Nem a chegada do segmento de alto nível à Conferência da Biodiversidade (COP16) foi suficiente para destravar as negociações que acontecem em Cali, na Colômbia, desde o dia 21 de outubro. Depois de uma segunda semana marcada pela presença de chefes de Estado, ministros e vice-ministros, a COP16 se encaminhou para o final, nesta sexta-feira (1), sem avanços significativos nos principais temas: o financiamento para a implementação do Marco Global da Biodiversidade de Kunming-Montreal (GBF), a criação de um órgão subsidiário para Povos Indígenas e comunidades tradicionais, além de decisões sobre a repartição de benefícios derivados pelo uso de informações sobre o sequenciamento digital de recursos genéticos (DSI).
Segundo acordado na COP15, em 2022, para garantir os objetivos de conservação estabelecidos no Marco Global, os países desenvolvidos precisariam destinar pelo menos US$ 20 bilhões anuais a partir de 2025, e aumentar gradativamente esse montante para US$ 30 bilhões anuais até 2030. Só que, até o final da COP16, o fundo criado para esse objetivo, que está sob o guarda-chuva institucional do Global Environment Facility (GEF), havia somado menos de U$ 500 milhões. Além da cobrança por mais dinheiro, países em desenvolvimento reivindicaram a criação de outro fundo, alegando que o GEF estaria servido aos interesses dos países desenvolvidos. Até a tarde de sexta-feira, as Partes não haviam chegado a consenso sobre nenhum desses pontos.
Um dos poucos temas que avançaram nas duas semanas de negociações foi o debate sobre o artigo 8j, que se refere à participação dos povos indígenas e das comunidades locais, com os negociadores aprovando um plano de trabalho. No entanto, a criação ou não do órgão subsidiário ainda está pendente.
Fora das salas de negociações, indígenas e comunidades tradicionais realizaram uma série de manifestações pacíficas pedindo maior participação nas tomadas de decisões e lançaram o G9, grupo que representa 511 Povos e luta em defesa da Amazônia, dos Povos Tradicionais, da biodiversidade e do clima global.
Na quarta-feira (30), a indígena Txai Suruí e outros ativistas tiveram sua manifestação contra o Marco Temporal interrompida de forma violenta por seguranças da ONU. Apesar de os ativistas brasileiros terem pedido uma autorização à ONU para o ato, a resposta não chegou a tempo e eles decidiram manter a manifestação. Txai afirmou que seu braço foi puxado com força e seu crachá arrancado pelos policiais. Após momentos tensos, ela foi levada a uma sala de segurança da COP e, pouco tempo depois, com a presença da ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva,Txai foi liberada.
Talvez o único grande avanço até agora na COP16 tenha sido o acordo para a proteção de áreas marinhas internacionais. Depois de 8 anos de negociações, as Partes aprovaram um acordo que tem como objetivo criar uma legislação que facilite a proteção de áreas marinhas de alta importância para a biodiversidade em águas internacionais, ao mesmo tempo em que se respeite o direito dos Estados ao mar, seguindo a Convenção da ONU sobre o Direito ao Mar.
Outra frustração da COP16 foi o avanço na implementação das Estratégia e Planos de Ação Nacionais para a Biodiversidade (NBSAPs, na sigla em inglês). Em 2022, na COP15, as 196 Partes haviam se comprometido a entregar, até esta edição da conferência, suas NBSAPs contendo os principais instrumentos em nível nacional para garantir o cumprimento das decisões do Marco Global. A ideia era que, com os documentos em mãos, os negociadores poderiam avançar nas discussões sobre a implementação das metas.
No entanto, até o início da conferência, só 35 países haviam cumprido com o prazo – e durante as duas semanas de negociações, outras 4 nações submeteram suas NBSAPs. O Brasil, país mais biodiverso do mundo, afirmou que só terá o documento pronto no final deste ano ou no início do ano que vem. Mais uma vez, a principal alegação das nações em desenvolvimento para justificar o atraso foi a falta de recursos para desenhar estratégias que sejam implementáveis.
A próxima COP da Biodiversidade será na Armênia, que superou seu vizinho Azerbaijão nas pretensões de realizar a próxima conferência. No Azerbaijão, ocorrerá neste mês, a COP 29 da Convenção do Clima, em Baku.