O dia 2 de julho foi histórico para a agenda climática no Brasil. Foi proferida uma das mais aguardadas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da ADPF 708. Por maioria, o STF reconheceu que a União manteve o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (Fundo Clima) inoperante durante os anos de 2019 e 2020, deixando de destinar vultosos recursos para o enfrentamento das mudanças climáticas. O Fundo Clima, criado pela Lei Federal 12.114/2009 e vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), tem como finalidade “assegurar recursos para apoio a projetos ou estudos e financiamento de empreendimentos que visem à mitigação da mudança do clima e à adaptação à mudança do clima e aos seus efeitos” (art. 2º da Lei Federal 12.114/2009). A ADPF 708 é considerada uma ação paradigmática, uma vez que é a primeira a tramitar no STF que tem como ponto central a questão das mudanças climáticas. 1. A ação judicial   Tipo Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Número 708 Relator Ministro Luís Roberto Barroso Data do protocolo 30/06/2020 Requerentes Partido Socialista Brasileiro (PSB) Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) Partido dos Trabalhadores (PT) Rede Sustentabilidade (Rede) Requerida União Amici Curiae (terceiros interessados) Observatório do Clima Instituto Alana Frente Nacional de Prefeitos Conectas Direitos Humanos ABRAMPA Objeto Reconhecimento da omissão inconstitucional da UNIÃO ao não adotar providências de índole administrativa objetivando o funcionamento do “FUNDO CLIMA”. Pedidos Medida Cautelar: determinando que a UNIÃO tome as medidas administrativas necessárias para reativar o funcionamento do FUNDO CLIMA com todos os recursos autorizados pela lei orçamentária (abrangidas as modalidades não reembolsável e reembolsável de atuação do Fundo). Determinar à UNIÃO, através do MMA, que apresente em até 30 (trinta) dias o Plano Anual de Aplicação de Recursos do FUNDO CLIMA para o ano de 2020, e se abstenha de não elaborar os Planos subsequentes, relativos aos anos de 2021 e 2022. Determinar à UNIÃO que se abstenha de contingenciar novamente recursos do FUNDO CLIMA nos próximos orçamentos a serem apresentados. Mérito: Sejam confirmadas as medidas cautelares pleiteadas, nas suas integralidades, e declarada a inconstitucionalidade do comportamento omissivo lesivo do Poder Público em não dar andamento ao funcionamento sistemático do FUNDO CLIMA. Andamento relevante Realização de audiências públicas (21 e 22 de setembro de 2020)   2. Julgamento virtual Após as audiências públicas realizadas em setembro de 2020, houve pouco andamento na ação. Em 13 de junho deste ano, o processo foi incluído na pauta de julgamento virtual para o período de 24 de junho a 01 de julho. Importante destacar que as audiências tiveram uma grande repercussão na mídia. A ação teve o efeito de fazer pressão ao Ministro do Meio Ambiente à época, Ricardo Salles. E deu certo. No mês seguinte do ajuizamento e decisão de convocação da audiência pública, Salles reconvocou o Comitê Gestor do Fundo Clima, após mais de 18 meses inativo, e retomou os aportes dos recursos autorizados nas leis orçamentárias de 2019 e 2020, por transferências ao BNDES. Assim, houve a apresentação de sustentação oral pelos Requerentes, pela Requerida e pelos amici curiae Observatório do Clima e Instituto Alana. O julgamento virtual teve como resultado final: Votos pela procedência da ação Voto pela improcedência da ação Luís Roberto Barroso Cármen Lúcia Dias Toffoli Alexandre de Moraes Rosa Weber Ricardo Lewandowski Luiz Fux Gilmar Mendes André Mendonça Edson Fachin (único a apresentar ressalvas – pontos adicionais – ao voto do relator) Nunes Marques   Como principais entendimentos trazidos no voto do relator ministro Luís Roberto Barroso, tem-se: Situação brasileira: “(…) o país caminha, em verdade, no sentido contrário aos compromissos assumidos e à mitigação das mudanças climáticas, e que a situação se agravou substancialmente nos últimos anos”; “(…) os dados objetivos trazidos acima evidenciam uma situação de colapso nas políticas públicas de combate às mudanças climáticas, sem dúvida alguma agravada pela omissão do Executivo atual”. Mudanças climáticas na Constituição Federal: “Ao contrário do que alegam a Presidência da República e a Advocacia-Geral da União, a questão pertinente às mudanças climáticas constitui matéria constitucional”. Tratados internacionais e direitos humanos: “(…) a Constituição reconhece o caráter supralegal dos tratados internacionais sobre direitos humanos de que o Brasil faz parte, nos termos do seu art. 5º, § 2º. E não há dúvida de que a matéria ambiental se enquadra na hipótese. Como bem lembrado pela representante do PNUMA no Brasil, durante a audiência pública: “Não existem direitos humanos em um planeta morto ou doente” (p. 171). Tratados sobre direito ambiental constituem espécie do gênero tratados de direitos humanos e desfrutam, por essa razão, de status supranacional. Assim, não há uma opção juridicamente válida no sentido de simplesmente omitir-se no combate às mudanças climáticas.” Inércia pela tentativa de alteração de colegiado: “(…) o Fundo Clima realmente permaneceu inoperante durante todo o ano de 2019 e parte do ano de 2020 . Segundo “Avaliação da Política Nacional sobre Mudança do Clima”, da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal, tal inoperância se deveu à falta de nomeação do Comitê Gestor do Fundo porque o Executivo pretendia, antes de dar destinação aos recursos, alterar a sua composição. Segundo o mesmo documento: a “nova composição do Comitê privilegia a representação e a participação do setor privado em detrimento da participação da sociedade civil organizada, ao contrário da antiga composição”; “A providência não é estranha ao STF e se insere no mesmo contexto de extinção e/ou alteração de múltiplos órgãos colegiados da Administração Pública, por meio das quais se pretendeu suprimir ou reduzir a participação da sociedade civil e de experts em tais órgãos e assegurar o controle do governo sobre as decisões e as informações pertinentes ao setor.” “De fato, o Decreto 10.143, de 28.11.2019, alterou as regras de composição do Fundo Clima. E a Portaria MMA nº 113, de 16.03.2020, do Ministério do Meio Ambiente, nomeou os novos integrantes do Conselho. Constata-se, portanto, que o Fundo esteve inoperante, por decisão deliberada da União em mantê-lo inoperante.” Pressa após propositura da ação: “O que fica evidente, a partir da análise dos