O governo federal publicou na terça-feira (27) o decreto nº 10.531, de 26 de outubro de 2020, instituindo a Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, a EFD 2020-2031. A medida foi anunciada como o estabelecimento de “um planejamento orientado à retomada econômica que já considera o pós-pandemia para atualização dos parâmetros e também a melhor colocação do país em indicadores internacionais”. A norma em si é simples, com quatro artigos expondo que “os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional considerarão, em seus planejamentos e suas ações, os cenários macroeconômicos, as diretrizes, os desafios, as orientações, os índices-chave e as metas-alvo estabelecidos no Anexo” do ato. O anexo, sim, é um extenso documento. São apresentados três cenários macroeconômicos para o Brasil até 2031. Diretrizes, desafios, orientações, índices-chave e metas são descritos para cinco eixos: Econômico, Institucional, Infraestrutura, Ambiental e Social. Abaixo, uma análise da equipe da POLÍTICA POR INTEIRO sobre a Estratégia Federal de Desenvolvimento 2020-2031, com foco na questão ambiental e de mudança do clima. Os cenários macroeconômicos na EFD 2020-2031 Três cenários macroeconômicos são apresentados na EFD 2020-2301. Cenário de referência (mais básico, com reformas macrofiscais): “não haveria muitos avanços na adoção de reformas microeconômicas com grandes impactos sobre a produtividade, apenas com melhorias marginais”. PIB: projeção de crescimento anual médio de 2,2 a.a., de 2021 a 2031 PIB per capita: projeção de crescimento anual médio de 1,6% a.a., de 2021 a  2031 Cenário transformador (com reformas amplas e avanço da escolaridade): “além das reformas requeridas para o equilíbrio fiscal de longo prazo, também haveria um conjunto mais amplo de reformas, as quais incentivariam o aumento da produtividade geral da economia” PIB: projeção de crescimento anual médio de 3,5% a.a., de 2021 a 2031 PIB per capita: projeção de crescimento anual médio de 2,9% a.a., de 2021 a  2031 Cenário de desequilíbrio fiscal (com um quadro de desajuste fiscal explosivo): “os arcabouços institucional e econômico seriam mantidos inalterados no curto prazo, sem reformas que permitissem conter a elevação dos gastos públicos obrigatórios” O terceiro cenário, de desequilíbrio fiscal, não foi utilizado para balizar as metas da EFD. Não foram apresentadas projeções numéricas para ele, somente a observação de que haveria crescimento quase nulo ou retração. A diretriz principal e o índice-chave geral da EFD 2020-2031 “Elevar a renda e a qualidade de vida da população brasileira com redução das desigualdades sociais e regionais.” O Índice de Desenvolvimento Humano é apresentado como o índice-chave para orientar a diretriz principal acima. A última atualização do dado, de 2018, indica o IDH brasileiro em 0,761. A meta para 2031 é de 0,808 no cenário de referência e de 0,842 no cenário transformador. O que esses números querem dizer? Para se ter uma ideia, um país que tem hoje (dado de 2018 também) IDH de 0,808 é o Uruguai. Com o valor próximo ao da meta do cenário transformador, há o Chile, atualmente com IDH de 0,847. No ranking global, o Brasil está hoje em 79º. Uruguai e Chile ocupam o 57º e 42º lugares, respectivamente. Diretriz, orientações e metas do eixo Ambiental “Promover a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais, com foco na qualidade ambiental como um dos aspectos fundamentais da qualidade de vida das pessoas, conciliando a preservação do meio ambiente com o desenvolvimento econômico e social.” A diretriz do eixo Ambiental somada à diretriz principal corrobora o que se observa constantemente no discurso das autoridades federais sobre qualidade ambiental. Enfatizar a necessidade de conciliar a preservação do meio ambiente com o desenvolvimento econômico tem sido fala recorrente, que cria uma falsa impressão de que havia, até então, um descompasso entre esses dois aspectos: preservação e desenvolvimento. Um argumento também frequente destaca os baixos IDHs dos municípios da Amazônia, criando-se uma dicotomia falaciosa entre os esforços para preservação do bioma e para redução das desigualdades sociais na região. No eixo Ambiental, foram estabelecidos oito índices-chave: Índice de Performance Ambiental (Environmental Performance Index – EPI), do Yale Center for Environmental Law and Policy.Segundo o último levantamento, apresentado em junho deste ano, o Brasil obteve 51,2 no índice. A meta no cenário de referência é 56,1, no transformador, 58,6. O cenário de referência não é tão irreal se observada a evolução do EPI do país nos dez anteriores ao atual índice: a variação foi de exatamente +4,9. Se o Brasil alcançar esse objetivo, equivaleria a evoluir em 10 anos para o perfil atual de Polônia ou das Ilhas Seychelles. Ou seja, muito pouco ambicioso. Mas talvez não chegue nem a isso, pois o índice publicado neste ano foi calculado em 2019, com dados compilados de diferentes fontes. O EPI é composto a partir de 32 indicadores que abarcam 11 categorias, cobrindo a saúde ambiental e o vitalidade do ecossistema de um país. O relatório divulgado mostra expressamente preocupação com a atual realidade brasileira, destacando tendência de alta de desmatamento desde 2012 e o fato de os números das queimadas que ganharam as manchetes do mundo em 2019 na Amazônia não estarem contabilizados ainda no atual EPI. “Com as mudanças climáticas e o desmatamento aumentando a frequência e a intensidade das secas – e com o governo do presidente Bolsonaro revogando proteções ambientais – queimadas como as vistas em 2017 e 2019 devem ser mais potentes e devastadoras”, diz o relatório. Além disso, as queimadas recordes no Pantanal neste ano aconteceram após a divulgação do EPI. Outro ponto sobre esse material divulgado em junho: nele, o Brasil aparecia como líder na proteção de um dos 14 tipos de biomas terrestres do planeta, o mangue. Justamente sobre a preservação desse tipo de vegetação houve retrocesso, com revogação de resolução na 135ª Plenária do Conama. Por fim, o índice em que o Brasil apresenta pior desempenho ambiental é de estoques pesqueiros. Poupança genuína (Adjusted Net Savings), do Banco Mundial.O índice apontado no decreto é de 2018, de 3,35% a.a. em relação à Renda Nacional Bruta (RNB). A meta no cenário