Transição energética. Justa para quem?

Complexo Jorge Lacerda. Foto: Miriam Zomer/ALESC/Divulgação


Desinvestimento. Esse é um termo cada vez mais frequente quando se discutem estratégias para acelerar a transição para uma economia verde. Isto é, retirar capital de atividades ligadas à energia fóssil. Mas esse vocabulário parece não ter chegado aos legisladores, ao governo federal e alguns setores da economia brasileira. Foi publicada nesta semana a Lei 14.299, que institui subvenção econômica às concessionárias do serviço público de distribuição de energia elétrica de pequeno porte e cria o Programa de Transição Energética Justa (TEJ) para a região carbonífera de Santa Catarina.

A lei sancionada sem vetos é fruto do PL 712/2019, no qual o Programa de Transição Energética Justa (TEJ) foi acrescido à ementa original, sem discussão e cálculo de impacto.

Com a modificação, o PL voltou ao Senado onde foi aprovado.

O Programa prevê que o Governo Federal deverá contratar a energia elétrica gerada pelo Complexo Termelétrico Jorge Lacerda (CTJL), na modalidade de Energia de Reserva. De acordo com o texto, a obrigação de contratação das térmicas a carvão tem como finalidade preparar a região carbonífera para o “provável encerramento”, até 2040, da atividade sem abatimento da emissão de CO² gerada pela atividade de geração de energia mais poluidora do mundo. Dessa forma, o governo federal deverá prorrogar a autorização do CTJL por mais 15 anos, a partir de 2025.

Há cerca de um ano, quando a empresa francesa Engie buscava alinhar seu portfólio global a uma diretriz de negócio focada em energias renováveis, a companhia cogitava fechar a planta de Jorge Lacerda caso não conseguisse se desfazer do ativo. Conseguiu. A usina foi vendida para a gestora Fram Capital. Agora, com a nova lei, o horizonte de operação se alongou consideravelmente.

Usinas de Capacidade de Reserva têm prioridade nos leilões, quando disponibilizam energia para o Sistema Interligado Nacional. Dessa forma, a energia que seria pouco competitiva entrará automaticamente na conta dos consumidores. A nova lei estabelece, além da garantia de compra, a cobertura dos custos de operação das minas de carvão, priorizando o Estado de Santa Catarina, que deverá representar 80% da energia termoelétrica contratada. Esse custo foi estimado pela Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) em cerca de R$ 840 milhões por ano e servirá de incentivo para a prorrogação das usinas movidas a carvão.

O que não foi calculado é o impacto de mais 15 anos de termelétricas nas emissões de gases do efeito estufa (GEE) nacionais e o quanto o país se distancia do cenário de descarbonização e do compromisso de eliminar essa fonte de energia, completamente até 2040, assumido em Glasgow, na COP 26, no ano passado. Enquanto o mundo entra no phase out do carvão, caminhamos para o phase in financiado por dinheiro público.

Equipe Editorial (Liuca Yonaha, Marta Salomon, Melissa Aragão, Ester Athanásio, Marco Vergotti, Renato Tanigawa, Taciana Stec, Wendell Andrade, Daniel Porcel, Caio Victor Vieira, Beatriz Calmon, Rayandra Araújo e Daniela Swiatek).

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