Nesta semana, o Monitor de Atos Públicos captou 12 normas relevantes. Novamente, o tema Desastres foi o mais recorrente (6). A classe com mais ocorrências foi Resposta (7), a maior parte referente aos atos de reconhecimento de situação de emergência nos municípios afetados por eventos climáticos e meteorológicos extremos. A semana correu sob a expectativa de divulgação do que saiu da primeira reunião do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e Crescimento Verde (CIMV), que se reuniu na quarta-feira (23). Sabe-se que esteve na pauta a aprovação do texto da atualização da NDC, conforme anúncio realizado pelo governo brasileiro na COP26, em Glasgow; a criação grupo técnico para subsidiar a implantação dos mecanismos técnicos para a implantação do Artigo 6º do Acordo de Paris; e a aprovação da Minuta de Projeto de Lei para a atualização da Política Nacional de Mudança do Clima, que esteve em consulta pública entre novembro e dezembro. Porém, o único documento público emitido após a reunião foi a PORTARIA MMA Nº 47, DE 23 DE FEVEREIRO DE 2022, que designou os membros titulares e suplentes da Comissão Técnica do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e Crescimento Verde. A POLÍTICA POR INTEIRO solicitou via Lei de Acesso à Informação (LAI) acesso à ata da reunião e à agenda dos próximos encontros. Recebeu resposta apontando que as reuniões do CIMV tem “caráter reservado”, segundo regimento interno, e que as informações públicas disponíveis estão no site do comitê. Nessa página, não há agenda calendário de encontros, nem pauta. A última ata publicada é de outubro de 2021, quando o órgão se chamava ainda somente Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM). O CIM ganhou “Crescimento Verde” e perdeu transparência. É possível implementar política climática sem participação? Terrenos de marinha e mudanças climáticasA Câmara dos Deputados aprovou a PEC 39, que propõe a extinção do “instituto jurídico do terreno de marinha e seus acrescidos” e transfere a propriedade de parte desses imóveis para estados, municípios e os atuais ocupantes. Os terrenos de marinha são áreas na zona costeira e em margens de rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés (manguezais, apicuns), além de contornos de ilhas costeiras e oceânicas. No blog da Política Por Inteiro, mostramos por que essa PEC pode provocar uma “grilagem marinha” em áreas que são estrategicamente aliadas para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Além dessa PEC, a Câmara aprovou o PL 442/91, que regulariza jogos de azar. Os dois projetos, se forem para frente, podem levar a uma corrida pela construção de grandes áreas à beira mar, inclusive de clubes e resorts para hospedar cassinos. As duas propostas seguem para o Senado. Mais prazo para barragens perigosasMineradoras de Minas Gerais firmaram acordo com autoridades estaduais e federais (dentre eles Ministério Público Federal e a Fundação Estadual do Meio Ambiente – FEAM) para prorrogar o prazo para extinção das barragens de mineração construídas no método conhecido como “a montante”. Ele vencia nesta sexta-feira (25). Eram desse tipo as estruturas que ocasionaram os desastres de Mariana e Brumadinho, ambas em MG. Nos dois casos, a Vale estava envolvida (seja como operadora direta do empreendimento ou como acionista). Por falar na empresa, ela divulgou o maior lucro histórico de uma empresa aberta no Brasil (R$121 bilhões no ano de 2021). Mineração em terras indígenasFoi lançado nesta semana o relatório “Cumplicidade na destruição IV — Como mineradoras e investidores internacionais contribuem para a violação dos direitos indígenas e ameaçam o futuro da Amazônia”, elaborado pela parceria entre a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Amazon Watch. Segundo site da iniciativa, as “16 maiores mineradoras do mundo emitem cerca de 2.5 bilhões de toneladas de equivalente de carbono por ano” e em “2021 a mineração devastou 125 km², a maior marca desde o início da série histórica do Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe)”. Guerra na Ucrânia e indústria de fertilizantesA bancada ruralista expressou preocupação de que a guerra entre Rússia e Ucrânia afete negativamente a importação de cloreto de potássio (importante insumo para produção de fertilizantes) para o setor agrícola brasileiro. Antes mesmo do conflito, foi noticiado que o governo federal preparava um Plano Nacional de Fertilizantes visando uma maior autonomia nacional. No entanto, importante destacar que no relatório “Cumplicidade na destruição IV”, mineradora do setor é apontada como potencialmente impactante às terras indígenas e ao meio ambiente (áreas das Terras Indígenas Jauary e Paracuhuba e contaminação de fontes de água essenciais para a vida das comunidades). Segundo site da iniciativa, um projeto está “previsto para ser instalado no município de Autazes, a 110 km de Manaus (AM), prevê extrair 770 milhões de toneladas de potássio”. Sinais do MonitorO Monitor de Atos Públicos tem detectado sinais relevantes de flexibilizações no setor, como reportamos no último boletim semanal, seja para a mineração industrial, seja para o garimpo. No caso do garimpo, as normas se somam aos constantes discursos de incentivo à atividade. Os sinais que vêm do Executivo federal se retroalimentam nos poderes locais. Assim, ocorrem situações como as narradas nesta reportagem de O Globo: “Demos mais de 500 licenças e nunca fomos fiscalizar”, diz prefeito da cidade campeã em autorizações de garimpo de ouro no Brasil. 33 anos de existência e resistênciaO IBAMA completou, nesta semana, 33 anos de existência com uma celebração marcada por protesto dos servidores em frente à sede do órgão, em Brasília, e em outras cidades. SINAIS NO TWITTEROs temas mais discutidos no monitoramento que realizamos no Twitter, em parceria com a Folha de S.Paulo, de autoridades e políticos relacionados a clima e meio ambiente, foram Energia, Amazônia e Indígena. O assunto mais comentado foi a aprovação, pelos acionistas, da privatização da Eletrobras. Houve muitas mensagens pedindo que a assembleia geral anulasse a desestatização. Legislativo Destaques da semana SENADO FEDERAL CÂMARA DOS DEPUTADOS Sem movimentações relevantes na semana. Foi aprovado substitutivo do deputado Alceu Moreira (MDB/RS) à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 39/11, a qual visa
Terrenos de marinha: o que têm a ver com as mudanças climáticas
Nesta semana, a Câmara dos Deputados aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 39, que propõe a extinção do “instituto jurídico do terreno de marinha e seus acrescidos” e sobre a propriedade desses imóveis. Hoje, essas áreas são da União e quem as utiliza paga taxas por isso. Pela proposta, a propriedade de parte desses imóveis iria para estados, municípios e os atuais ocupantes. Para entender do que se trata, precisamos remeter ao Decreto-Lei 9.760/1946 que definiu o que são os terrenos de marinha: “São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831: os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés e os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés” e ainda “para os efeitos deste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano” e os terrenos acrescidos de marinha correspondem àqueles que tiverem sido formados, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha. Ou seja, estamos falando de todas as áreas situadas na zona costeira, margens de rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés – manguezais, apicuns, além daqueles que contornam ilhas costeiras e oceânicas. Lembre-se: a extensão de linha de costa do Brasil é de mais de 10 mil km, contando com as reentrâncias. E os ecossistemas costeiros e marinhos atuam como um verdadeiro sistema de defesa natural na luta contra as mudanças climáticas. Dessa forma, o que parece ser complexo e apenas tentar modernizar um instituto jurídico antigo esconde uma verdadeira grilagem marinha em áreas que são estrategicamente aliadas para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas e redução da vulnerabilidade da zona costeira frente a eventos extremos e aumento do nível do mar. A aprovação da PEC que acaba com os terrenos de marinha ocorreu na mesma semana em que foi aprovada também na Câmara o PL 442/91, que regulariza jogos de azar no Brasil. As duas propostas seguem para análise no Senado. O governo afirma que vai vetar o PL dos jogos de azar. Porém, o sinal dado com essas duas aprovações nesta semana pode provocar uma verdadeira corrida pela a construção de grandes áreas à beira mar, inclusive de clubes e resorts para hospedar cassinos.