A POLÍTICA POR INTEIRO teve acesso à pauta da próxima reunião da Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio), que será realizada nesta quinta-feira (17), pela primeira vez desde que foi extinta pelo Decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019.
A Conabio é uma das principais comissões de meio ambiente, criada em 1994 com o objetivo principal de promover a implementação dos compromissos assumidos pelo Brasil junto à Convenção sobre Diversidade Biológica.
O decreto da nova Conabio, publicado em 2020 (Decreto nº 10.235, de 11 de fevereiro de 2020), mudou o caráter deliberativo da Comissão para apenas consultivo, reduziu competências sobre as “áreas e ações prioritárias para a conservação da biodiversidade”, diminuiu o número de entidades representadas, alterando a paridade entre governo e sociedade civil como veremos nos quadros abaixo.
O que chama a atenção é que essa reunião, chamada para esta quinta-feira (17), avaliará um novo regimento da Comissão e avaliará a “nova Lista de Espécies da Fauna e Flora Ameaçadas de Extinção”, de forma não transparente – a reunião não será transmitida. Estamos de olho.
Nesta quarta-feira (16), véspera da reunião da Conabio, foi publicada uma portaria interministerial, instituindo um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) no âmbito dos Ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, para “avaliar e recomendar ações de conservação e uso sustentável para espécies pertencentes à Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção – Peixes e Invertebrados Aquáticos”.
Ato Legal/ Data | EMENTA | Descrição | |
Decreto nº 1.354 29 de Dezembro de 1994 Revogado | Institui, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal, o Programa Nacional da Diversidade Biológica, e dá outras providências | Por meio deste Decreto o Governo brasileiro estabelece o Programa Nacional da Diversidade Biológica-PRONABIO, por meio do Decreto 1354, de 29 de dezembro de 1994 com o objetivo de implementar a CDB no Brasil. O Decreto estabelece a Comissão Coordenadora do Programa (mais tarde transformada na CONABIO), com a finalidade de coordenar, acompanhar e avaliar as ações propostas. Para obter fundos para implementar o Programa, o Governo iniciou negociações com o GEF para receber recursos de doação. A partir de então foi iniciado o primeiro projeto brasileiro junto ao GEF destinado à execução da CDB, o Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira – PROBIO[1]. | |
Decreto nº 2.519 16 de Março de 1998 | Promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada no Rio de Janeiro, em 05 de junho de 1992 | ||
Decreto nº 4.339 22 de Agosto de 2002 | Institui princípios e diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade | Instituição da Política Nacional de Biodiversidade cujos os principais objetivos são: promover a integração de políticas nacionais do governo e da sociedade; estimular a cooperação interinstitucional e internacional para a melhoria da implementação das ações de gestão da biodiversidade; conhecer, conservar e valorizar a diversidade biológica brasileira; proteger áreas naturais relevantes; promover o uso sustentável da biodiversidade; respeitar, preservar e incentivar o uso do conhecimento, das inovações e das práticas das comunidades tradicionais. A PNB engloba componentes temáticos articulados com os objetivos e princípios da CDB[2]. | |
Decreto nº 4.703 21 de Maio de 2003 | Dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica (Pronabio) e a Comissão Nacional da Biodiversidade, e dá outras providências | Alteração da proposta do PRONABIO para que este pudesse se transformar em instância responsável pela coordenação da implementação da Política Nacional de Biodiversidade, mediante a promoção de sinergias entre o Poder Público e a sociedade civil. O novo Decreto, Nº 4703, de 21 de maio de 2003 alterou a comissão coordenadora do PRONABIO para Comissão Nacional da Biodiversidade – CONABIO e definiu a sua estrutura matricial, com os mesmos componentes da Política Nacional de Biodiversidade e sete componentes biogeográficos (os conjuntos de biomas brasileiros: Amazônia; Caatinga; Mata Atlântica e Campos Sulinos; Cerrado e Pantanal; e, Zona Costeira e Marinha). A Comissão é criada com caráter deliberativo conforme o “Art. 9º A Comissão Nacional de Biodiversidade deliberará por maioria simples, com quórum mínimo de metade mais um, e seu Presidente votará somente em casos de empate, quando terá o voto de qualidade.” (grifo nosso). | |
Decreto nº 4.987 12 de Fevereiro de 2004 REVOGADO | Dá nova redação ao art. 7o do Decreto no 4.703, de 21 de maio de 2003, que dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica (Pronabio) e a Comissão Nacional de Biodiversidade | Inclusão de mais representações da sociedade civil. “Art. 1º O art. 7º do Decreto nº 4.703, de 21 de maio de 2003, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 7º…………………………………………………………………………………….. IX – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA; X – Associação Brasileira das Entidades Estaduais de Meio Ambiente – ABEMA; XI – Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura – CONTAG; XII – comunidade acadêmica, indicado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC; XIII – comunidade acadêmica, indicado pela Academia Brasileira de Ciências – ABC; XIV – organizações não-governamentais ambientalistas, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento; XV – movimentos sociais, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento; XVI – povos indígenas, indicado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia – COIAB; XVII – setores empresariais vinculados à agricultura, indicado pela Confederação Nacional da Agricultura – CNA; e XVIII – setores empresariais vinculados à indústria, indicado pela Confederação Nacional da Indústria – CNI. ‘ | |
Decreto nº 5.092 21 de Maio de 2004 | Define regras para identificação de áreas prioritárias para a conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade, no âmbito das atribuições do Ministério do Meio Ambiente | Definição de Áreas Prioritárias por biomas. Uma das principais ações resultantes do PROBIO foi a promoção das primeiras avaliações das “áreas prioritárias por biomas” no período de 1998 a 2000, quando foram identificadas 900 áreas e ações prioritárias para a conservação da biodiversidade na Amazônia; Cerrado e Pantanal; Caatinga; Mata Atlântica e Campos Sulinos; e Zona Costeira e Marinha. Essas avaliações se tornaram instrumentos de planejamento para a conservação da biodiversidade e foram reconhecidas pelo Decreto Nº 5092, de 21 de maio de 2004 que define regras para a identificação de áreas prioritárias para a conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade, no âmbito das atribuições do Ministério do Meio Ambiente. O Decreto define que as áreas serão instituídas por Portaria do MMA a cada revisão[3]. Foram elaboradas duas Portarias, uma reconhecendo o primeiro exercício elaborado entre 1998 a 2000 (Portaria MMA no 126/2004) e a segunda Portaria que reconheceu a revisão das áreas com a reedição dos seminários por bioma entre os anos de 2005 e 2006 (Portaria MMA no 9/2007). A segunda revisão das áreas prioritárias deu origem a Portaria nº 463 de 18 de dezembro de 2018, atualmente em vigor. | |
Decreto nº 5.312 15 de Dezembro de 2004 | Dá nova redação ao art. 7o do Decreto no 4.703, de 21 de maio de 2003, que dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica (Pronabio) e a Comissão Nacional de Biodiversidade | Traz mais uma vez novas instituições da sociedade civil para sua composição. “Art. 1º O art. 7o do Decreto no 4.703, de 21 de maio de 2003, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 7º ……………………………………………………………………………………………………………… IX – Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República; X – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA; XI – Associação Brasileira das Entidades Estaduais de Meio Ambiente – ABEMA; XII – Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura – CONTAG; XIII – Movimento Nacional dos Pescadores – MONAPE; XIV – comunidade acadêmica, indicado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC; XV – comunidade acadêmica, indicado pela Academia Brasileira de Ciências – ABC; XVI – organizações não-governamentais ambientalistas, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento; XVII – movimentos sociais, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento; XVIII – povos indígenas, indicado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia – COIAB; XIX – setores empresariais vinculados à agricultura, indicado pela Confederação Nacional da Agricultura – CNA; e XX – setores empresariais vinculados à indústria, indicado pela Confederação Nacional da Indústria – CNI.”. | |
Decreto nº 6.043 12 de Fevereiro de 2007 | Dá nova redação ao art. 7o do Decreto no 4.703, de 21 de maio de 2003, que dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica (Pronabio) e a Comissão Nacional de Biodiversidade – CONABIO | Nova reorganização: “Art. 1º O art. 7o do Decreto no 4.703, de 21 de maio de 2003, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 7º A Comissão Nacional de Biodiversidade será presidida pelo Secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente e, nos seus afastamentos e impedimentos legais ou regulamentares, pelo Diretor de Conservação da Biodiversidade e, na ausência destes, por um suplente a ser designado pelo Ministério do Meio Ambiente, e terá em sua composição, além de seu Presidente, um representante dos seguintes órgãos e organizações da sociedade civil: …………………………………… § 1º Os representantes do Poder Público, juntamente com seus dois suplentes, serão indicados pelo Ministro titular da respectiva Pasta e designados pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente. § 2º Os representantes das entidades não-governamentais relacionadas nos incisos XI a XX, e seus dois suplentes, serão indicados por suas organizações e designados pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente, com mandato de dois anos, renovável por igual período.” (NR)”. | |
Decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019
| Extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal. | ||
Decreto nº 10.235, de 11 de fevereiro de 2020 | Altera o Decreto nº 4.703, de 21 de maio de 2003, que dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica – PRONABIO e a Comissão Nacional da Biodiversidade. | Recria a CONABIO, retira competências da comissão quanto as “áreas e ações prioritárias”, reduz o número de entidades representadas, alterando a paridade entre governo e sociedade civil (quadro abaixo) e ainda confere a CONABIO o caráter consultivo: “Art. 1º O Decreto nº 4.703, de 21 de maio de 2003, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 6º A Comissão Nacional de Biodiversidade é órgão consultivo destinado a coordenar, acompanhar e avaliar as ações do PRONABIO e lhe compete, especialmente:…” (grifo nosso). |
Fonte: Adaptado de: Prates e Irving, 2015[4] e https://antigo.mma.gov.br/biodiversidade/comissao-nacional-de-biodiversidade/legislacao.html.
[1] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Quarto relatório nacional para a convenção sobre diversidade biológica. Brasília: MMA, 2010.
[2] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Diretrizes e prioridades do plano de ação para implementação da Política Nacional da Biodiversidade. Brasília: MMA, 2006. (Série Biodiversidade, 22).
[3] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Sumário executivo das áreas prioritárias para a conservação, utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira. Brasília: MMA, 2007.
[4] PRATES, A. P. e IRVING, M. 2015. Conservação da Biodiversidade e Políticas Públicas para as áreas protegidas no Brasil: desafios e tendências da origem da CDB às Metas de Aichi. Revista Brasileira de Políticas Públicas. Vol. 5. N. 1. Jan-jun. 2015. 28-58pp.
Nova Composição da CONABIO | ||||
Entidade | Composição Decreto nº 4.703, de 21 de maio de 2003 | Composição Decreto nº 10.235, de 11 de fevereiro de 2020 | Status | Representa qual setor? |
Ministério do Meio Ambiente (Secretário de Biodiversidade e Florestas) | X | X | Mantido | Governo |
Ministério do Meio Ambiente | X | Retirado | Governo | |
Ministério da Ciência e Tecnologia | X | Retirado | Governo | |
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento | X | X | Mantido | Governo |
Ministério da Saúde | X | X | Mantido | Governo |
Ministério das Relações Exteriores | X | X | Mantido | Governo |
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão | X | Retirado | Governo | |
Ministério do Desenvolvimento Agrário | X | Retirado | Governo | |
Ministério da Integração Nacional | X | Retirado | Governo | |
Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República | X | Retirado | Governo | |
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA | X | X | Mantido | Órgão/entidade pública |
Associação Brasileira das Entidades Estaduais de Meio Ambiente – ABEMA | X | Retirado | Representação órgãos/entidades públicas | |
Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura – CONTAG | X | Retirado | Representação de classe | |
Movimento Nacional dos Pescadores – MONAPE | X | Retirado | Representação de classe | |
comunidade acadêmica, indicado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC | X | Retirado | Ciência | |
comunidade acadêmica, indicado pela Academia Brasileira de Ciências – ABC | X | Retirado | Ciência | |
organizações não-governamentais ambientalistas, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento | X | Retirado | Representação sociedade civil | |
movimentos sociais, indicado pelo Fórum de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento | X | Retirado | Representação sociedade civil | |
povos indígenas, indicado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia – COIAB | X | Retirado | Representação Indígenas | |
setores empresariais vinculados à agricultura, indicado pela Confederação Nacional da Agricultura – CNA | X | X | Mantido | Representação setor econômico |
setores empresariais vinculados à indústria, indicado pela Confederação Nacional da Indústria – CNI | X | X | Mantido | Representação empresarial |
Ministério da Defesa | X | Inserido | Governo | |
Ministério da Economia | X | Inserido | Governo | |
Ministério do Desenvolvimento Regional | X | Inserido | Governo | |
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – Instituto Chico Mendes | X | Inserido | Órgão/entidade pública | |
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro – JBRJ | X | Inserido | Órgão/entidade pública | |
de universidades ou institutos de pesquisa, que seja especialista na área de biodiversidade | X | Inserido | Ciência (obs: apenas a EMBRAPA está presente) | |
das entidades ambientalistas de âmbito nacional inscritas há, no mínimo, um ano no Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas – CNEA | X | Inserido | Representação sociedade civil |
Quanto às competências, anteriormente, a Conabio tinha caráter deliberativo e como finalidade coordenar, acompanhar e avaliar as ações do Pronabio (DECRETO Nº 4.703, DE 21 DE MAIO DE 2003) e “Art. 9º A Comissão Nacional de Biodiversidade deliberará por maioria simples, com quórum mínimo de metade mais um, e seu Presidente votará somente em casos de empate, quando terá o voto de qualidade” (grifo nosso). Contudo, o DECRETO Nº 10.235, DE 11 DE FEVEREIRO DE 2020 estabeleceu ser a Conabio um órgão consultivo destinado a coordenar, acompanhar e avaliar as ações do Pronabio, revogando as seguintes competências: (i) aprovar a metodologia para elaboração e o texto final dos relatórios nacionais para a Convenção sobre Diversidade Biológica; (ii) estabelecer critérios gerais de aceitação e seleção de projetos e selecionar projetos no âmbito de programas relacionados à proteção da biodiversidade, quando especialmente designada para tanto; (iii) acompanhar e avaliar a execução dos componentes temáticos para a implementação dos princípios e diretrizes da Política Nacional da Biodiversidade e coordenar a elaboração de relatórios nacionais sobre biodiversidade; (iv) apresentar proposta de regimento interno ao Ministro de Estado do Meio Ambiente.
Ainda, o DECRETO Nº 10.235, DE 11 DE FEVEREIRO DE 2020 alterou a competência de “identificar e propor áreas e ações prioritárias: a) de pesquisa sobre a diversidade biológica; b) de conservação da diversidade biológica; c) de utilização sustentável de componentes da biodiversidade; d) de monitoramento, avaliação, prevenção e mitigação de impactos; e e) de repartição de benefícios derivados da utilização da biodiversidade” para “acompanhar o processo de definição de áreas e de ações prioritárias e a implementação das ações recomendadas”.
Assim, o que se verifica é um esvaziamento de funções primordiais e de grande responsabilidade da Conabio, o que, por óbvio, a faz deixar de ser um colegiado de relevantes decisões e proposições para algo meramente consultivo e, pior, com menor representatividade da sociedade civil, da ciência, das classes e dos povos indígenas.