Para um futuro brilhante, energia limpa, adaptada e assegurada

(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)

Foto: Canva

As energias renováveis alcançaram ápice inédito na agenda do sistema internacional. Em todo lugar que se olha, há algo sobre elas. A onipresença revela que a disputa em torno das energias limpas não é apenas climática, mas geopolítica e econômica. Seu domínio definirá quem são as autoridades da transição para longe de combustíveis contaminantes e, portanto, os governantes do futuro energético da humanidade.

Em 2015, na oportunidade histórica da construção e assinatura do Acordo de Paris, a transição para fontes renováveis, como energia solar e eólica, foi uma agenda política crucial para o cumprimento das metas que visam a limitar o aumento da temperatura média global a 1,5°C em relação ao período pré-industrial. A boa notícia é que essa transição está em andamento: em 2025, mais de 40% da capacidade global de geração de energia está baseada em fontes renováveis. O comportamento tendencial é o que importa: ruma-se a um futuro brilhante, iluminado por fontes limpas e renováveis, onde o petróleo será uma energia obsoleta.

As cifras são interessantes. A Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) projeta que o mercado global de tecnologias limpas triplicará de valor antes de 2035, atingindo a marca de R$ 10 trilhões. De acordo com previsões recentes, a energia renovável superará o carvão como principal fonte de eletricidade no mundo “até 2026, no mais tardar”, com as fontes solar e eólica respondendo por mais de 90% do aumento da demanda global por eletricidade, enquanto a expansão moderada da hidrelétrica contribuirá para consolidar a liderança das renováveis.

No primeiro semestre de 2025, os investimentos globais em solar e eólica chegaram a mais de R$ 2 trilhões, o maior volume já registrado. Enquanto os Estados Unidos viram seus aportes caírem quase 40%, China e Europa compensaram o vazio, reforçando seu papel de sustentação da transição energética global diante da reiterada incapacidade estadunidense de articular políticas consistentes independentemente de quem ocupe o Salão Oval. Dessa forma, a China consolidou-se como líder global em novas tecnologias e equipamentos de energia, acumulando mais de 40% das patentes mundiais. Durante o 14º Plano Quinquenal (2021-2025), o país superou os próprios recordes em eficiência fotovoltaica e capacidade de turbinas eólicas offshore, além de expandir rapidamente sua capacidade de armazenamento de energia. O consumo de energia cresceu significativamente desde a abertura econômica e, em 2025, a geração elétrica chinesa representa um terço do total global.

A transição energética foi acelerada no gigante asiático, com participação das renováveis na matriz subindo de 40% para cerca de 60%, impulsionando o conteúdo “verde” do crescimento econômico. Produtos eólicos e solares exportados pelo país ajudaram outros a reduzir bilhões de toneladas de emissões de carbono. Ainda, a energia limpa e suas tecnologias associadas foram responsáveis por 10% do Produto Interno Bruto, um valor equivalente a 87% de todas as riquezas produzidas no Brasil em 2024.

Some-se a isso que a explosão de geração de energia limpa faz ressurgir uma expansão industrial para manufaturar os componentes necessários à implantação, a qual, por sua vez, atrai outras indústrias e serviços associados pelo efeito geoeconômico chamado de “Economia da Aglomeração”. Para se ter uma noção, o investimento global em capacidade industrial para tecnologias limpas cresceu 50% só em 2023, de acordo com a IEA. Vive-se uma adição energética limpa, um começo de transição que precisa evoluir para a substituição das fontes baseadas em petróleo, carvão e gás.

No que tange à redução da pressão sobre as rendas das pessoas, 91% dos novos projetos renováveis foram mais econômicos do que os projetos de combustíveis fósseis. Especificamente a solar, sendo considerada a fonte de energia mais barata da história da humanidade. Mas, além do custo, diversos fatores influenciam as decisões das empresas de investir: o tamanho do mercado interno, a disponibilidade de trabalhadores com as habilidades necessárias, a maturidade da infraestrutura, os processos de licenciamento e outros regimes regulatórios e as sinergias com indústrias já existentes são apenas alguns exemplos. Programas de capacitação e certificação de trabalhadores, redução dos prazos de implementação de projetos mantendo padrões ambientais seguros, ampliação dos mercados internos e diminuição da incerteza por meio de políticas climáticas estáveis são algumas das principais medidas de “baixo arrependimento” capazes de elevar os incentivos ao investimento. Intervenções políticas podem, portanto, aumentar a atratividade de investir em uma determinada região sem subsidiar diretamente os custos de fabricação.

Aqui, temos um gargalo: a adaptação. Com a aceleração de implantação de renováveis, problemas na sua gestão precisam ser superados, principalmente sobre sua capacidade de resposta a eventos climáticos extremos e a desastres naturais, garantindo fornecimento energético estável. Isto é, as soluções para resolver a emergência climática precisam lidar com os efeitos dela.

Um novo estudo publicado na Nature Climate Change alerta que eventos prolongados de baixa velocidade do vento, conhecidos como “secas de vento”, podem se tornar até 15% mais longos até o final do século na maior parte do hemisfério norte sob um cenário de aquecimento moderado. Essas condições já foram registradas em regiões como Europa, EUA, China, Japão e Índia, e representam um desafio crescente para a segurança do fornecimento de energia eólica. Embora não indiquem um colapso do setor, as secas de vento elevam preços de energia e reforçam a necessidade de combinar energia eólica com solar, hidrelétrica, bioenergia e armazenamento para reduzir riscos.

Na semana passada, um aerogerador do Parque Eólico Cumbe, em Aracati (CE) pegou fogo enquanto estava em operação, provocando a soltura das pás eólicas. As torres ficam localizadas nas dunas da comunidade, a cerca de 5 km das casas. Ainda não há confirmação oficial sobre a causa do incêndio, mas uma das hipóteses é que o calor extremo da região tenha provocado um curto-circuito, que acabou escalando e comprometendo a integridade do equipamento.

O episódio evidencia a importância de que os materiais utilizados em parques eólicos estejam adaptados à realidade nacional. Desenvolver a indústria eólica e de materiais no Brasil permitiria que a engenharia de materiais considerasse os modelos climáticos esperados para diferentes regiões do país, aumentando a segurança, a durabilidade e a eficiência das turbinas. Investir em pesquisa e produção local não só fortalece a cadeia produtiva nacional, mas também garante que a expansão das energias renováveis ocorra de forma resiliente e adequada às condições climáticas presentes e futuras. Também traz à baila uma lacuna regulatória importante: o Brasil ainda não possui protocolos nacionais robustos de salvaguardas voltados à proteção de comunidades próximas a parques eólicos. Tais protocolos são essenciais para garantir segurança, prevenir acidentes, reduzir impactos sociais e assegurar que a expansão das energias renováveis não comprometa a integridade de moradores e ecossistemas locais.

Com o mundo em plena corrida pelo atingimento das determinações científicas de triplicar a capacidade de geração renovável até 2030, as energias renováveis são uma segurança contra as mudanças climáticas.

Todavia, as renováveis também precisam de seguros. Uma vez que os cenários futuros de instabilidade climática pioram dada a morosidade política de cumprir a transição para longe dos combustíveis fósseis, a insuficiência de cobertura acessível pode frear investimentos em projetos de energia limpa, principalmente no mundo em desenvolvimento. O mercado de seguros para energias renováveis ainda representa menos de 30% do tamanho do setor voltado a combustíveis fósseis, apesar do enorme potencial de crescimento e da relevância das renováveis para segurança energética e descarbonização.  Para destravar esse mercado, os seguros precisam evoluir rapidamente, incorporando dados em tempo real, análises tecnológicas e informações qualitativas, além de engajar-se com financiadores de projetos para criar produtos adequados. A adoção dessas medidas permitiria ao setor não apenas reduzir perdas associadas a riscos climáticos, mas também desempenhar papel estratégico no fomento à transição energética global, transformando-se de um setor que historicamente protegeu os projetos de combustíveis fósseis em um protagonista da energia limpa e da prosperidade econômica.

Para que a transição energética cumpra seu potencial de promover um futuro brilhante, precisa-se expandir a geração renovável e reduzir a geração por fontes contaminantes, como carvão, petróleo e gás. Faz-se necessário que políticas públicas, inovação tecnológica, desenvolvimento industrial e instrumentos de mitigação de riscos econômicos caminhem juntos.

O Brasil, como presidente da COP e ator global na agenda climática, tem diante de si uma oportunidade histórica de consolidar liderança em energia limpa, garantindo que a expansão das renováveis seja segura, resiliente e socialmente justa. Protocolos de salvaguarda para comunidades, adaptação de materiais à realidade climática nacional, seguros robustos para novos projetos e políticas claras de incentivo ao investimento são medidas para que a energia renovável deixe de ser apenas uma promessa e se torne um vetor sólido de segurança climática, industrial e, por diminuir os custos de vida, socioeconômica.

Equipe Editorial (Liuca Yonaha, Marta Salomon, Melissa Aragão, Ester Athanásio, Marco Vergotti, Renato Tanigawa, Taciana Stec, Wendell Andrade, Daniel Porcel, Caio Victor Vieira, Beatriz Calmon, Rayandra Araújo e Daniela Swiatek).

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