
A Estratégia Nacional de Mitigação (ENM), componente do Plano Clima, foi colocada em consulta pública nesta semana. Qualquer pessoa pode fazer sua contribuição por meio da plataforma Brasil Participativo até o dia 9 de maio.
A ENM ainda não traz os orçamentos de carbono de cada setor – isto é, até quanto de gases do efeito estufa (GEE) cada setor deveria emitir ou remover para que o país mantenha uma trajetória de emissões alinhada às metas declaradas em sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC). Os sete planos setoriais (Uso e Cobertura do Solo em Áreas Públicas, Agricultura e Pecuária, Energia, Indústria, Transportes, Cidades e Resíduos) devem trazer esses patamares.
“O Objetivo Geral da ENM é orientar, promover e monitorar políticas e ações setoriais e transversais coordenadas, que garantam o alcance das metas de mitigação do país e acelerem a transição para uma economia com emissões líquidas zero, de todos os GEE até 2050, de forma a impulsionar a inovação, a competitividade, a geração de empregos e renda, a equidade social e ambiental e a integridade dos ecossistemas naturais.”
A ENM está estruturada a partir de um objetivo geral, que, segundo diz o documento, traduz a ambição nacional de mitigação a curto, médio e longo prazos. Em termos de emissões de gases do efeito estufa (GEE), isso significa:
Curto prazo
- emissões líquidas nacionais de GEE em 2025 de até 1,32 Gt CO2e
- emissões líquidas nacionais de GEE em 2030 de até 1,2 Gt CO2e
Médio prazo
- emissões líquidas nacionais de GEE em 2035 limitadas à banda entre 0,85 Gt CO2e e 1,05 Gt CO2e
Longo prazo
- Zerar emissões líquidas de GEE até 2050
O cumprimento da meta de 2025 depende prioritariamente da continuidade de uma acelerada redução do desmatamento. Ainda no curto prazo, a meta de 2030 requer, entre outras medidas, o fim do desmatamento ilegal, a recuperação de 12 milhões de hectares de vegetação nativa até o fim desta década, assim como a implementação e o cumprimento das metas do Plano ABC+.
Essas ações devem alterarsignificativamente o perfil das emissões brasileiras, elevando a participação de outros setores nas emissões e, idealmente, tornando o hoje grande emissor – uso da terra e florestas – em sumidouro de carbono. Alcançar essa transformação é crucial para viabilizar a meta de zerar emissões até 2050.
Outro desafio a ser enfrentado será a persistência de emissões de metano e óxido nitroso e de CO2 em setores ou atividades de difícil abatimento. Isso tornará necessário viabilizar remoções de CO2 em larga escala não apenas no setor de florestas, mas também em energia. Por isso, além do crescimento das fontes renováveis de energia elétrica e da expansão sustentável da produção e do uso de biocombustíveis, a transição energética deve estar combinada com remoções via BECCS (Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono) e com redução de emissões via CCUS (Captura, Uso e Armazenamento de Carbono).
Além disso, são imprescindíveis medidas no setor agropecuário: a restauração de pastagens degradadas, a expansão dos sistemas integrados lavoura-pecuária-floresta, a disseminação de tecnologias para produção agrícola de baixo carbono e a ampliação dos sistemas de terminação intensiva de bovinos.
Espera-se que, em todos os setores, haja descolamento (“decoupling”) entre crescimento econômico e aumento de emissões.
Para nortear as ações que serão desdobradas nos Planos Setoriais, a ENM estabelece dez diretrizes:
I. Alinhamento aos Compromissos Climáticos Nacionais.
II. Ação climática baseada em evidências científicas.
III. Abordagem integrada intersetorial.
IV. Transição justa e inclusiva.
V. Articulação de ações incrementais e transformacionais, a partir da compreensão das trajetórias de mitigação de longo prazo custo-efetivas e dos riscos relacionados ao clima e seus múltiplos fatores condicionantes.
VI. Desenvolvimento, expansão, aperfeiçoamento e articulação de meios de implementação econômicos, regulatórios, tecnológicos e de formação e capacitação para as transformações.
VII. Participação social ampla na formulação, implementação, monitoramento e avaliação da ENM.
VIII. Integração das transições climática e digital para visão do futuro
IX. Integração com a Estratégia Nacional de Adaptação.
X. Articulação dos Planos Setoriais de Mitigação com outras políticas públicas para gerar cobenefícios.
Há ainda na ENM sete diretrizes voltadas às ações de mitigação dos estados e municípios, buscando, assim, tornar as medidas coerentes nos diferentes níveis federativos.
A ENM é mais uma peça do quebra-cabeça do Plano Clima, que, por sua vez, apesar de abrangente e multissetorial, é parte também de um todo maior e ainda em construção: a governança climática brasileira. Ela deve ser a estrutura de sustentação que garantirá que essa engrenagem siga se ajustando e operando independentemente de contextos político-partidários.