Em mais um capítulo da disputa entre a União e o Rio Grande do Sul sobre a prerrogativa para definir a política pesqueira naquele Estado – e, por consequência, em outros entes federativos, no mês passado, no dia 22 de abril, foi publicada a PORTARIA SAP/MAPA Nº 115, DE 19 DE ABRIL DE 2021, aprovando o Plano para a Retomada Sustentável da Atividade de Pesca de Arrasto na Costa do Rio Grande do Sul. A norma definiu que as medidas de ordenamento serão regulamentadas por ato normativo da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAP/MAPA). O plano consta como anexo da portaria. Em janeiro, pela PORTARIA SAP/MAPA Nº 9, DE 14 DE JANEIRO DE 2021, havia sido suspensa a utilização de toda e qualquer rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas nas 12 milhas náuticas da faixa marítima da zona costeira do Estado do Rio Grande do Sul, até o início da implementação do plano. Em dezembro, relatamos a discussão judicial acerca do tema. Trazemos aqui novamente um breve histórico das discussões acerca do tema para, assim, apontarmos os aspectos críticos do Plano para a Retomada Sustentável da Atividade de Pesca de Arrasto na Costa do Rio Grande do Sul. A Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca no Estado do Rio Grande do Sul O Estado do Rio Grande do Sul publicou em 2018 a Lei Estadual 15.223/2018, que “Institui a Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca no Estado do Rio Grande do Sul e cria o Fundo Estadual da Pesca”. A lei tem como objetivo “promover o desenvolvimento sustentável da atividade pesqueira como forma de promoção de programas de inclusão social, de qualidade de vida das comunidades pesqueiras, de geração de trabalho e renda e de conservação da biodiversidade aquática para o usufruto desta e das gerações futuras” (art. 1º, caput). Conforme notícia da Oceana, “a Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca (Lei 15.223/2018) foi construída por pescadores artesanais e armadores de pesca com o apoio da Oceana” (grifo nosso). Destacam ainda: “Segundo os presidentes das colônias de pesca do estado, o setor enfrenta um colapso: as práticas danosas de pesca causaram a redução de diversas espécies e mais de 90% das indústrias de pescado do estado fecharam as portas nos últimos 30 anos” (grifo nosso). A lei estabelece as atividades de pesca que são proibidas, dentre as quais “toda e qualquer rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, em todo território do Estado do Rio Grande do Sul, incluindo as 12 milhas náuticas da faixa marítima da zona costeira do Estado” (art. 30, alínea “e”) (grifo nosso). Discussão judicial no Supremo Tribunal Federal (STF)O Partido Liberal (PL) entrou no STF com a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.218 (ADI), que tem como objetivo questionar a legitimidade jurídico-constitucional do parágrafo único do art. 1º e da alínea “e” do inciso VI do art. 30, ambos da Lei estadual nº 15.223/2018, especialmente quanto a (i) aplicação da norma a “toda atividade de pesca exercida no Estado do Rio Grande do Sul, incluindo a faixa marítima da zona costeira”; e (ii) a proibição de pesca mediante utilização de “toda e qualquer rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, em todo território do Estado do Rio Grande do Sul, incluindo as 12 milhas náuticas da faixa marítima da zona costeira do Estado”.Houve pedido liminar na ação para que fossem suspensos os dispositivos da Lei até o julgamento final da ADI.Inicialmente distribuída ao ministro Celso de Mello, a liminar foi negada em 10/12/2019, sob alguns argumentos, dos quais destacam-se: “Observa-se, desse modo, que o Estado do Rio Grande do Sul, ao estabelecer a “Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca” (Lei gaúcha nº 15.223/2018), instituindo a proibição da utilização de rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas, parece ter agido em conformidade com a legislação nacional editada pela União Federal (Lei nº 11.959/2009) …” “Tenho para mim, ao menos em juízo compatível com uma análise estritamente delibatória, que os fundamentos que deram suporte a referido julgamento plenário (ADI 861-MC/AP, Rel. originário Min. NÉRI DA SILVEIRA) afastam a plausibilidade jurídica da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pela autora da presente ação direta, ainda mais se se considerar que a legislação estadual gaúcha (Lei estadual nº 15.223/2018) – que institui, em âmbito regional, a proibição da pesca de arrasto – parece ajustar-se às diretrizes constantes das normas gerais da Política Nacional instituída pela União Federal em matéria de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca (Lei nº 11.959/2009).” “A pretendida suspensão cautelar da lei gaúcha ora impugnada, tendo em vista as premissas invocadas como suporte legitimador da presente decisão, provocaria grave comprometimento da integridade do patrimônio ambiental, pondo em risco a função ecológica da fauna marítima, com possibilidade de séria redução das espécies marinhas, considerado o caráter evidentemente predatório da atividade pesqueira quando nela utilizados métodos e técnicas como o emprego de “toda e qualquer rede de arrasto tracionada por embarcações motorizadas”, em contexto claramente vulnerador das cláusulas inscritas no art. 225, “caput” e respectivo § 1º, incisos V e VII, da Constituição da República.” “É importante considerar, sob tal aspecto, os impactos potenciais gerados pela aplicação da Lei gaúcha, especialmente no que se refere à constatação técnica de que a pesca de arrasto, em virtude da utilização de redes de malha fina, de reduzido tamanho, culmina por capturar e devolver às águas um grande número de peixes pequenos, já sem vida, das principais espécies (corvinas, pescados e pescadinhas) …” Contudo, o ministro Celso de Mello se aposentou do STF e o seu sucessor, ministro Kassio Nunes Marques, assumiu a relatoria da ADI.Após o PL recorrer judicialmente, o ministro Nunes Marques deferiu a liminar, em contraposição ao que havia determinado o ministro Celso de Mello, sob argumentos pautados na competência da União em legislar sobre mar territorial. Os efeitos da liminar de Nunes MarquesConforme noticiou a imprensa: “Em visita nesta segunda-feira (21) ao Farol da Ilha da Paz, em São Francisco do Sul, entre os estados de Santa