela procedimental ou de conteúdo.
Esse é, até agora, o desenho mais claro do processo que visualizamos. Mas, como sempre lembramos, o único elemento fixo em uma Conferência do Clima é que tudo pode mudar: cenários são fluidos, pressões variam e arranjos políticos podem ser reconfigurados a qualquer momento.
Seguimos acompanhando de perto os movimentos e trazendo análises atualizadas ao longo da semana.
Mobilização indígena e novos compromissos na COP30
Belém foi palco, nesta segunda-feira, de uma grande mobilização que reuniu a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e diversas lideranças tradicionais na “Marcha Global: A Resposta Somos Nós”.
Ao longo da tarde, ocorreu uma cerimônia de alto nível para formalizar os compromissos apresentados por chefes de Estado durante a Cúpula de Líderes da COP30. Entre os anúncios feitos para assegurar os direitos territoriais de povos indígenas e comunidades tradicionais, Sônia Guajajara anunciou 10 portarias de demarcação de Terras Indígenas. Segundo a ministra, esta é uma mostra de que o governo vem à COP com espírito de implementação. Foi dito que 10 portarias demarcatórias + 4 decretos de homologação devem sair amanhã no Diário Oficial.
Longe dos fósseis
Nesta segunda, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que apresentou a NDC brasileira em Baku na COP29 (o Brasil foi o segundo a entregar, depois dos Emirados Árabes Unidos), destacou a que agora são 118 NDCs submetidas, abrangendo 78% das emissões globais.
O Secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty, embaixador Mauricio Lyrio, explicou que o Roadmap (Mapa do Caminho) para Longe dos Combustíveis Fósseis não está no trilho de negociações formais. A ministra Marina Silva disse que o tema tem ganhado apoio, após as declarações do presidente Lula sobre o Mapa do Caminho, e há um esforço para sair de Belém com um início desse roteiro. É provável que ele apareça na “Decisão do Mutirão”, que não é uma “Cover Decision”, dentro das formalidades diplomáticas.
Proteção à todas as formas de vida
Logo pela manhã desta segunda-feira, em coletiva de imprensa, cientistas reunidos no Pavilhão de Ciência Planetária reforçaram que a COP30 precisa se comprometer com proteger todas as formas de vida. O renomado cientista Carlos Nobre destacou a iminência do ponto de não retorno das barreiras de corais e a necessidade de que os países se unam para entregar o Mapa do Caminho para o fim dos combustíveis fósseis e assim manter o compromisso da COP30 com o limite de aquecimento do Terra em 1,5ºC. Colocar a natureza no centro da discussão da ação climática é um dos principais focos da Conferência do Clima nesta semana.
Nesta segunda também ocorreu o Diálogo de Alto Nível com Contribuintes do Fundo de Adaptação, coorganizado pela Presidência da COP30 brasileira. A presidente da Talanoa, Natalie Unterstell, participou da conversa.
O encontro teve como objetivo oferecer uma plataforma para que governos demonstrem apoio e anunciem novos compromissos para ajudar o Fundo a atingir sua meta de mobilização de recursos de US$ 300 milhões até 2025. Essas novas contribuições financiarão diretamente o portfólio ativo de propostas de projetos do Fundo, avaliadas em mais de US$ 1 bilhão, permitindo que países vulneráveis implementem ações urgentes de adaptação em conformidade com seus PNDs e NDCs.
Balanço Ético Global
No evento que discutiu o Balanço Ético Global (BEG), Maria Fernanda Lemos, especialista do IPCC, ressaltou que a dificuldade de acessar conhecimento passa por acessar o conhecimento específico local e que o conhecimento científico e não científico estão dispersos. “Processos participativos ampliam a possibilidade de justiça climática e também reduz a chance de maladaptação”, disse. Daniel Porcel, Rayandra Araújo e Taciana Stec, especialistas em Políticas Climáticas da Talanoa, participaram das discussões. Daniel enfatizou que necessitamos de adaptação transformacional e não só incremental e Taciana disse que adaptação é uma agenda de enfrentamento das mudanças climáticas e das desigualdades, não de desistência.
Maricelma Fialho, indígena do povo Terena, fez uma fala inspiradora: “Adaptação é cuidar da Terra antes dela adoecer, cuidar da água antes dela secar, da Floresta antes de virar fumaça. É isso que as comunidades indígenas fazem na prática. Adaptar com justiça é permitir que continuemos a fazer isso, com financiamento direto para povos indígenas.”
Adaptação como prioridade
A Força-Tarefa “Adaptação como Prioridade” segue trabalhando em conjunto nessa Conferência. As mais de 40 organizações da América Latina que compõem o grupo se reuniram na Zona Azul, no Dia 7 da COP30, para tratar da segunda semana de negociações. O grupo é coordenado pela Talanoa e busca aprovação dos indicadores do Objetivo Global de Adaptação (GGA), além de pedir que o financiamento seja triplicado.
Tacacá do dia
No coração do Ver-o-Peso, mercado tradicional de Belém, as erveiras mantêm viva a tradição amazônica dos banhos, essências e perfumes que carregam intenções — proteção, abertura de caminhos e prosperidade. Para a COP30, foi criado o “Banho da COP”, combinando plantas como abre-caminho e folha-da-fortuna para “atrair boas energias” e fortalecer a missão de salvar o meio ambiente. É a Amazônia que se traduz em cheiro, benzimento e mística — lembrando que a cura da Terra também passa por sabedorias que resistem há séculos.
Frase
Hindou O. Ibrahim, Líder Climática Indígena do Chade, em reunião ministerial sobre o TFFF, mecanismo segundo o qual Povos Indígenas e Comunidades Locais terão acesso direto a, pelo menos, 20% do rendimento direcionado à conservação florestal.
Céu iluminado em Belém
Na noite de quinta-feira, o céu de Belém foi iluminado por centenas de porangas, lamparina tradicional utilizada por seringueiros na floresta amazônica, feita a partir de latas de óleo e funcionando com querosene. Chamado de “Porangaço dos Povos da Floresta”, o evento paralelo à COP30 reuniu lideranças extrativistas e apoiadores.
Eventos Talanoa na COP
| DATA | EVENTO | LOCAL | HORÁRIO | PARCEIROS ORGANIZADORES |
| 20/11/2025 | Landing the GGA on territories: from global goals to local realities in Latin America and the Caribbean | Regional Climate Pavilion | 11:15 – 12:15 | Palmares, Talanoa, Decodifica |
| 20/11/2025 | Painel Mudanças Climáticas | Casa Vozes do Oceano | 15:30 – 19:00 |