(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)
Na próxima semana, você deverá ouvir falar bastante em um evento chamado de “Pré-COP”. Embora ela não seja considerada pela ONU um evento oficial da Convenção do Clima, a Pré-COP tem sua relevância por mobilizar agentes de Estado de dezenas de países e normalmente funcionar como um “esquenta” para a Conferência do Clima.
Trinta dias para a trigésima. Enquanto Belém corre para dar os últimos retoques na cidade, a fim de receber o mundo da melhor maneira (como é característico da ótima hospitalidade belenense), o governo brasileiro deve, sobretudo por meio da presidência da Conferência, exercitar todo o seu potencial diplomático na intenção de ampliar a ambição climática dos países presentes na Pré-COP. Aliás, muito do tom dos temas e das negociações que veremos em novembro, em Belém, poderá ser sentido na atmosfera da Pré-COP em Brasília.
Dessa forma, é esperado que o Brasil levante temas importantes durante a semana. Alguns deles vêm do terreno do financiamento, com o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) e a integração de mercados nacionais de carbono.
No caso do TFFF, o Brasil e um punhado de países florestais em desenvolvimento têm “suado sangue” para fazer essa nave decolar, mas ela precisa de um combustível inicial: US$ 25 bilhões. Esse é o chamado “capital júnior”, que deve vir de países desenvolvidos, e que, devidamente investido, tem a capacidade de mobilizar outros US$ 100 bilhões junto ao setor privado. É da soma desses dois valores que o TFFF encherá o tanque e poderá, finalmente, alçar voo. Um voo que tem tudo pra ser perene, já que, diferentemente de outros mecanismos, não mira só a conservação de florestas, mas também outras políticas públicas dos países beneficiários, além de garantir o próprio retorno financeiro de quem nele investiu. Ou seja, está longe de ser um mero “passar o chapéu”. Vale lembrar que, há poucos dias, o Brasil, embora beneficiário do Fundo, tratou logo de tirar do bolso e ser seu doador inaugural, em US$ 1 bilhão. Agora só faltam 124.
Já a integração de mercados de carbono vem como algo que precisa atacar a causa do problema climático: as emissões. Com um teto de emissões fixado, e que progressivamente vai ficando mais baixo, os países e as corporações devem ter cada vez menos margem para seguir emitindo como se não houvesse amanhã. O Brasil levanta a bola dessa integração global de mercados ao mesmo tempo em que precisa correr para operacionalizar seu próprio sistema nacional de comércio de emissões, aprovado por lei em 2024. Afinal, cada milésimo de grau Celsius a mais de temperatura fará toda a diferença para garantir dignidade em um mundo mais quente.
Mas nem só de financiamento viverá uma COP bem sucedida. O Brasil precisa encontrar fôlego para pautar temas como a transição justa, o Balanço Global (GST) e a adaptação, com destaque para os indicadores globais e o aumento do número de países com seus planos nacionais, os chamados NAPs. É claro que não se trata de discutir todos os problemas do mundo em apenas dois dias, até porque, se você acompanha as análises da Política por Inteiro, sabe que a COP não deve ser encarada como um evento, mas um processo que se dilui ao longo de um ano inteiro, como nos encontros em Berlim (março), Copenhague e Cidade do Panamá (maio), Bonn (junho), Addis Abeba e Nova York (setembro). O desejo brasileiro de um mutirão global é um crochê que se tece sem parar ao longo de meses a fio.
Ah, antes que a gente se esqueça de registrar. O Legislativo também fez sua Pré-COP. Senadores que integram o Parlamaz (Parlamentares da Panamazônia), composto por representantes dos oito países que têm parte do Bioma Amazônia, usaram a semana que passou para declarar apoio à COP30. No caso dos integrantes brasileiros do Parlamento, para ser coerente, esse apoio deveria se traduzir em defesa de políticas de Estado que protejam o Brasil de descambar suas emissões e de perder a biodiversidade que é parte do passaporte nacional para um futuro de baixo carbono. Essa coerência já poderia começar se manifestando, por exemplo, em um sonoro rechaço ao afrouxamento das regras de licenciamento ambiental do país, bola que está com o Congresso, pelo menos, até dezembro.
Faltam 30 dias para a COP30.
Boa leitura!
TÁ LÁ NO GRÁFICO
Aproveitamos o Dia das Crianças para lembrar que elas, especialmente na primeira infância, estão entre os grupos mais vulneráveis à emergência climática. O assunto é árduo, mas decidimos ilustrar esse alerta com o coração. A equipe da Política por Inteiro pediu ajuda para uma turma muito especial: a criançada que volta e meia aparece nas nossas reuniões. São filhas, filhos, irmãs, sobrinhas que nos mostram que é possível sonhar com qualquer futuro e podemos juntos construí-lo hoje.
A missão que demos a elas foi fazer desenhos que representassem o que amam e gostariam que seguisse existindo no futuro. Confira no Tá Lá no Gráfico desta semana o talento dessa garotada (disclaimer: texto totalmente parcial).

FRASE DA SEMANA
“Se eu fosse responsável pela avaliação de crédito de uma empresa e tivesse uma proposta de exploração de petróleo cujo produto atingirá o mercado em 12 a 15 anos, eu teria muita dificuldade em aprovar. O preço do petróleo poderá estar em queda franca.”
Candido Bracher, ex-presidente do Itaú Unibanco, no seminário Brasil e Japão: Investimentos, Tecnologias e Mercado de Carbono, promovido por Talanoa e Embaixada do Japão, na Japan House São Paulo. Foto: Renato Tanigawa/Instituto Talanoa.
ABC DO CLIMA
Intergeracionalidade: é o conceito que descreve as relações e trocas entre diferentes tempos da existência humana – as gerações – e se baseia na ideia de que aqueles que ainda vão existir devem ter os mesmos direitos de quem existe no tempo presente. Por isso, a intergeracionalidade traduz uma importante noção de justiça entre gerações, especialmente em temas como sustentabilidade e políticas públicas, estabelecendo que as ações do presente devem preservar as condições de vida e de existência das pessoas que virão depois de nós.
Para que a intergeracionalidade prevaleça, é necessário que todas as pessoas compartilhem cuidados e conhecimentos em favor da sustentação dos elementos essenciais à vida, através dos tempos. No regime climático, o conceito de intergeracionalidade é tão importante que deixou de ser só uma ideia, e virou um Princípio: as decisões tomadas hoje moldam as condições futuras do planeta de quem for nascer e viver aqui quando as gerações atuais já não mais existirem. Por isso, o Acordo de Paris traz, no início de seu texto, o Princípio da Equidade Intergeracional, reconhecendo que a mudança do clima é uma preocupação comum da humanidade e que as medidas de enfrentamento devem respeitar os direitos humanos, incluindo o direito das crianças e a justa partilha dos recursos planetários entre gerações.
MONITOR DE ATOS PÚBLICOS
Nosso Monitor de Atos Públicos captou 5 atos relevantes para a política climática nesta semana. O tema Terras e Territórios foi destaque, com 2 normas, incluindo a criação do Comitê de Enfrentamento ao Racismo Ambiental e Climático. A classe mais captada foi Regulação, também com 2 atos captados.
União contra o racismo ambiental e climático
Os ministérios da Igualdade Racial (MIR), Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e Povos Indígenas (MPI) se uniram para dar vida ao Comitê de Enfrentamento ao Racismo Ambiental e Climático, lançado nesta semana. A nova instância tem o objetivo principal promover o enfrentamento ao racismo ambiental e climático, incentivando, para tanto, a difusão dos conceitos de racismo ambiental e climático. Com caráter consultivo, não deliberativo, a ideia é mobilizar sociedade e gestores públicos para a formulação de estratégias eficazes ao enfrentamento dos eventos climáticos extremos, sempre tendo em vista as evidências verificadas na vida real, de que há “desproporcionalidade de efeitos dos eventos climáticos sobre a população negra, de quilombolas, de povos e comunidades tradicionais de matriz africana, de povos de terreiros, ciganos, populações indígenas e dos povos e comunidades tradicionais”, em relação a outras, que historicamente foram capazes de acumular melhores condições de vida e maior repertório econômico e infraestrutural para minimizar consequências adversas originadas da mudança do clima.
Luz do Povo
Sancionada nesta semana a Lei 15.235, resultante da MP 1.300/2025 que alterou um conjunto de leis a fim de ampliar a taxa social de energia elétrica. A medida batizada de Luz do Povo, garante gratuidade total da conta de luz para famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – CadÚnico, desde que o consumo não ultrapasse 80 quilowatts-hora (kWh) por mês. O benefício se estende às famílias quilombolas e indígenas e à população que ainda depende do sistema isolado, principalmente na Região Norte do país.
O acesso à energia elétrica no Brasil é considerado universal – em 2024, atingiu 99,8% dos domicílios. Porém, fatores ligados ao custo, instabilidade e qualidade da energia elétrica fornecida ainda comprometem o acesso de parte da população, Dessa forma, o programa se coloca como um passo importante em direção à justiça energética. A ampliação da isenção será custeada através de encargos adicionais na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
BRASIL
EcoInvest
O Governo Federal lançou nesta semana o 3º Leilão Eco Invest Brasil, cujo foco é a transformação ecológica da economia. O diferencial está na proteção cambial (hedge) para investidores internacionais, visando a reduzir o risco da volatilidade do real e atrair aportes de longo prazo. O leilão prioriza investimentos de equity em bioeconomia, transição energética e economia circular. As propostas devem ser apresentadas até 19 de novembro.
MUNDO
Coalizão do carbono
O Brasil levará à COP30 a proposta para conectar diferentes sistemas de comércio de emissões de carbono. A adesão à Coalizão Aberta para Integração dos Mercados de Carbono será voluntária e ficará aberta para os países a qualquer momento. A ideia é que os países trabalhem juntos na precificação de carbono, incentivando-se também a participação de nações e baixa e média renda, com mecanismos redistribuição de renda entre os membros.
Nobel de Química “conversa” com o clima
Um trio de pesquisadores venceu o Prêmio Nobel de Química a partir de avanços na compreensão das chamadas “estruturas metal-orgânicas”. Essas moléculas, ainda que pequenas, têm o potencial de prender dentro de si uma grande quantidade de outras moléculas e substâncias, dentre as quais… sim, o dióxido de carbono, principal gás de efeito estufa. A didática comparação com a bolsa da personagem Hermione, da série de livros e filmes Harry Potter, foi inevitável.
No entanto, é preciso ter cautela: não se trata de uma solução definitiva para conter as mudanças climáticas, por si só. O risco que esse tipo de abordagem traz é gerar um senso de “liberou geral” porque “a salvação” chegou. Não é bem assim.
Convém comemorar avanços científicos para o bem coletivo sempre, mas também entender que não há panaceia para problemas complexos. Reduzir emissões e adaptar o mundo ainda são os principais trunfos que temos.
Renováveis ultrapassam fósseis pela primeira vez
Nesta semana, o britânico The Guardian repercutiu um relatório da organização não-governamental Ember, especializada em energia. Segundo o documento, a produção de energia nas modalidades solar e eólica ultrapassou a oferta de energia tradicional baseada em carvão mineral e gás. Essa teria sido a primeira vez no mundo em que essa contabilidade gerada registra vitória de fontes renováveis sobre fontes convencionais.
Muito embora a demanda por energia siga crescendo, a expansão de renováveis tem abastecido o mundo cada vez mais. Tanto a ponto de gerar um “novo problema”, que no Brasil e em outros países tem ficado mais evidente: a incapacidade das próprias matrizes nacionais em absorver e utilizar o volume limpo gerado, ocasionando desperdício de energia limpa. Já há até um nome pra isso: curtailment. Cabe agora a governos e empresariado investirem pesado na modernização da infraestrutura elétrica mundial, a fim de evitar essa incapacidade e, com ela, o desperdício que repercute negativamente na Economia.
TALANOA POR AÍ
Na Japan House, em São Paulo, na quinta-feira (9), reunimos autoridades, lideranças do setor privado, gestores públicos e especialistas para o “Seminário Brasil e Japão: Investimentos, Tecnologias e Mercado de Carbono”. Foram discutidos os passos do roteiro de implementação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), estratégias de como os mercados de carbono podem auxiliar no cumprimento das NDCs, bem como incentivos às empresas para transicionar para uma economia de baixo carbono. Neste panorama, foram explorados mecanismos de cooperação internacional que auxiliam a transição, como o Joint Credit Mechanism (JCM), apresentado no evento pelo Ministério do Meio Ambiente do Japão e em casos reais de empresas que já o utilizam. O evento foi uma realização da Talanoa em parceria com a Embaixada do Japão no Brasil.

(Fotos: Renato Tanigawa/Instituto Talanoa e Daniela Swiatek/Instituto Talanoa).









Tomoki Mitsuya, Embaixada do Japão no Brasil • Liuca Yonaha, Instituto Talanoa
Coragem foi o tema da apresentação de Natalie Unterstell no TEDx Countdown, realizado nesta quarta-feira (8) no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro. A presidente da Talanoa falou sobre senso de urgência, ansiedade climática e o dilema entre agir com esperança e reconhecer a magnitude dos impactos e da emergência climática. Entre pessimismo e otimismo, Natalie propõe a escolha pela coragem. A velejadora Tamara Klink, que recentemente concluiu a Passagem Noroeste sozinha, apresentou Natalie para o público do TED reunido no teatro do Copa.
TALANOA NA MÍDIA
| Sumaúma | Marta Salomon, analista sênior da Talanoa, fala sobre Plano Clima e agronegócio para o site. |
| Folha de S. Paulo | Em reportagem sobre adaptação climática na COP30, Natalie Unterstell, presidente da Talanoa, é uma das entrevistadas. |
| O Eco | No podcast Entrando no Clima #56, Taciana Stec, especialista em Política Climática da Talanoa, faz uma análise da Semana do Clima de Nova York. |
Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO