(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
Quando você estiver lendo esse boletim, é possível que os novos presidentes de Câmara e Senado federais já tenham sido eleitos para o biênio 2025/26. Algumas expressões populares poderiam ilustrar o que está prestes a acontecer. Na mesma semana em que se inicia o rápido fevereiro, o deputado Hugo Motta (PB), que tem o apoio de Arthur Lira (PP/AL), não canta vitória antes da hora, mas é certo que a Câmara dos Deputados estará sob nova direção. No Senado, Davi Alcolumbre (UB/AP) pode personificar a expressão a volta dos que não foram, já que pode retornar à presidência da Casa mesmo nunca tendo deixado de ser influente por ali. Para a política climática, as escolhas que o Legislativo fará neste início de fevereiro – que também alcançam as chamadas Mesas Diretoras e, em parte, as Comissões – é crucial para termos um retrato do nível de disposição para levar adiante Projetos de Lei que impactam, positiva ou negativamente, a política climática nacional.
Nunca é demais lembrar que, em agosto de 2024, os presidentes dos Três Poderes celebraram um Pacto pela Transformação Ecológica do Brasil, cujas metas terão de ser encampadas pelos novos líderes, cujos movimentos devem ser acompanhados de perto para evitar que o escasso – e, por isso, precioso – tempo de mandato seja tomado por projetos de lei que vão na contramão do novo compromisso climático (NDC) brasileiro, com jabutis cada vez mais parecidos com dragões.
Atravessando a Praça dos Três Poderes, temos o Supremo Tribunal Federal (STF) e a abertura do Ano Judiciário, na segunda-feira, 3. Luís Roberto Barroso já havia determinado quais seriam os focos do Supremo para 2025, e esperamos que o impasse sobre a validade da Lei do Marco Temporal para demarcação de Terras Indígenas não deixe de ser um deles. Sobre o assunto, vale lembrar que uma Comissão Especial de Conciliação, criada em agosto de 2024, chegou a ter prazo para conclusão dos trabalhos em dezembro do ano passado, o que não aconteceu. O ministro Gilmar Mendes, que a preside, teve de empurrá-la para seguir no primeiro semestre de 2025. Esperamos que uma nova prorrogação não seja necessária para que o Supremo faça valer os direitos indígena e ambiental previstos na Constituição Federal.
E quanto a Lira e Pacheco, o que será deles? Ouviremos falar menos em seus nomes? É pouco provável. Mirando 2026, analistas políticos consideram que o presidente Lula deve embarcá-los na reforma ministerial que está para anunciar. Lira, que tem trajetória ligada ao setor agropecuário, tem possibilidade de assumir o ministério equivalente (MAPA). Pacheco, com um olho no Executivo federal e outro no governo estadual de Minas Gerais em 2027, pode encerrar o período de “dois chapéus” do vice-presidente Alckmin, à frente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Nos dois casos, os ex-presidentes das Casas Congressuais assumiriam a liderança de políticas climáticas importantes ao país, e que ainda precisam deslanchar, sobretudo em um ano de COP no Brasil: Lira, com os Planos ABC+ e Safra; Pacheco, com o Plano Nova Indústria Brasil (NIB) e o programa Mobilidade Verde (Mover), esteios importantes da pretendida transformação econômica do país pelas mãos da Ecologia e da Sustentabilidade. Lira e Pacheco, cujas trajetórias parlamentares certamente não serão lembradas por avanços pró-clima, poderiam dar a volta por cima. O filme governamental já está na metade, mas, se confirmados no Executivo, teriam a chance do plot twist. Valerá o ingresso?
Nesta semana, foi destaque a notícia da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), de que o Brasil alcançou a meta fiscal para 2024, mesmo com déficit de R$ 43 bilhões. O cumprimento da meta foi possível porque, desse montante, foram descontados R$ 32 bilhões de gastos extraordinários necessários pelas enchentes no Rio Grande do Sul e queimadas na Amazônia e no Pantanal. Assim, a diferença entre a receita do governo e as despesas ficou em 0,09% do Produto Interno Bruto (PIB), sendo que a banda da meta fiscal era de +0,25% (superávit) a -0,25% (déficit).
A meta fiscal é importante para sanear as contas governamentais e, com isso, permitir que o Estado tenha melhor capacidade de investimento, previsibilidade e autonomia sobre onde investir. A meta cumprida com a retirada dos gastos necessários por causa de eventos extremos traz um alerta: vivemos uma nova realidade climática em que tanto mitigar emissões buscando fontes limpas e eficiência energética, quanto adaptar a infraestrutura do país a efeitos provocados pelas mudanças do clima são compromissos inadiáveis. E, assim como no orçamento de casa, não dá pra viver torcendo pra nada de errado acontecer se os sinais são claros de que vai acontecer.
Que não apenas governo, mas Legislativo –sob nova velha direção – e Judiciário trabalhem com a ideia de que a conta extraordinária é cada vez mais comum e custará cada vez mais alto para toda a sociedade. E a fatura é mais pesada e com vencimento mais apertado para uns do que para outros. Feliz ano de COP30!, para lembrar que coerência é essencial para quem quer liderar.
Boa leitura!
TÁ LÁ NO GRÁFICO
Minerais estratégicos e minerais críticos são a mesma coisa? Apesar de muitas vezes serem tratados como sinônimos, essas duas categorias têm definições distintas e é importante elaborar políticas com objetivos alinhados às suas peculiaridades. No momento, o Brasil não tem uma política específica para os minerais críticos, necessários para a transição energética e tecnológica no processo de descarbonização da economia. Ainda assim, o Governo Federal tem editado normas de incentivo à mineração desses recursos. No Tá Lá no Gráfico desta semana, entenda as diferenças entre minerais estratégicos e críticos e a importância deles no desenvolvimento do país e na descarbonização.
FRASE DA SEMANA
“O movimento MAGA (Make America Great Again, ou Torne a America Grande Novamente) para mim significa Torne a América Verde Novamente… 90% da nossa energia vem da queima de combustíveis fósseis, quão idiota é isso?“
A frase de Ed Russo, Conselheiro Ambiental do presidente Donald Trump, dita em painel em Davos, repercutiu nesta semana. (Foto: Reprodução).
ABC DO CLIMA
Sociobioeconomia: Modelo produtivo que se baseia na diversidade biológica e cultural de um território, ou seja, é resultado da interação dos fatores e recursos ambientais com o conhecimento e o modo de vida das comunidades tradicionais. A sociobioeconomia promove um impacto positivo nos ecossistemas e contribui para a manutenção da cultura das sociedades humanas que interdependem dos sistemas naturais, assim como ocorre na economia da floresta, realizada pelos povos indígenas na Amazônia.
MONITOR DE ATOS PÚBLICOS
O Monitor de Atos Públicos captou 6 atos relevantes para a política climática na última semana de janeiro. Em uma semana diversa, os temas captados também foram 6. Já as classes mais frequentes foram Planejamento e Regulação, com 3 atos cada.
Terra Indígena Mashco
A Funai, reconhecendo o direito dos povos indígenas às terras que ocupam independentemente da demarcação e os indícios da presença de grupos indígenas isolados, publicou a restrição de ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da Funai na Terra Indígena Mashco do Rio Chandless, localizada nos municípios de Santa Rosa do Purus, Manoel Urbano e Sena Madureira, Estado do Acre.
A primeira RPPN do ano
Nesta semana, o ICMBio publicou a criação da primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN, de 2025. Localizada em Montezuma, em Minas Gerais, a Reserva Serra das Macaúbas adiciona 140 hectares às áreas protegidas do país.
Ministério de Portos e Aeroportos aterrissa no Século XXI
Publicada nesta semana, a Portaria MPOR nº 58/2024, que institui, no âmbito do Ministério de Portos e Aeroportos (MPOR), a Política de Sustentabilidade e o Pacto pela Sustentabilidade. Ela será obrigatória para o ministério e suas entidades vinculadas, sendo facultada e incentivada a adesão pelos agentes privados dos setores portuário, aquaviário, aeroviário e aeroportuário.
A política contém três pilares: de Planejamento e Governança; de Meio Ambiente e Mudança do Clima; e de Responsabilidade Social.
No pilar de Meio Ambiente e Mudança do Clima, as ações objetivam em aumentar a resiliência das infraestruturas de transporte aquaviário, marítimo e aeroviário frente a eventos climáticos extremos; desenvolver capacidades e parcerias institucionais relativas ao licenciamento ambiental e ao enfrentamento da mudança do clima; inserir os aspectos socioambientais e territoriais nos pactos públicos, garantindo a transparência, a participação social e a integração das infraestruturas com os territórios; entre outros.
O Pacto pela Sustentabilidade oferecerá um selo de reconhecimento público aos agentes privados com vistas a incentivá-los a participar da política de maneira formal. A concessão do Selo de Sustentabilidade evolui em quatro níveis: bronze; prata; ouro; e diamante. Para conseguir quaisquer níveis a partir do Prata, ao menos UMA ação de meio ambiente é necessária, e para os níveis ouro e diamante é obrigatório às empresas privadas aderirem ao Programa Brasileiro GHG Protocol.
Além do selo, as empresas participantes do Pacto e com seus relatórios finais aprovados, terão prioridade na habilitação para emissão de debêntures; na análise de projetos utilizando o Fundo da Marinha Mercante e do Fundo Nacional de Aviação Civil; nas interlocuções do MPOR e com outros órgãos do governo federal.
BRASIL
Movimento indígena brasileiro mostra sua força no Pará
Desde o dia 14 de janeiro de 2025, a Secretária de Educação do Pará está sendo ocupada pelo movimento indígena, apoiadores e ativistas, demandando a revogação da Lei nº 10.820/2024, que altera as prerrogativas do sistema de educação presencial responsável nos territórios indígenas. O movimento vem ganhando projeção nacional.
Em Belém, que sediará a COP 30, o movimento indígena demonstra resiliência e capacidade de mobilização, reforçando a relevância de sua participação ativa nos espaços de decisão política. E o governo estadual, que busca fazer da Convenção do Clima uma vitrine internacional, não tem conseguido responder com o mesmo espírito do evento multilateral focado em diálogo e consenso.
Entre os principais afetados pelas mudanças climáticas, os povos indígenas têm reivindicado seus espaços por direito nas políticas locais, nacionais e globais. Não será possível uma COP bem sucedida sem considerar as vozes daqueles que defendem territórios e modos de vida essenciais para o desenvolvimento sustentável do Brasil, com repercussões positivas a todo o planeta.
Demarcação revogada
Em meio ao recesso do STF, a demarcação administrativa da Terra Indígena Toldo Imbú, no estado Santa Catarina, oficializada em dezembro de 2024, foi revogada. O ministro André Mendonça suspendeu o decreto alegando que a demarcação causaria insegurança jurídica, dado que a Tese do Marco Temporal ainda está em disputa. No entanto, o cancelamento atendeu aos pedidos do governo do estado e de outras partes interessadas no processo. O impasse jurídico foi criado depois que a Lei 14.701 instituiu o marco temporal, mesmo depois de o STF ter rejeitado a Tese, em setembro de 2023.
Hoje a questão está na câmara de conciliação, que teve sua legitimidade questionada pelo movimento indígena. Devido à ausência de diálogo e de abertura do governo para a participação igualitária, a representação dos povos indígenas se retirou da instância em agosto, que seguiu com a participação apenas do governo federal e de entidades subnacionais. O encerramento está previsto para 28/02.
MUNDO
Mais três países submetem suas NDCs
Nesta semana, Suíça, Nova Zelândia e Reino Unido submeteram suas NDCs na Plataforma da UNFCCC, somando-se aos cinco países que haviam submetido suas Contribuições Nacionalmente Determinadas em 2024. Merece especial destaque a NDC do Reino Unido, alinhada à meta de 1,5°Cs, como orientado pelo Global Stocktake, e prevendo um corte de 60% de emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) até 2035. Um bom exemplo a ser seguido.
MONITOR DE DESASTRES
O Monitor de Desastres captou 18 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que atingiram 54 municípios. Nesta semana, as Tempestades ultrapassaram os eventos de Estiagem, principalmente concentradas na Região Sudeste e Nordeste do país. Os registros de Estiagem seguem impactando o Nordeste do Brasil, já a Seca foi registrada de maneira pontual.
Nota explicativa: os dados registrados no Monitor de Desastres referem-se única e exclusivamente às situações de emergência ou calamidade pública reconhecidos oficialmente pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil/MDIC nesta semana. Eventualmente, é possível que desastres ocorridos na mesma semana não sejam contabilizados, dado que o reconhecimento do governo federal leva alguns dias para ser publicado.
TALANOA NA MÍDIA
Um Só Planeta | “Há uma oportunidade para os estados fazerem realmente a integração, integração das metas dos caps (limite de emissões), ajudar a determinar qual o teto das atividades econômicas e quanto isso vai reverberar no seu papel para cumprir as metas de descarbonização do país [NDCs]”, disse Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, no lançamento do Anuário Estadual de Mudanças Climáticas. |
Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO