Na terça-feira, dia 6 de julho, ocorreu mais um debate online Conjunturas & Riscos: Política Climática por Inteiro. O tema desta vez foi o assunto que dominou atos públicos e movimentação política no mês de junho e que está quente nos noticiários: a Desestatização e o Setor Elétrico. Com a mediação de Vanessa Barbosa, jornalista, pesquisadora ambiental e editora-assistente do Um Só Planeta, a discussão contou com a participação de especialistas no assunto. A ex-presidente do Conselho de Administração da Eletrobras, a economista e advogada Elena Landau, debateu sobre a recente aprovação no Congresso da Medida Provisória que viabiliza a privatização da estatal com a fundadora da Escopo Energia e conselheira de Administração da Light e da Açu Petróleo, Lavinia Hollanda; e com mestre em física pela USP, especialista em mudanças climáticas e energia Shigueo Watanabe. Logo na abertura, Natalie Unterstell, da Política Por Inteiro, destacou que a energia é um dos temas mais relevantes para o clima, pois influencia diretamente nas questões de carbonização. Vanessa provocou os debatedores sobre a forma como o assunto foi pautado, sem ampla discussão e em meio à pandemia. Importante lembrar que uma medida provisória (MP) é proposta pelo Presidente da República, debatida em um tempo mais curto, não permite participação popular — que é um dos pontos mais criticados. Outra questão é a inclusão dos chamados “jabutis” — apêndices legais inseridos em um projeto de lei que escapam ao tema principal. Um deles diz respeito à obrigatoriedade de investimentos da nova Eletrobras em termelétricas, na geração de energia elétrica por meio de gás natural em regiões como Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste do país, que não são ricas em gás, nem sequer possuem gasodutos suficientes. Elena foi enfática: “Minha oposição foi pública quanto à discussão e aprovação por MP”. Para ela, o erro começa com o próprio Projeto de Lei, feito na época do Governo Temer, em 2018. A base da MP apresentada por Bolsonaro é o projeto de Temer e já nasceu cheio de “jabutis”, com agrados específicos. “Houve um desvirtuamento completo do projeto, acho até inconstitucional”, completou. Lavinia concordou com Elena e reforçou: “O processo todo foi equivocado. A que custo vamos fazer esta desestatização?” Não há um estudo profundo, segundo ela. Corroborando com o posicionamento das colegas, Shigueo completou: “Da maneira como estes ‘jabutis’ entraram, me parece que revogaram a lei de oferta e mercado”. Para ele, a maior vítima está sendo o planejamento energético, que até então era orgulho para o Brasil. Os “jabutis” incluídos pelos parlamentares incorporaram mais do que a desestatização da empresa. Eles impactaram no planejamento, na regulação, além de causar desdobramentos do ponto de vista climático. Os especialistas não conseguiram destacar nenhum ponto positivo na MP da Desestatização da Eletrobras. Lavinia resumiu: “Todo este processo teve o agravante da crise hídrica. E acho que os jabutis têm muito a ver com isso. Soluções simples e erradas para problemas complexos”. Por outro lado, o controle privado no setor de energia foi visto de forma positiva. O mundo vive um processo de transição para energias de baixo carbono e as empresas privadas estão nesse caminho. “Há uma lenda urbana de que só o setor público investe em tecnologia, o que não é verdade”, disse Elena. Lavinia acrescentou que “a pressão que os investidores estão sofrendo é imensa, com as agendas ESG (Environmental, Social, and Governance). Este é um grande motor para incentivar a inovação no setor privado”. Há outros pontos preocupantes na MP da Eletrobras. Segundo Shigueo, se aumentar de 6 mil para 8 mil megawatts o total de energia das térmicas a ser contratada pelo Governo, as emissões do setor elétrico aumentarão em torno de 40%. “A geração a biomassa entra como reserva de mercado, mas no momento da crise hídrica é delicado, pois há grande consumo de água para este tipo de recurso”, complementou. Falando em crise hídrica, Vanessa comentou que registramos o mais baixo volume de chuvas dos últimos 90 anos e questionou os especialistas sobre o que a desestatização da Eletrobras representa como desafios e oportunidades neste sentido. “Não temos uma crise de demanda, mas sim uma crise de potência no setor hídrico”, comentou Elena. Para ela, o consumidor não sabe como administrar a sua conta de luz, não entende como funciona. Sobre a administração da água, Elena citou que o controle, previsto na MP do Racionamento (MP 1055), é fundamental. “Nesse momento que é preciso segurar água no reservatório, é preciso ter um órgão que controle — como o criado pela MP da crise hídrica. Mas, não se pode atropelar as agências do setor”, concluiu. A medida provisória criou a CREG (Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética), um comitê interministerial presidido pelo Ministério de Minas e Energia. Porém, as agências reguladoras, incluindo Agência Nacional das Águas (ANA) e Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), além de órgãos como Ibama, Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Operador Nacional Do Sistema Eletrico (ONS) — que fazem parte da governança dos reservatórios e do setor setor elétrico — não estão participando desse comitê. Shigueo foi ao encontro da opinião de Elena e acrescentou: “É preciso incorporar os modelos climáticos para ter uma visão de longo prazo e traçar as crises”. Por fim, antes de encerrar, Vanessa falou da expectativa do Governo em concluir a desestatização até fevereiro de 2022, mesmo com todas as etapas previstas para a aprovação. O presidente precisa sancionar a MP aprova no Congresso até 12 de julho. Sobre a possibilidade sanção com vetos, Elena foi enfática: “Não há a menor possibilidade de Bolsonaro vetar tudo (jabutis). Ele negociou isso. Talvez tire o preço teto dos leilões de térmicas”. E completou: “Acho que a oposição e os funcionários nem começaram a se mexer”. Lavinia concordou e trouxe outro ponto importante, também comentado por Shigueo: “Ano que vem é um ano eleitoral. Há a possibilidade de sair a privatização no tempo previsto, mas à medida que o tempo passa se torna mais difícil”. O debate online Conjunturas & Riscos é