Brasil segue sem uma estimativa de custo dos compromissos climáticos até 2035

Brasil segue sem uma estimativa de custo dos compromissos climáticos até 2035

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Foto: Canva

Reduzir o desmatamento em propriedades rurais autorizado por lei é o maior desafio da estratégia de financiamento da agenda climática brasileira, aponta a Estratégia de Meios de Implementação (ETMI) do Plano Clima, lançada à consulta pública durante a COP30. O texto não traz uma previsão do custo da transição para uma economia de baixo carbono e resiliente, mas aponta um cardápio de opções e, principalmente, aponta quais são as prioridades e os principais obstáculos. 

O Plano Clima ainda aguarda aprovação final do Conselho Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) e representa a coluna dorsal das políticas climáticas brasileiras. O plano contém um total de 1.064 ações: 231 de mitigação das emissões e mais 833 de adaptação à mudança climática. 

Para um dos pilares da estratégia climática brasileira, a restauração da vegetação nativa, é mencionada uma estimativa parcial de custo entre R$ 31 bilhões e R$ 52 bilhões para cumprir a meta de 12 milhões de hectares até 2030 do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg). A restauração aparece como prioridade número um da Estratégia de financiamento e tem benefícios duplos, porque captura carbono da atmosfera ao mesmo tempo em que promove resiliência às mudanças climáticas. O documento em consulta pública aponta uma percepção de risco alto de financiamento da restauração. 

Mas é na redução do desmatamento legalmente autorizado em propriedades rurais que o documento identifica o principal desafio à implementação do Plano Clima. O tema também é o principal desafio político para o lançamento do plano, e iria além de mecanismos de pagamento por serviços ambientais, ainda incipientes no país.

“A redução da supressão autorizada de vegetação nativa exige a construção de um novo arcabouço de incentivos econômicos positivos, capaz de tornar a

conservação mais vantajosa e atrativa do que a conversão do uso da terra”, diz o texto da Estratégia. “As principais barreiras relacionadas à temática são a insuficiência de fontes de recursos previsíveis e na escala necessária para incentivar a manutenção da vegetação nativa”, completa. 

A adaptação é outra prioridade na Estratégia lançada à consulta pública, sobretudo para aumentar a resiliência das cidades brasileiras à mudança do clima. Nesse capítulo, as soluções baseadas na natureza (SBN), como o plantio de árvores, aparecem em destaque, por reduzir riscos de inundações e de ondas de calor. Elas aparecem ao lado de obras de infraestrutura e melhoria da mobilidade urbana. 

Nesse capítulo, o desafio é duplo. Aumentar o volume de recursos para adaptação e, ao mesmo tempo, capacitar os municípios para elaborar projetos baseados na ciência. A incorporação de critérios de risco climático nas decisões de gastos públicos será importante para viabilizar a adaptação. 

A agricultura e a pecuária de baixo carbono e a descarbonização na produção e no uso de energia e de processos industriais completam a lista de cinco prioridades de financiamento da agenda climática do país. A agropecuária é o setor que mais emite gases de efeito estufa, sobretudo no processo de produção de carne, e já conta com recursos do Plano Safra, que precisam destinar uma parcela maior à produção com menor emissão. A recuperação de pastagens degradadas já vem contando com recursos do Fundo Clima. 

No capítulo de energia, o documento cita a rápida expansão de fontes renováveis, com desequilíbrio entre produção, transmissão e consumo de energia e desestímulo a investidores. “Esse cenário exige ajustes institucionais e regulatórios que restabeleçam a atratividade dos investimentos, assegurem a estabilidade do sistema e promovam a transição energética de forma ordenada”, relata. O documento lista a necessidade de financiar o aumento “sustentável” da produção de bioenergia, inclusive com captura de carbono, ao lado de combustíveis sintéticos, do hidrogênio de baixo carbono e avanço da eficiência energética e da eletrificação. 

A Estratégia esclarece que a implementação da agenda climática não depende só de dinheiro, mas de fortalecimento de capacidades e transferência de tecnologia. Entre os instrumentos econômicos capazes de mobilizar as empresas para ações de mitigação e adaptação, o documento cita a precificação do carbono. O Brasil ainda aguarda a regulamentação do mercado regulado. 

A Estratégia aponta o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), lançado oficialmente na cúpula dos líderes em Belém, como modelo inovador de financiamento climático. O fundo espera reunir US$ 125 bilhões de investimentos de países e do setor privado. A expectativa é usar parte dos rendimentos em pagamentos aos países que detêm florestas para financiar políticas de conservação. 

A recém-lançada Taxonomia Sustentável Brasileira também aparece na Estratégia como fundamental para direcionar o financiamento climático no país.  “A taxonomia busca oferecer clareza aos investidores, evitar o greenwashing e facilitar a rastreabilidade dos fluxos financeiros sustentáveis, sendo elemento central para a expansão do mercado de finanças sustentáveis no país”.

As diretrizes da estratégia são listadas no documento: 

1️⃣ – apoio orçamentário direto a projetos climáticos prioritários; 

2️⃣ – acesso a financiamentos internacionais, por meio da submissão de propostas a fundos multilaterais; 

3️⃣ – criação de condições viabilizadoras e ambientes favoráveis ao investimento privado, com reformas regulatórias e estruturação de incentivos econômicos; 

4️⃣ – proposição de instrumentos financeiros inovadores, privados ou mistos, conhecidos como blended finance, por meio de bancos nacionais ou subnacionais de desenvolvimento, com vistas a ampliar a base de recursos financeiros disponíveis para projetos e empreendimentos climáticos.

“O financiamento climático não é um tema complicado só nas negociações globais. Também é um desafio para a agenda climática doméstica. Embora não haja ainda números precisos, a estratégia apresentada durante a COP30 acerta ao alinhar gastos públicos a uma agenda de desenvolvimento de baixo carbono e resiliente aos impactos do aquecimento global”, comenta Marta Salomon, especialista sênior em políticas climáticas no Instituto Talanoa.

Equipe Editorial (Liuca Yonaha, Marta Salomon, Melissa Aragão, Ester Athanásio, Marco Vergotti, Renato Tanigawa, Taciana Stec, Wendell Andrade, Daniel Porcel, Caio Victor Vieira, Beatriz Calmon, Rayandra Araújo e Daniela Swiatek).

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