No dia 21 de setembro de 2021, ocorreu a abertura da 76ª Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova Iorque, na qual, pela terceira vez, a abertura dos pronunciamentos foi do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, seguindo a tradição que vem desde 1947. O discurso, que pode ser conferido na íntegra aqui, foi marcado por afirmações ideológicas e duvidosas, incluindo a manipulação dos dados citados. A fala sintetiza um país paralelo que só existe para o presidente, para ele vivemos em um Brasil onde os povos indígenas vivem em paz, a democracia foi o mote das manifestações de Sete de Setembro e o país recuperou credibilidade externa”. Na agenda de clima, Jair Bolsonaro não se manifestou em relação ao senso de urgência decorrente do último relatório do IPCC, tampouco assumiu as responsabilidades do Brasil diante do atual cenário da crise climática. Conforme apontado por Natalie Unterstell, coordenadora da Política Por Inteiro e presidente do Instituto Talanoa, “são três as grandes cobranças em relação ao nosso país: credibilidade, ambição e visão”. Fora da seara ambiental, Bolsonaro defendeu “a autonomia do médico na busca do tratamento precoce”, pontuando não entender o “porquê de muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se colocaram contra o tratamento inicial”, afirmando que a “história e a ciência saberão responsabilizar a todos”. Contrariando todas as recomendações da OMS e jogando na lama o passado de sucesso das estratégias de imunização do país, destacou que o governo é “contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada à vacina“. Afirmou ainda, provavelmente num ato falho, que pagou auxílio-emergencial de US$ 800,00 (oitocentos dólares) para 68 milhões de brasileiros em 2020. Por fim, utilizou-se de apontamentos preconceituosos que segmentam e privilegiam grupos sociais específicos ao afirmar que “temos a família tradicional como fundamento da civilização” e que concederá “visto humanitário para cristãos, mulheres, crianças e juízes afegãos”. A fim de avaliar o discurso de Bolsonaro pelo viés socioambiental e climático, a Política Por Inteiro elaborou indicadores para cinco grandes tópicos: “Metas de redução de emissões”, “Mudança do Clima”, “Biodiversidade”, “Democracia e direitos” e “Financiamento”. Cada indicador recebeu uma classificação, podendo ser considerado bom, razoável, neutro, ruim ou péssimo, de acordo com o que foi dito sobre o tema. A pontuação final foi – 11, configurando um péssimo discurso, representado na tabela abaixo e justificado na sequência. Tópico: Metas de redução de emissões Indicador: Reforça compromisso imediato/Implementação da NDCClassificação POLÍTICA POR INTEIRO: PéssimoJustificativa: Não apresenta visão de neutralidade climática e desmatamento zero para 2030, assim como não menciona a estratégia de implementação da NDC. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: “Antecipamos, de 2060 para 2050, o objetivo de alcançar a neutralidade climática. Os recursos humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais, foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal. E os resultados desta importante ação já começaram a aparecer!” Indicador: Desmatamento ilegal zero até 2030Classificação POLÍTICA POR INTEIRO: PéssimoJustificativa: Aponta que o desmatamento zero será atingido em 2050 e usa os dados de forma distorcida para confirmar a queda do desmatamento na Amazônia Legal. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: “Antecipamos, de 2060 para 2050, o objetivo de alcançar a neutralidade climática. Os recursos humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais, foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal. E os resultados desta importante ação já começaram a aparecer!” “Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior.” Tópico: Mudança do Clima Indicador: Adaptação e resiliênciaClassificação POLÍTICA POR INTEIRO: PéssimoJustificativa: Não considera medidas de adaptação à mudança do clima na sua fala, dá a entender que o Brasil está suficientemente adaptado e resiliente. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: “Como reflexo, menor consumo de combustíveis fósseis e redução do custo Brasil, em especial no barateamento da produção de alimentos.” “Nossa moderna e sustentável agricultura de baixo carbono alimenta mais de 1 bilhão de pessoas no mundo e utiliza apenas 8% do território nacional.” “O futuro do emprego verde está no Brasil: energia renovável, agricultura sustentável, indústria de baixa emissão, saneamento básico, tratamento de resíduos e turismo.” Indicador: Transição energética e descarbonização da matrizClassificação POLÍTICA POR INTEIRO: NeutroJustificativa: Apresenta a priorização das ferrovias como meio de reduzir as emissões e a dependência de combustíveis fósseis. Apesar do modal ferroviário ter potencial de redução de emissões, a construção inadequada das ferrovias gera significativo impacto ambiental. A participação da energia renovável na matriz brasileira vem caindo significativamente diante da crise hídrica e do acionamento das termelétricas. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: “Já são mais de US$ 6 bilhões em contratos privados para novas ferrovias. Introduzimos o sistema de autorizações ferroviárias, o que aproxima nosso modelo ao americano. Em poucos dias, recebemos 14 requerimentos de autorizações para novas ferrovias com quase US$ 15 bilhões de investimentos privados.Em nosso governo promovemos o ressurgimento do modal ferroviário. Como reflexo, menor consumo de combustíveis fósseis e redução do custo Brasil, em especial no barateamento da produção de alimentos.” “O Brasil já é um exemplo na geração de energia com 83% advinda de fontes renováveis.” “O futuro do emprego verde está no Brasil: energia renovável, agricultura sustentável, indústria de baixa emissão, saneamento básico, tratamento de resíduos e turismo.” Indicador: Considera o senso de urgência referente ao Relatório do IPCCClassificação POLÍTICA POR INTEIRO: PéssimoJustificativa: Mesmo após a divulgação do último relatório do IPCC, comentado inclusive por Guterres em sua fala, o Presidente sequer menciona urgência alguma e seu tom é de que o que fazemos já é o suficiente. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: Não há. Indicador: Apresenta ações de neutralidade para 2050Classificação POLÍTICA POR INTEIRO: RuimJustificativa: fala em net zero em 2050 mas não apresenta ações, e cita dados de redução de desmatamento controversos. Falas de Bolsonaro relacionadas ao Indicador: “Antecipamos, de 2060 para 2050, o objetivo de alcançar a neutralidade climática. Os recursos humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais, foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal.