No Dia da Terra, o governo dos Estados Unidos convocou a Cúpula de Líderes sobre Clima, com 40 chefes de estado e diversos representantes do setor privado e da sociedade. Havia muita expectativa e especulação sobre como o presidente brasileiro Jair Bolsonaro se comportaria diante do grande desafio de discursar sobre um dos temas que lhe imputa maior pressão internacional no momento.A ordem dos discursos, definida pelos anfitriões, deu uma sinalização sobre o grau de prestígio do Brasil no contexto global. Bolsonaro foi o 19º líder a falar, na lista que abriu com a China e teve antes do presidente brasileiro chefes de países como Alemanha, Japão, Rússia, Argentina, Ilhas Marshall e Arábia Saudita. Bolsonaro dedicou os primeiros 2 minutos e 30 segundos do seu discurso de 7 minutos totais a exaltar o Brasil como “voz ativa na construção da agenda ambiental global”. Afirmou que o país está na “vanguarda do enfrentamento ao aquecimento global”. Olhou para trás ao dizer que, quando se discutem mudanças climáticas, “não podemos esquecer a causa maior do problema: a queima de combustíveis fósseis ao longo dos últimos dois séculos”. Disse que o país conta atualmente com uma das matrizes energéticas mais limpas. E que, no campo, “promovemos uma revolução verde a partir da ciência e da inovação”. Sobre as emissões atuais do Brasil, Bolsonaro fez um recorte temporal englobando os últimos 15 anos, sem mencionar o quadro mais atual, resultante do seu governo. “Nos últimos últimos 15 anos, evitamos a emissão de mais de 7,8 bilhões de toneladas de carbono na atmosfera”, afirmou. Finalizando a longa introdução, reiterou a NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) brasileira para reduzir em 37% as emissões até 2025 e 40% (o compromisso depositado, na verdade, é de 43%). As 10 maiores boiadas durante a pandemia Após o primeiro terço do discurso sem novidades, Bolsonaro indicou que o país antecipará a meta de neutralidade climática em 10 anos, de 2060 para 2050. “Entre as medidas necessárias para tanto, destaco aqui o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030, com a plena e pronta aplicação do Código Florestal. Com isso, reduziremos em quase 50% nossas emissões até essa data”, afirmou. Não foram elencadas as medidas para redução dos outros 50% de emissões e para evitar o aumento de emissões por outros setores. Para diminuição do desmatamento, Bolsonaro afirmou que devem reforçar atividades de combate e controle, apesar das “limitações orçamentárias” e que duplicará os investimentos nas ações de fiscalização. Com a previsão do menor orçamento para os órgãos ambientais nas duas últimas décadas, dobrar o empenho em fiscalização não deverá significar um valor que altere o cenário. Bolsonaro ressaltou ainda o suposto “paradoxo amazônico”: “região mais rica do país em recursos naturais, mas que apresenta os piores índices de desenvolvimento humano”. A partir desse ponto, falou sobre desenvolvimento, colocando entre caminhos para isso “aprimorar a governança da terra”, que pode ser lido como a regularização fundiária – um dos temas prioritários do governo federal. Para a solução das questões na Amazônia, Bolsonaro afirmou que devem ser contemplados os interesses de todos os brasileiros, “inclusive dos indígenas e comunidades tradicionais”, sem colocar estes últimos dois grupos como protagonistas e centrais da discussão. Na última parte do discurso, Bolsonaro ressaltou a necessidade de apoio financeiro. “Diante da magnitude dos obstáculos, inclusive financeiros, é fundamental poder contar com a contribuição de países, empresas, entidades e pessoas dispostas a atuar de maneira imediata, real e construtiva, na solução desses problemas”, disse, emendando com uma fala sobre as expectativas para COP 26. Para a Conferência das Partes, em novembro, o presidente brasileiro mencionou os artigos 5º e 6º do Acordo de Paris, com a necessidade de “plena adoção dos mecanismos previstos”. Afirmou que é fundamental que, no mercado global de carbono, haja “justa remuneração pelos serviços ambientais prestados pelos nossos biomas ao planeta”. No geral, o discurso do presidente brasileiro não trouxe grandes novidades nem avançou com metas mais ambiciosas, ao contrário de falas de alguns outros líderes na manhã desta quinta-feira (22). Não foram indicadas ações claras que viabilizem alterar a rota dos recordes de desmatamento e emissões dos últimos anos. A equipe da POLÍTICA POR INTEIRO analisou o discurso de Bolsonaro e traz um placar para ajudar na avaliação dos pontos levantados. Para ver esta tabela comentada, clique aqui. English Version On Earth Day, the government of the United States convened the Leaders Summit on Climate, with 40 heads of state and several representatives of the private sector and society. There was a lot of expectation and speculation about the speech of the Brazilian President, Mr. Jair Bolsonaro. A signal about the degree of prestige of Brazil in the global context was given by the order in which Mr. Bolsonaro spoke: he was the 19th leader to speak, after all other BRICS countries as well as Argentina, Marshall Islands and Saudi Arabia. Bolsonaro dedicated the first 2 minutes and 30 seconds of his 7-minute total speech to extolling Brazil as an “active voice in building the global environmental agenda”. He stated that the country is at the “forefront of tackling global warming”. He looked back when he said that when discussing climate change, “we must not forget the main cause of the problem: the burning of fossil fuels over the past two centuries”. He said that the country currently has one of the cleanest energy matrices. And that, in the field, “we promote a green revolution based on science and innovation”. Regarding Brazil’s current emissions, Bolsonaro made a time frame encompassing the last 15 years, not to mention the most current picture, resulting from his government. “In the past 15 years, we have avoided the emission of more than 7.8 billion tons of carbon into the atmosphere,” he said. Concluding the long introduction, he reiterated the Brazilian NDC (Nationally Determined Contribution) to reduce emissions by 37% by 2025 and 40% (the deposited commitment, in fact, is 43%). After the first 1/3 of the speech, Bolsonaro indicated that the country will anticipate the goal
As 10 maiores boiadas durante a pandemia de covid-19 (até aqui)
22 de abril de 2020. Pouco mais de um mês do início da pandemia de covid-19. As autoridades começavam a emitir normas recomendando o uso de máscara em locais públicos. Álcool em gel havia recém se tornado item essencial do dia a dia. Os brasileiros absorviam o choque de um novo mundo, uma nova rotina, uma nova vida. Os mortos por covid-19 no país se contavam diariamente na casa das duas centenas – hoje, ultrapassam os três, quatro milhares. O noticiário era tomado por um único assunto. Com os olhos da imprensa voltados para cobrir a maior tragédia sanitária da história do Brasil, alguém viu uma grande oportunidade, um momento de tranquilidade para o governo federal agir livre do escrutínio da mídia. Em reunião ministerial com a presença de 25 autoridades, incluindo o presidente da República, Jair Bolsonaro, e seu vice, Hamilton Mourão, ministros e presidentes de bancos estatais, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, emitiu a frase que viria a ser o símbolo do modus operandi do governo para a implementação de suas políticas públicas (ou não públicas): “Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de ministério da Agricultura, de ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação, é de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos.” Salles afirmou que era a chance de fazer as mudanças necessárias por meio de atos infralegais, sem apresentar e debater os projetos no Congresso. Além de aproveitar o momento para não enfrentar os questionamentos da imprensa, viu a oportunidade de não submeter as propostas à análise do Legislativo. Enquanto os brasileiros perdiam familiares, amigos, ídolos, – sem contar empregos, renda, comida, sanidade, a mais alta cúpula do governo federal vislumbrou a oportunidade de tirar-lhes mais um bem imensurável: poder, democracia. O ranking das 10 maiores boiadas Neste dia em que a reunião ministerial, da qual os brasileiros tomaram conhecimento um mês depois, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), completa um ano, a POLÍTICA POR INTEIRO selecionou as 10 maiores boiadas socioambientais e climáticas editadas desde 15 de março de 2020. Ou seja, durante a pandemia de covid-19. Confira a lista abaixo: Engfraquecimento da Lei da Mata Atlântica Data Tema Ato Por que é uma boiada Classificação 06/04/2020 Biodiversidade Despacho nº 4.410/2020 Foi a primeira das tentativas de passar a boiada. Este despacho, assinado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, aprova o posicionamento da Advocacia-Geral da União (AGU), que ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6446, com pedido de declaração de nulidade de dispositivos do Código Florestal (Lei 12.651/2012) e da Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006). O objetivo era desconsiderar a aplicação da Lei da Mata Atlântica com a justificativa de que ela não regula os regimes de Área de Preservação Permanente (APP), de Reserva Legal ou de Áreas de Uso Restrito. Tal entendimento abriria brecha para produção agrícola em áreas do bioma e anistiaria proprietários rurais que desmataram e ocuparam essas áreas até julho de 2008. Não houve deferimento de pedido liminar e o mérito da ADI ainda não foi julgado. Desregulação Florestas sem gestão ambiental Data Tema Ato Por que é uma boiada Classificação 13/05/2020 Florestas Decreto nº 10.347, de 13 de maio de 2020 O ato transferiu do Ministério do Meio Ambiente (MMA) para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), o poder de formular políticas e programas para a gestão de florestas públicas. Dessa forma, atribuiu ao MAPA a totalidade das competências florestais, que passaram a ser geridas sem passar pela pasta ambiental. O decreto também realoca a Comissão de Gestão de Florestas Públicas (CGFLOP) do MMA ao MAPA, modificando o entendimento definido na Lei de Gestão de Florestas Públicas nº 11.284 de 2006. Reforma institucional Polêmica revogação no Conama Data Tema Ato Por que é uma boiada Classificação 21/10/2020 Biodiversidade RESOLUÇÃO CONAMA/MMA Nº 500, DE 19 DE OUTUBRO DE 2020 Esta resolução do Conama revogou as resoluções 284 (sobre licenciamento de projetos de irrigação), 302 (sobre APPs ao redor de reservatórios artificiais) e 303 (sobre proteção a manguezais) do Conselho, formalizando decisão tomada na polêmica Plenária 135 do órgão. Foi questionada no Judiciário e no Legislativo por meio de Projetos de Decreto Legislativo para sustá-la. Plenário do STF confirmou liminar mantendo a validade da Resolução 303. Desregulação Possível fusão de Ibama e ICMBio Data Tema Ato Por que é uma boiada Classificação 02/10/2020 Institucional PORTARIA Nº 524, DE 1º DE OUTUBRO DE 2020 O grupo de trabalho criado pela portaria tem como objetivo estudar uma possível fusão dos órgãos ambientais IBAMA e ICMBio. Teve prazo inicial até fevereiro de 2021 e foi prorrogado até junho de 2021. A possibilidade de reforma institucional por meio da fusão é parte da estratégia de desmantelamento dos órgãos ambientais e está aliada ao menor orçamento já previsto para as instituições e também à perda de autonomia promovida por normas como a PORTARIA Nº 151, DE 10 DE MARÇO DE 2021, que expõe os servidores à censura acadêmica entre outras ações internas compreendidas como mordaça institucional. Reforma institucional Aquicultura em reservatórios e outros corpos d’água da União ata Tema Ato Por que é uma boiada Classificação 15/12/2020 Pesca DECRETO Nº 10.576, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2020 Norma que alterou o regime sobre espaços físicos em corpos d’água de domínio da União para a prática da aquicultura. Como destaque, há a mudança de “autorização de uso” para “cessão de uso”, o que dá maior poder/autonomia àquele que obtiver a “cessão”. Foi reduzida a gestão compartilhada em gestão pesqueira, centralizando competências na Secretaria de Aquicultura e Pesca do MAPA, sendo que antes outras entidades/órgãos eram consultados, como o IBAMA e ANA. Desregulação Nova regulamentação para recifes de artificiais