Na Semana Mundial do Meio Ambiente, a Transparência Brasil e a Política Por Inteiro trazem um apanhado dos atos políticos formais e informais que ilustram a má gestão pública e a falta de transparência na área ambiental do país, tanto em nível nacional quanto subnacional. Ambas as organizações fazem exercícios em prol da transparência pública e, nessa atividade, identificam gargalos de acesso a informações – inclusive básicas – sobre a área ambiental. Nem sempre dados, matérias legislativas e decretos do Executivo estão disponíveis para acesso público, gratuito e atualizado como deveriam. Desde 2019, a Política por Inteiro monitora diariamente os atos do governo federal relacionados à agenda ambiental, classificando e analisando os sinais políticos publicados no Diário Oficial da União. Em 2021, a iniciativa aprofundou o esforço de análise de políticas públicas para o nível subnacional e lançou o projeto Foco Amazônia, que realiza trabalho semelhante voltado aos poderes Executivo e Legislativo dos estados da Amazônia Legal. A Transparência Brasil, com o projeto Achados e Pedidos, debruça-se desde 2020 sobre a disponibilidade de informações sobre políticas públicas socioambientais e busca obter outras que não estão disponíveis ativamente, para contribuir com o trabalho de organizações voltadas ao tema e ampliar a transparência. “As ações listadas e a opacidade impactam de forma desastrosa a preservação dos recursos naturais no país, cujas consequências são transversais para todo o desenvolvimento do país, envolvendo saúde, qualidade de vida, infraestrutura e saneamento”, avalia Ester Athanásio, analista do Foco Amazônia. Nível nacional Em nível nacional, destacam-se sete grandes ações de comprometimento de políticas socioambientais, resumidas a partir de 157 atos formais e informais do governo federal, além de ocorrências de falta de transparência de 2019 a 2022. As informações foram extraídas das linhas do tempo temáticas da Política por Inteiro e das publicações do Achados e Pedidos. 1. Desmonte do Ibama e do ICMBio Dois dos principais órgãos de fiscalização e implementação de políticas ambientais sofreram ataques constantes por parte do governo federal ao longo do período, além de cortes orçamentários (que são listados à parte). Em fevereiro de 2019, o então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles exonerou 21 dos 27 superintendentes regionais do Ibama. Em junho e setembro, nomeou superintendentes sem qualificações técnicas ao cargo; em abril de 2020, repetiu o movimento, ampliando a presença de servidores com origens militares. Mesmo após a saída de Salles, a militarização se manteve: levantamento do Achados e Pedidos divulgado em abril de 2022 contabilizou 11 ocupantes de cargos de direção e assessoramento com origem militar no órgão. Em abril de 2020, depois de o Ibama realizar uma operação contra garimpos ilegais, Salles trocou seu diretor de proteção ambiental. Quase um ano depois, em março de 2021, o então ministro nomeou uma advogada que atua na defesa de infratores ambientais para chefiar a superintendência do Ibama no Acre. O Ibama cortou suas ações de fiscalização: em setembro de 2019, havia reduzido 22% das operações previstas no Plano Anual de Proteção Ambiental. Ao final daquele ano, havia aplicado o menor número de multas em 15 anos. Em junho de 2020, reduziu a aplicação de termos de embargo em 60%, em comparação ao mesmo período do ano anterior. Em agosto de 2020, o órgão registrava o menor contingente de fiscais desde 1989. Servidores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) pediram demissão em massa após Ricardo Salles ameaçar processar administrativamente servidores por estarem ausentes em evento no Rio Grande do Sul. A presença de militares em cargos de direção e assessoramento do órgão também é significativa: 16 postos são ocupados por pessoas com histórico militar. 2. Cortes orçamentários em órgãos de políticas ambientais Ao longo do período, houve cortes e bloqueios sucessivos de recursos para o próprio Ministério do Meio Ambiente (MMA) e para programas ambientais. Em 2019, o Ministério do Meio Ambiente fez cortes no Ibama e no ICMBio. O total do orçamento deste último foi reduzido em 26%, o que afetou o Programa de Gestão das Unidades de Conservação Federais em um total de R$ 45 milhões. O Ibama teve uma redução de 24% de seu orçamento. Para o ano seguinte, os dois órgãos tiveram seus orçamentos para fiscalização ambiental reduzidos em mais de R$ 100 milhões. Em outubro de 2020, o Ibama suspendeu o combate a incêndios no país por ‘exaustão de recursos’. Contingenciamento de recursos impõe corte de 95% à Política Nacional sobre Mudança do Clima. Em 2021, o orçamento de órgãos federais responsáveis pela execução de políticas ambientais como monitoramento, fiscalização e combate ao desmatamento e incêndios florestais sofreram cortes de até 46% em relação ao orçamento do ano passado, chegando ao menor patamar dos últimos cinco anos. O orçamento do Ministério do Meio Ambiente para o ano é o menor do século XXI. Os dados orçamentários, embora públicos, só são acessíveis a especialistas. 3. Desqualificação ou distorção de dados sobre degradação ambiental Em ao menos 10 ocasiões, autoridades federais desqualificaram ou distorceram dados sobre desmatamento, incêndios e outras formas de degradação ambiental. 2019 O presidente Jair Bolsonaro criticou alertas de desmatamento produzidos pelo INPE (que mostraram os maiores índices dos últimos 10 anos). O então diretor do órgão, Ricardo Galvão, foi exonerado após defender o trabalho da instituição. Ricardo Salles afirmou que o desmatamento relativo na Amazônia é zero, contrariando dados que demonstravam a maior taxa de devastação da floresta em uma década. 2020 Em reunião do Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL), o vice-presidente Hamilton Mourão contrariou dados do Inpe e afirmou que o desmatamento na Amazônia caiu. Em agosto, Mourão afirmou que a floresta não estava pegando fogo e que eram áreas humanizadas que sofriam com as queimadas. No mês seguinte, o vice-presidente e o então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles publicaram em suas redes sociais vídeo produzido por associação de pecuaristas com o título ‘A Amazônia não está queimando’, contrariando dados do Inpe que mostravam o maior número de queimadas na