BOLETIM SEMANAL #250 ◆
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(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
Exatamente na semana em que nosso Boletim Semanal completa 250 edições de monitoramento da política climática nacional, um movimento de repercussão estrutural se apresentou no Brasil: a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que pauta profundas transformações no licenciamento ambiental brasileiro como o conhecemos.
Foram 267 votos a favor, contra apenas 116 contrários. Outros 130 deputados não registraram voto, mas, ainda que comparecessem, a maioria favorável estaria formada.
A Política por Inteiro acompanhou os desdobramentos do assunto mais importante da semana, e analisa alguns pontos centrais que rebatem em política climática:
- Governança: diferentemente do que tem repercutido na imprensa nos últimos dias, não é o Ibama que sai enfraquecido, e sim a lógica federativa determinada pela Constituição Federal. Entre os artigos 22 a 24 da Carta Magna, a ideia do Poder Constituinte Originário (o próprio Congresso Nacional) era a de organizar os limites de atuação e de deixar clara a complementariedade entre os níveis de governo na execução de políticas. Com o PL, a sintonia buscada pela Constituição – e, mais tarde, pela Lei Complementar 140/2011 – tende a se perder, confundindo a governança federativa, já que estados e municípios passam a ter um espaço que, administrado à revelia de compromissos ambientais e climáticos, podem implicar uma espécie de “doença autoimune”, aquela em que o organismo (federação) ataca seus próprios tecidos (regras) e órgãos (institucionalidade). A própria razão de ser da LC 140/2011 é posta à prova.
Há, também, uma “anulação automática” de regras que até aqui demandam diálogo e coordenação entre órgãos técnicos, a exemplo da Resolução CONAMA nº 428/2010, que coloca órgão licenciador e órgão gestor de Unidades de Conservação juntos no fluxo de decisão sobre empreendimentos em espaços territoriais especialmente protegidos. Agora, autoridades envolvidas (art. 42 do PL) deixam de ter posição vinculante à decisão de órgãos licenciadores, conduta que desmonta o Princípio da Especialidade (justificativa da própria existência da Administração Pública Indireta) e a capacidade deliberativa de órgãos e colegiados, minando suas competências legais.
- Ordem econômica: outro embate constitucional deverá residir na ordem econômica. Como um dos pilares da República, consagrada na Constituição de 1988 (art. 170), ela tem como um um de seus princípios justamente a “defesa do meio ambiente”, com “tratamento diferenciado conforme impacto ambiental” decorrente do exercício da liberdade de empreender no país. O texto constitucional é explícito, justamente para que não haja a possibilidade de divergências interpretativas. Acontece que uma profunda revisão no modo de licenciar – ainda que a pretextos legítimos como a simplificação e a modernização – tende a reduzir a capacidade estatal de resguardo à saúde pública e à própria sustentabilidade econômica dos empreendimentos.
- Repercussões orçamentárias: uma lacuna não sanada pelos parlamentares reside no incremento de custos que o Estado brasileiro poderá vir a ter com a remediação de desastres provocados pela negligência ou imperícia em empreendimentos: se a vistoria, ora obrigatória, agora será amostral (art. 22, §4º do PL), muito deixará de ser observado. Na eventualidade de um desastre, historicamente, o primeiro socorro vem do aparato estatal: órgãos como Defesa Civil, Bombeiros, hospitais do Sistema Único de Saúde e todo o trabalho de perícias, remoções e remediações significam pressão no orçamento público. Em tempos de aperto orçamentário e compromisso com déficit zero, o Estado terá condições de arcar com o que desandar? A criação de um fundo como mecanismo de prevenção ou mitigação de impactos não deveria ser idealizado? O Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap) – hoje insuficiente para o custeio de calamidades – não poderia ser reformulado/fortalecido? O PL não registra preocupação com mecanismos financeiros ou contribuições de suporte a eventualidades.
- Repercussões de Mercado: prevendo a elevação dos riscos ambientais e climáticos associados, há quem no Mercado tenha pedido bom senso e mais tempo para debater antes de o leite derramar. Um exemplo veio da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do estado de São Paulo (Fecomércio/SP), que publicou um editorial e enviou carta a Hugo Motta, preocupada com a insegurança jurídica e ambiental do Projeto de Lei. Os movimentos da Federação e de expoentes do grande capital demonstram que os potenciais impactos no clima e na Natureza não fazem parte de uma disputa ideológica. O próprio Fórum Econômico Mundial, “sala de comando” do sistema econômico global, já compreendeu que mudança do clima e ameaça à biodiversidade são limitantes do crescimento econômico. Por isso, a aprovação do PL levanta questões que os congressistas não se propuseram a responder: o capital, seja ele público ou privado, seguirá financiando empreendimentos com a mesma confiança se o risco de dar errado aumenta? A insegurança jurídica não significará aumento de juros, justamente porque a confiança cai quando a regra afrouxa? Atalhos que impliquem insegurança jurídica não farão com que o dinheiro custe mais caro, no fim das contas? Como as seguradoras vão se preparar para cobrir empreendimentos na nova regra?
- Adaptação climática: nos últimos anos, sociedade civil e (parte do) governo têm feito um grande esforço para emplacar diretrizes de adaptação no modo de tomar decisões sobre políticas públicas e infraestrutura no Brasil. Esse compromisso até virou lei em 2024 e objetiva incutir a gestão de risco climático nas estratégias de desenvolvimento local, municipal, estadual, regional e nacional. Ao privilegiar a liberdade legislativa de entes subnacionais, em detrimento do alinhamento a um fio condutor central, o texto aprovado nesta semana tende a desacelerar o compromisso federativo com adaptação. Desse modo, o texto colabora para minar a capacidade governamental de reduzir os efeitos da mudança do clima sobre a sociedade. Em vez disso, o PL 2.159 deveria reforçar a essencialidade da adaptação para que os próprios empreendimentos tenham mais e melhores condições de prosperar e se manterem economicamente viáveis ao longo das próximas décadas. A esse respeito, no entanto, parlamentares foram silentes. Atos meramente declaratórios, como a Resolução do Conselho da República nº. 3, de exatamente um ano atrás, não vão funcionar como “antídoto” a essa desadaptação. Não há força normativa para tanto. Com regras flexibilizadas em excesso nos estados e nos municípios, a tendência é que empreendedores não se sintam estimulados a ampliar a capacidade adaptativa local em suas intervenções, o que faz o PL colidir com a lei de adaptação climática de 2024.
- Fricção vs. Responsabilidade: se o texto for sancionado pelo Executivo como está, setores carbono-intensivos e/ou cujo compromisso com o clima ainda não é exatamente pronunciado, terão pela frente menor fricção junto ao aparato estatal: enquanto a mineração conseguiu retirar o Conama do fluxo de aprovação, a Infraestrutura se livrará da própria necessidade de licença nos casos de ampliação de estradas; autorizações ficarão mais fáceis até mesmo para barragens de rejeitos, algo contraintuitivo a um país que vivenciou os casos de Mariana e Brumadinho na última década; a pecuária “de pequeno porte” ficará desobrigada de licença (mesmo que na vida real sejam comuns os fracionamentos de grandes empreendimentos em “vários pequenos”, já para driblar lei e necessidade de Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA, entre outras exigências).
Até atividades militares (dentro das quais podem se enquadrar as ligadas a estradas) estão desobrigadas da obtenção de licença ambiental. É bem verdade que o PL emplacou aumento da pena para o crime de construção sem a devida autorização do órgão licenciador, que agora passa a ser de seis meses a dois anos (antes: de um a seis meses), cumulativamente com multa. Todavia, considerando que as vistorias devem ocorrer de modo amostral, e portanto com rigor estatal ausente para a maior parte dos empreendimentos, uma pergunta fica no ar: a autonomia conquistada por empreendedores virá acompanhada da devida responsabilização caso negligências resultem em desastres? Quais as garantias?
- Maior uniformidade procedimental: outro ponto legítimo (embora mal encaminhado, a nosso ver), é a busca por maior uniformidade procedimental. Do modo como se apresenta no PL, ela leva a tratamento uniforme tipologias amplamente distintas em natureza e complexidade. No mesmo pacote de “médio porte”, elegível a facilitações de licença, estão, por exemplo, empreendimentos como ampliação de estradas, construção de usinas hidrelétricas e barragens – todos potenciais vetores de aumento das emissões e com grande impacto socioambiental – o que derruba o mandamento constitucional de tratamento diferenciado, presente no art. 170 da Constituição.
- Constitucionalidade: colisões entre o texto atual do PL e dispositivos constitucionais certamente farão com que a matéria seja questionada junto ao Supremo Tribunal Federal. Dada a conexão entre o Licenciamento e temas como saúde pública, patrimônio cultural, participação social, direitos indígenas, quilombolas e, claro, meio ambiente como elemento que os perpassa, a posição do guardião da Constituição deverá ser pela inconstitucionalidade ao menos parcial do texto aprovado pelo Congresso, o que inevitavelmente contrata (mais uma) nova rodada de tensões entre os Poderes. Antes disso, vetos do Executivo são possíveis, embora atualmente eles tenham muito menos peso, dadas as recentes derrubadas de veto em diferentes matérias. Em sendo provocado, o STF deverá agir rapidamente, uma vez que, mantidas as colisões, a tendência é de uma enxurrada de judicializações em empreendimentos em diferentes áreas, em especial as classificadas como médio porte, que passam a ter, na Licença por Adesão e Compromisso (LAC), uma novidade.
- Funções “extra-ambientais” do licenciamento: diferentemente de outros países, o Brasil não tem licenciamentos específicos para além do ambiental. Assim, questões sociais e até mesmo as ligadas ao patrimônio histórico, ao longo dos anos, vêm sendo albergadas em análises dentro do licenciamento ambiental. Com isso, há rebatimentos que vão além da gestão e do uso de recursos naturais do país. Esses aspectos agora se tornam mais expostos e dependentes da voluntariedade de particulares, que, sabemos, têm, no mais das vezes, interesses conflitantes em relação à coletividade, razão pela qual o ordenamento jurídico nacional, não por acaso, consagrou os bens de usufruto coletivo como difusos, dessa forma impassíveis de prevalência da vontade particular. O STF certamente levará esse caráter “extra-ambiental” em conta.
- Havia saída para o Legislativo? Sim, o Congresso tinha caminhos: poderia, na Reforma Administrativa (que está sendo ensaiada), tratar o Licenciamento como tema estratégico ao desenvolvimento nacional, de modo a determinar em lei o investimento em modernização do setor público para órgãos como o Ibama e as secretarias, institutos e fundações estaduais e municipais de meio ambiente. Isso daria coerência a discursos parlamentares de atração de investimentos internacionais e de conformidade (compliance) a mercados cada vez mais exigentes em matéria de responsabilidade ambiental e climática, na origem. Em vez disso, ambas as Casas Congressuais escolheram apostar as fichas na elevação de riscos nesses temas.
É ponto pacífico que o Licenciamento no Brasil carece de melhorias, mas fundamentos técnicos e segurança jurídica deveriam ser inegociáveis. Os pretextos de agilidade e facilidade são legítimos, mas não podem vir a qualquer custo. Do contrário, depõem contra a própria viabilidade econômica dos empreendimentos, além de externalidades negativas que tendem a onerar a coisa pública. O flerte com impactos socioambientais e climáticos (que costumam ser sinérgicos) tende a ser uma bomba de efeito retardado que pode voltar ao colo do próprio Congresso Nacional dentro dos próximos anos, para a aprovação de leis que façam a conta do clima fechar. Nesse ponto futuro, uma certeza: o desafio será bem maior que hoje.
- Reputação institucional: A aprovação do PL também simboliza a pá de cal que restava sobre o Pacto da Transformação Ecológica entre os Três Poderes, que já vinha claudicante. Para os parlamentares, o dividendo negativo é o descumprimento de palavra, importante ativo de sobrevivência política. Com 2026 logo ali, aumenta a exposição da classe política. Não está claro aos congressistas que o melhor caminho deveria ser o diálogo à exaustão de matérias transformacionais, como é o caso trazido pelo PL 2.159? Como esperar da legislatura atual a aprovação de leis que elevem o compromisso brasileiro com o clima, a exemplo da atualização da Política Nacional sobre o tema, que está na fila?
A fragilização das regras de Licenciamento Ambiental resta evidente. É bem verdade que engrenagens, com o passar do tempo, têm lá suas lacunas e notórias necessidades de reparo, mas, no caso do Licenciamento, o saldo na conciliação entre liberdade econômica e resguardo de direitos fundamentais vem sendo amplamente positivo na história do país. Os parlamentares (que não devem ser confundidos com a instituição Congresso Nacional) tiveram escolha, mas Hugo Motta – e Davi Alcolumbre, ainda em maio – se mostraram indiferentes a atender a debates demandados amplamente pela sociedade, incluindo cientistas, empresários, ambientalistas e outros grupos. O veto presidencial à lei será uma segunda oportunidade para que ouçam a diversidade das vozes que apelaram por uma discussão apropriada para o aprimoramento da legislação – e não ao seu retrocesso. O presidente Lula terá 15 dias para fazê-lo a partir do recebimento da matéria.
Boa leitura!
Boletim Semanal 250, e ainda muito pela frente
Em mais uma semana com movimentos anticlima difíceis de encarar, o Boletim Semanal da Política por Inteiro chega à edição 250. São quase cinco anos de publicações sobre a quantas anda e para onde caminha a política climática brasileira. Ligando pontos também com o que acontece no mundo.
O Boletim Semanal nascia em 1º de outubro de 2020, época em que desregulamentar e erodir políticas ambiental e climática eram verbos de conjugação prioritária em Brasília. Um período nebuloso para as pretensões do Estado brasileiro em colocar o assunto Mudança do Clima no centro das preocupações e das decisões públicas. A Política por Inteiro surgiu da necessidade de conjugar outros verbos, como identificar, analisar e monitorar o impacto dessas desregulamentações para a ambição climática do Brasil, oficializada lá em 2009, na Política Nacional sobre Mudança do Clima, e ampliada em 2016, com a Contribuição Nacionalmente Determinada do Brasil no âmbito do Acordo de Paris.
Além dos Boletins Semanais, a Política por Inteiro publica outras análises, totalizando mais de 680 textos, que têm como motivação maior colaborar para que governos, empresariado e a própria sociedade, em seus mais diferentes segmentos, compreendam em que pé
estão os muitos assuntos ligados ao vasto tema climático, e, ao observar o conjunto de atos e sinais de interesse público, por inteiro, tomem melhores decisões, que convirjam para aumentar ambição climática do Brasil.
Se tem algo constante nessas 250 semanas de Boletim Semanal, são as preocupações, como a aprovação do PL 2159/2025. No entanto, vez por outra a gente celebra vitórias de qualquer tamanho, dadas as circunstâncias longe de qualquer ideal. A reativação do PPCDAm, a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), a homologação de Terras Indígenas e a concessão de títulos para Territórios Quilombolas, regulações do campo financeiro aumentando o compromisso do dinheiro público com o clima (como ocorreu com o Fundo Social do Pré-Sal, nesta semana) e o alinhamento de bancos a balizas climáticas quando da concessão de empréstimos rurais, como vem regulando o Conselho Monetário Nacional nos últimos dois anos. São sinais importantes de avanço, ainda que habitualmente soterrados por movimentos retrógrados vindos do Parlamento e, também, da banda descolada da própria realidade climática, dentro do Executivo. Essas conquistas muitas vezes viram fôlego para nosso otimismo, sempre colocado à prova.
TÁ LÁ NO GRÁFICO
Os acordos internacionais firmados no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Climáticas (UNFCCC) se dão pelo processo de negociação entre países e, sobretudo, pela atuação dessas nações por meio de coalizões. Essas organizações podem reunir as partes por afinidade política, econômica, histórica ou geográfica e são determinantes para que os diálogos se consolidem em decisões. O Tá Lá no Gráfico desta semana aprofunda o funcionamento do jogo diplomático, mostrando quais são os principais blocos na mesa de negociação climática, os fatores que reúnem as nações e as principais agendas defendidas ou bloqueadas no cenário global.
FRASE DA SEMANA
“Uma disputa entre o bom senso e uma decisão meramente política que agrada certa parte do eleitorado com uma visão de curto prazo, obviamente comprometendo o futuro, que já dá provas do quanto pode ser perigoso e penoso para todos. É uma sandice.“
Horácio Lafer Piva, economista, empresário e ex-presidente da Federação de Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), para a jornalista Alice Ferraz, do Estadão, ao repercutir a aprovação do PL do Licenciamento Ambiental, pela Câmara dos Deputados, nesta semana. Foto: Eduardo Ogata/SECOM
ABC DO CLIMA
EIA/RIMA: É a sigla para Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental, documentos técnicos que fornecem à sociedade o embasamento mínimo sobre o qual se justifica um empreendimento considerado de “significativo impacto ambiental”. São instrumentos de gestão ambiental consagrados há quase 40 anos, desde 1986, pela Resolução nº. 001 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), e, portanto, anteriores à própria Constituição Federal, tendo sido por ela abraçados em seu artigo 225. EIA e RIMA são normalmente citados juntos por serem complementares entre si. O EIA é mais técnico e voltado para especialistas e analistas do órgão licenciador, e é responsável pela caracterização do empreendimento em seus mais diferentes aspectos, tendo ainda papel propositivo quanto a alternativas para que o empreendimento reduza impactos (inclusive climáticos) em sua implementação e seja acompanhado durante seu desenvolvimento; já o RIMA é concebido para ser mais compacto e objetivo, e deve ser feito em linguagem acessível (com prioridade para ilustrações), justamente porque seu objetivo é dar transparência à população em geral sobre os prós e contras do empreendimento em questão, esclarecendo sobre seus efeitos ambientais, sociais e culturais na sociedade.
MONITOR DE ATOS PÚBLICOS
Nosso Monitor de Atos Públicos captou 15 atos relevantes para a política climática nesta semana. O tema mais frequente foi Terras e Territórios, com 9 atos, puxados pela criação de assentamentos da reforma agrária. Já a classe mais registrada foi Regulação, com 13 normas, incluindo novas normas do Programa MOVER. A agenda Mitigação foi predominante na semana, ocorrendo em 10 dos 15 atos.
Fundo Social do Pré-Sal toma “banho de loja” pelo clima
Publicada nesta semana uma lei que altera a chamada Lei do Pré-Sal, de 2010. A norma determina que “mitigação e adaptação às mudanças climáticas e a seus efeitos e de enfrentamento das consequências sociais e econômicas de calamidades públicas” é, agora, tema financiável pelo Fundo Social (FS).
O Fundo Social foi criado em 2010, no contexto da descoberta do Pré-Sal, para fomentar o desenvolvimento social e regional no Brasil, a partir dos recursos obtidos com a exploração de Óleo & Gás fósseis.
Temas que têm relação direta com política climática (especialmente adaptação) também passam a fazer parte do rol de financiáveis pelo FS:
- “Infraestrutura social”;
- “Habitação de interesse social”;
- “Infraestrutura hídrica”;
- “Defesa dos direitos e dos interesses dos povos indígenas”;
- “Segurança alimentar e nutricional”.
O texto original da norma, de 2010, trazia um Fundo Social bastante genérico em finalidades. Agora a revisão da lei traz um “banho de loja” em favor do clima, que havia começado com uma Medida Provisória em março deste ano.
Nota: Nesta semana, a Câmara dos Deputados também se movimentou para aprovar que pelo menos R$ 30 bilhões do Fundo Social sejam canalizados para produtores rurais afetados por calamidades públicas (muitas vezes desencadeadas por eventos climáticos extremos). A preocupação é que, a pretexto de fundamentar a aplicação dos recursos na diretriz de “enfrentamento das consequências sociais e econômicas” ligadas à mudança do clima, o Legislativo distorça a aplicação de recursos do Fundo, privilegiando o já privilegiado segmento agropecuário de médios e grandes produtores.
MOVER se move
Em continuidade aos anúncios da semana passada (confira nosso Boletim #249), mais duas regulamentações sobre o Programa Mobilidade Verde e Inovação (“Mover”) foram lançadas. A primeira diz respeito ao cronograma de implementação do programa de eficiência energética para veículos pesados (aqueles acima de 3,5 toneladas), incluindo prazos para divulgação de resultados ao público por parte das montadoras aderentes ao programa. Já a segunda, se refere aos critérios a serem utilizados para que um veículo seja considerado “sustentável” no Brasil, assim como o que é necessário para comprovar essa classificação.
A semana ainda trouxe as primeiras declarações de modelos sustentáveis a serem informados à população, dentro do programa de redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), criado pelo governo para estimular o consumo na indústria automobilística. Nessa primeira rodada, foram declarados sustentáveis 24 modelos, vindos das montadoras Volkswagen, Chevrolet, Renault, Fiat e Hyundai. Outras declarações são aguardadas nas próximas semanas.
BRASIL
Plano Clima apresenta metas setoriais de emissões para 2030 e 2035
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima divulgou na sexta-feira (18) a íntegra da Estratégia Nacional de Mitigação (ENM) e seus sete planos setoriais, que estarão em consulta pública entre 28 de julho e 18 de agosto na plataforma Brasil Participativo. Esses documentos, elaborados ao longo de quase dois anos com a participação de 19 órgãos federais, compõem o Plano Clima, que orienta as ações para cumprir as metas climáticas do Brasil até 2035. A estratégia traz metas setoriais, ações e indicadores para descarbonizar a economia. Os planos abrangem agricultura e pecuária, conservação da natureza (como a metodologia usada denominou o setor de uso da terra e florestas), cidades, transportes, energia, resíduos sólidos e efluentes domésticos. De acordo com os números apresentados, o esforço de restauração deverá ser grande, para que o setor de conservação da natureza alcance emissões negativas de pelo menos 317 MtCO2e em 2030 e cheque a -325 MtCO2e em 2035. A agropecuária precisará cortar mais da metade de suas emissões em relação a 2022 em pouco mais de uma década (54% até 2035).
Compromisso climático no pronunciamento sobre o tarifaço
Lula dobrou a aposta no discurso de defesa da soberania nacional para reagir contra o tarifaço imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em discurso em cadeia nacional na noite da última quinta-feira (17), o Presidente da República disse que o Brasil esgotaria todas as possibilidades de negociação para evitar o pior impacto, mas que não se submeteria ao que chamou de “chantagem inaceitável”.
Em meio a argumentos que enalteceram o Brasil, é um sinal relevante que a agenda climática tenha se feito presente na mensagem a brasileiros e brasileiras. Lula enfatizou a redução do desmatamento na Amazônia nos últimos dois anos e reafirmou o compromisso de zerá-lo até 2030. Na NDC brasileira, o Brasil se compromete a implementar “esforços coordenados e contínuos para suprimir o desmatamento ilegal”. E ainda cravou que “só uma pátria soberana é capaz de promover desenvolvimento sustentável”.
Da amarga atual relação entre Brasil e EUA, sobrou um pequeno alívio ao ver a cúpula dos três Poderes mais próxima e uníssona na defesa da soberania brasileira. É claro que com tempero de IOF e PL da Devastação, a harmonia desejada está longe de se concretizar. Mas a necessidade imediata que o país tem de blindar sua imagem, proteger exportações e promover a credibilidade ambiental é argumento extra para que o Congresso ande para frente em matéria de clima, sem licença para recuar. Sem ação, não há discurso bonito que resista.
Hospedagem em Belém à vista!
A presidência da COP30 anunciou medidas para garantir hospedagem em Belém a todas as delegações do mundo, tendo como prioridade países menores, insulares e em desenvolvimento. O governo federal contratou dois navios de cruzeiro que, juntos, somam 6 mil leitos. No site oficial da COP30 é possível consultar a lista de 98 países que terão prioridade na contratação das acomodações, que serão disponibilizadas via plataforma validada junto à UNFCCC.
A medida é uma resposta à pressão internacional que a presidência brasileira vem sofrendo em razão da escassez e dos preços de acomodação superfaturados em Belém, sede da próxima Conferência do Clima. A Secretaria Extraordinária para a COP30, envolvida na logística, ainda precisa remar muito no diálogo com os setores hoteleiro e imobiliário da capital paraense para não deixar a reputação brasileira e a participação social da COP30 “a ver navios”.
Unidades de Conservação: um quarto de século!
Na sexta-feira (18), a lei que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) completou 25 anos. A história do Brasil com as UCs é centenária, mas o SNUC, estabelecido por lei em 2000, é um marco definitivo de uma institucionalidade essencial para o desenvolvimento nacional. De lá pra cá, grandes avanços em terra e mar, grandes colaborações à governança territorial e à contenção de problemas complexos como o desmatamento, mas também grandes engasgos para criação de novas áreas, assim como implementação (e financiamento!) das já existentes.
Até aqui, saldo positivo e essencial para o alcance das metas climáticas e de desenvolvimento social e econômico do Brasil! Vida longa às UCs!
Sobre o estado da arte das UCs brasileiras, seus benefícios e desafios no enfrentamento à mudança do clima, confira nossa edição gráfica especial sobre o assunto!
MUNDO
Índia já tem sua metade cheia do copo
Nesta semana, a Índia alcançou a marca de 50% de sua matriz energética baseada em fontes de energia renováveis. A informação vem da Reuters, que destaca que o patamar está cinco anos à frente do projetado nas contas do próprio país, isto é, alcançar a marca apenas em 2030.
Ao mesmo tempo, a Índia – que se tornou o país mais populoso do mundo em 2023, ultrapassando a China – tem uma demanda crescente de energia igualmente grande, na casa de 6% ao ano. Mantida linear, sem admitir eventuais saltos, essa proporção significaria dobrar a demanda de energia no país em menos de 20 anos. Resumo da ópera: o apetite por renováveis precisa continuar alto.
Mortes na Espanha por excesso de calor
O Ministério do Meio Ambiente da Espanha comunicou, nesta semana, que as altas temperaturas causaram 1.180 mortes na Espanha nos últimos dois meses – um aumento expressivo em relação ao mesmo período do ano passado, que teve 114 mortes. A maioria das vítimas tinha mais de 65 anos, sendo mais da metade mulheres. Regiões tradicionalmente mais frias, como Galícia, La Rioja, Astúrias e Cantábria, foram as mais afetadas, registrando aumentos significativos de temperatura. O ministério classificou o evento como de “intensidade excepcional”, com um salto sem precedentes nas temperaturas médias e na mortalidade associada ao calor. Foram emitidos 76 alertas vermelhos de calor extremo no período, contra nenhum no ano anterior.
O forte aumento de mortes evidencia que ondas de calor não são apenas desconfortáveis, mas letais, especialmente para idosos, e que os efeitos das mudanças climáticas já impactam diretamente a saúde pública, inclusive em regiões antes consideradas menos vulneráveis. O dado reforça a urgência de estratégias de adaptação climática (que sempre ressaltamos aqui!).
América Latina e Caribe: continentes hidrelétricos rumo à energia solar?
Em março de 2025, a geração elétrica na América Latina e no Caribe alcançou 165 terawatt-hora (TWh), o maior volume registrado nos últimos 12 meses, conforme aponta a Organização Latino-Americana de Energia (OLADE). De acordo com o levantamento, as principais fontes utilizadas no período foram as hidrelétricas, que corresponderam a 47,1% da matriz elétrica, seguidas pelo gás natural (27,4%), energia eólica (6,4%), solar (6,3%), petróleo e seus derivados (5,2%), energia nuclear (2,4%), carvão mineral (2,7%), bioenergia (2,0%) e geotermia (0,5%).
Dentre os destaques, é notável o avanço da energia solar, com crescimento de 53% em relação ao mês anterior. No tocante à taxa de renovabilidade, sete países membros da OLADE já registram índices superiores a 75%, com ênfase para o Paraguai, seguido por Costa Rica, Brasil, Uruguai, Venezuela, Colômbia e Belize. Esses dados reafirmam o papel da região como potência hidroelétrica e indicam uma trajetória promissora rumo à expansão da energia solar.
Entretanto, para que essa transição energética se concretize de maneira ambientalmente responsável, resiliente e socialmente justa, é fundamental que os países da região fortaleçam e preservem seus instrumentos de licenciamento ambiental.
Time de Campeões da COP lança Programa de Trabalho
As iniciativas de Campeões de Alto Nível da COP e a Parceria de Marrakech, liderada por atores não-estatais no âmbito da UNFCCC, lançaram nesta quarta-feira (16) seu programa de trabalho para 2025. O documento enfatiza seu alinhamento com os 30 objetivos da Agenda de Ação lançada pela Presidência brasileira e o Global Stocktake, reafirma o espírito do mutirão e faz um chamado para uma maior coordenação de iniciativas do ecossistema climático através dos chamados Grupos de Ativação.
MONITOR DE DESASTRES
O Monitor de Desastres captou 12 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que impactaram 66 municípios. O evento do tipo Chuvas Intensas lidera novamente, com 28 ocorrências, seguido por seu exato oposto, a Estiagem, com 18 ocorrências. Inundações foram registradas em 9 ocasiões. Os dados reforçam a “virada de chave” dos desastres no Brasil, iniciada na semana passada, quando pela primeira vez, desde fevereiro, Estiagem deixou de liderar o ranking semanal. Haja adaptação, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, para dar conta de evitar (ou ao menos reduzir) prejuízos à população.
Nota explicativa: os dados registrados no Monitor de Desastres referem-se única e exclusivamente às situações de emergência ou calamidade pública reconhecidos oficialmente pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil/MDIC nesta semana. Eventualmente, é possível que desastres ocorridos na mesma semana não sejam contabilizados, dado que o reconhecimento do governo federal leva alguns dias para ser publicado.
TALANOA POR AÍ
A Talanoa participou do debate sobre COP30 na Comissão Geral da Câmara dos Deputados, na quarta-feira (16), horas antes de o Congresso Nacional aprovar o PL do Licenciamento Ambiental, frontalmente repudiado pelo instituto. Em discurso na tribuna do parlamento, a presidente da Talanoa, Natalie Unterstell, lembrou que indústria, agricultura e “até o capital” já entenderam a realidade imposta pela mudança do clima. “Quem está atrasado é a política”, frisou. Ela também citou o desafio de superar a “lacuna de incoerência”, com discursos e acordos políticos que se prometem reduzir emissões, enquanto agem em prol dos fósseis. É momento para que o Brasil mostre responsabilidade ou todos vamos perder.
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TALANOA NA MÍDIA
| E3G | Um artigo sobre os caminhos para uma transição justa dos combustíveis fósseis foi publicado com a coautoria do especialista em políticas climáticas da Talanoa Caio Victor Vieira. |
| CBC | Site canadense publicou notícia com a repercussão de especialistas acerca da aprovação do PL do Licenciamento Ambiental. Natalie Unterstell, presidente da Talanoa, foi entrevistada. A RFI – Rádio França Internacional citou a reportagem e a entrevista. |
| Donny Silva News | Site publicou a opinião do especialista Caio Victor Vieira sobre o PL do Licenciamento Ambiental . |
| EXAME | Reportagem repercute o PL do Licenciamento Ambiental, com entrevista de Natalie Unterstell. |
| Lupa (UOL) | Taciana Stec, analista de políticas públicas do Instituto Talanoa, participa de reportagem sobre COP30 e emergências ambientais. |
| ClimaInfo | A Talanoa é citada em reportagem sobre a pressão social pela não aprovação do PL do Licenciamento Ambiental. |
Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO
