(O conteúdo que você vai ler a seguir é feito totalmente por humanos, e para humanos)

Menos de dois meses após a primeira comunicação oficial feita pela Presidência da COP30, veio a público nesta semana a 2ª (de pelo menos cinco) Cartas “abertas à Humanidade” sobre a jornada e os compromissos que os países, juntos, devem encampar para que o mundo vire o jogo e enfrente seriamente a mudança do clima. O contexto é um cenário global cada vez mais desafiador, seja pelo que aponta a Ciência, seja pelas prioridades dos grandes centros de poder, cada vez mais dominadas pelo espírito bélico-armamentista, e cada vez mais displicentes ao estouro dos prazos antes que o clima desande de vez.
Diferentemente da carta de março, a segunda comunicação é menos idealista e mais mão-na-massa, levantando propostas concretas para que o clima “se conecte à vida real das pessoas”. Ela não esquece que, para que isso aconteça, uma governança global nova (ou pelo menos amplamente reformada) terá de surgir. Com ela – e possivelmente somente com ela – o Acordo de Paris e pactuações adjacentes poderão ter implementação acelerada.
Na lógica de aproximar o tema clima da “família humana”, a carta é convidativa a ponto de pedir que cada cidadão do globo “venha como é” e “ofereça o que tem”. A questão é que muitos agentes políticos e financeiros de grande influência nos rumos do mundo simplesmente não querem ter nada a oferecer, mas não medem esforços em usar a linguagem do clima para capitalizar pontos e participar dos espaços de decisão. Vide a Petrobras, uma estatal empresarial que investe pesado em marketing pró-clima, mas cuja liderança sequer se constrange em repetir o bordão de um negacionista do clima para demonstrar que a empresa moverá o que for necessário para desenterrar mais carbono das entranhas do planeta. Conclusão: boicota-se clara e abertamente o próprio Plano de Transformação Ecológica, espinha dorsal do desenvolvimento nacional, ora dito prioridade pelo governo.
A Política por Inteiro teceu reflexões sobre a 2ª Carta da Presidência da COP30 (em português e em inglês).
A expectativa é grande para as cartas que virão nas próximas semanas. Após a convocação para o mutirão, veio o chamado à ação. E perfurar não faz parte do pacote.
Enquanto isso, já são muitos os que estão de ouvidos atentos e mangas arregaçadas. Vamos por mais.
Boa leitura!
TÁ LÁ NO GRÁFICO
Nesta semana, foi encerrada mais uma etapa da elaboração do Plano Clima, com o encerramento das consultas públicas acerca dos 16 Planos Setoriais e Temáticos de Adaptação e da Estratégia Nacional de Mitigação. No Tá Lá no Gráfico desta semana, resumimos a análise da Talanoa acerca dos planos de adaptação, apontando os pontos positivos e o que é necessário aprimorar nos documentos. A previsão é de que, no próximo mês, sejam disponibilizados para comentários, na plataforma Brasil Participativo, os sete Planos Setoriais de Mitigação. O objetivo do Governo Federal é apresentar todo o Plano Clima até a COP 30.
FRASES DA SEMANA


ABC DO CLIMA
TFFF: É a sigla em inglês para o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (Tropical Forests Forever Facility). Trata-se de um mecanismo financeiro que se destina a remunerar países em desenvolvimento com base em seus esforços efetivos (isto é, mensurados e comprovados) de conservação de florestas e outras formas de vegetação natural original. Com gestação liderada pelo Brasil entre 2023 e 2025, o TFFF busca captar US$ 125 bilhões iniciais para formar seu capital principal e, a partir de então, gerar rendimentos em volume tal que mantenham o fundo girando de maneira perene. Ao remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas, o TFFF pode dar uma parcela de contribuição à implementação de um modelo de desenvolvimento de baixo carbono em até 70 países do Sul Global, a princípio. Uma vez em caixa, os recursos financeiros que fluem do fundo para um país teriam porcentagens específicas para benefício de povos originários e investimentos em políticas de gestão que fortaleçam a governança territorial, assim como financiamento à implementação de áreas protegidas e atividades econômicas alinhadas ao desenvolvimento resiliente ao clima. É aguardado que o TFFF faça parte do pacote de propostas do governo brasileiro a serem lançadas na COP30, em Belém.
MONITOR DE ATOS PÚBLICOS
Nosso Monitor de Atos Públicos captou 10 atos relevantes para política climática nacional nesta semana. A classe mais frequente da semana foi Planejamento, com 5 normas, seguida de perto por Regulação. Já o tema mais captado foi Institucional, com 4 atos, puxado por ministérios que não costumam aparecer em atos relevantes para clima, como MEC (Educação), MT e MPOR (Transportes e Portos e Aeroportos), MAPA (Agricultura e Pecuária) e MS (Saúde).
“Oi sumido, tudo bem?!”
Nesta semana, o Ministério da Educação (MEC) criou uma Comissão Gestora de seu Plano de Logística Sustentável (PLS), que tem, entre diferentes objetivos, o de atuar para o “controle de emissão de gases de efeito estufa” nas atividades institucionais do MEC. Não deixa de ser uma novidade, já que desde 2023, a curadoria da Política por Inteiro detectou que este foi o 1º ato com algum rebatimento na agenda climática emplacado pelo ministério. Apesar da validade do objetivo, a recomendação mais importante que podemos fazer é de que a pasta priorize a adaptação climática nas escolas, visando a infraestruturas resilientes, e nos currículos, para que possibilitem a formação de cidadãos protagonistas em uma sociedade de baixo carbono. A título de colaboração, trouxemos o assunto em profundidade na edição #30 do nosso Tá Lá No Gráfico.
Clima no planejamento de Transportes, Portos e Aeroportos
Nesta semana, uma portaria conjunta entre os Ministérios dos Transportes (MT) e de Portos e Aeroportos (MPOR) reforçou a centralidade da agenda climática no Governo Federal. A norma estabelece que o enfrentamento à mudança do clima é uma das cinco diretrizes a serem consideradas nas tomadas de decisão de ambas as pastas. Pela norma, uma abordagem multimodal deve ser fomentada para que as pastas colaborem com a transição energética justa.
Além disso, a norma determina que justiça climática deve ser um dos focos de investimento público nesses ministérios.
Ministério da Saúde também atento
Um ato do Ministério da Saúde (MS) instituiu a Sala de Situação Nacional de Emergências Climáticas em Saúde. Ao longo do 2º semestre de 2024, com base em dados, o ministério já havia emitido uma série de atos de resposta a incêndios, estiagem e outros eventos extremos em socorro da população na Amazônia Legal. Um levantamento da Política por Inteiro detectou que o ministério destinou R$ 168 milhões à região, no período. Mesmo com a troca de comando ocorrida no ministério, a instituição parece manter incorporada a questão climática à tomada de decisão. Bom sinal.
Vaivém na regulamentação sobre importação de resíduos sólidos
Dias atrás, em abril, trazíamos que um decreto regulamentava a lei que passou a flexibilizar a importação de resíduos sólidos no Brasil, outrora vetada no texto original da Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010. Agora, nesta semana, um novo decreto revogou o anterior e reformulou o modo como essa excepcionalidade se dá.
Além disso, uma portaria conjunta, capitaneada pelo MMA, aprofundou essa regulamentação. Agora, a lista de resíduos tem prazos determinados para certos materiais, e indeterminados para resíduos compostos por minerais estratégicos.
Dos pontos de vista jurídico e administrativo, a reformulação promovida pelo novo decreto e pela portaria é melhor que a forma anterior, já que alterações nos prazos e tipos de resíduos que possam vir a ocorrer encontram mais maleabilidade de atualização em grau de portaria, sem a necessidade de novos decretos, a priori.
A matéria importa para política climática, entre outros motivos, porque o setor de resíduos é responsável por 4% das emissões nacionais, segundo dados do SEEG.
BRASIL
Depois de 12 anos, uma Conferência Nacional de Meio Ambiente
Depois de um hiato de 12 anos, a 5ª CNMA voltou. O tema da vez: “Emergência Climática: Desafios para a Transformação Ecológica”, com eixos de Mitigação, Adaptação e Preparação para Desastres, Justiça Climática, Transformação Ecológica e Governança e Educação Ambiental. A última Conferência Nacional de Meio Ambiente havia ocorrido em 2013.
Um marco histórico importante da reconstrução de processos participativos e democráticos na esfera federal, permitindo que a sociedade civil de todas as regiões do país participem desse processo de letramento e planejamento, no modelo presencial. Até a etapa nacional, 900 conferências ocorreram em todo o território nacional, envolvendo mais de 2.500 municípios. O evento em Brasília foi responsável por eleger 100 propostas prioritárias, votadas por 1.501 delegados. Espera-se que as propostas sejam incorporadas na governança ambiental e climática federal brasileira.
DETER de abril
Uma subida repentina na taxa de desmatamento de abril, medida pelo sistema Deter, fez o governo vir a público prestar esclarecimentos e possíveis ajustes de rota. Contrariando a tendência de queda de 2024, e do primeiro trimestre deste ano, os biomas Amazônia e Cerrado tiveram um aumento de (55%) e (26%) respectivamente, em relação ao mês de abril de 2024.
Como o Deter monitora os alertas em tempo real, há uma possibilidade otimista das altas serem pontuais, conectadas às condições climáticas locais. Caso contrário, a tendência de alta será refletida nos dados do sistema Prodes, que mede o desmatamento anual, de agosto a julho, e costuma ser divulgado no segundo semestre. Diante da situação, a Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento (CIPPCD) se reuniu na última quinta-feira e, de acordo com a ministra Marina Silva, as ações do PPCDAM devem ser reavaliadas, para garantir o desmatamento zero em 2030.
MUNDO
Habemus novo papa
A fumaça branca acabava de sair no Vaticano, e o novo papa, Robert Francis Prevost – Leão XIV, já havia sido convidado para estar na COP de Belém. A expectativa de continuidade com o legado póstumo de papa Francisco sobre mudanças climáticas, expressadas pela Encíclica “Laudato si’”, coloca o novo Papa em evidência com a proximidade da COP 30. Norte-americano de Chicago, Leão XIV tem longa trajetória missionária no Peru, onde se naturalizou. Em diversas ocasiões, reiterou em discursos a ação contra as mudanças climáticas e a defesa do meio ambiente.
Reunião do Comitê de Adaptação
Ocorreu em Bonn, na Alemanha, a 27ª reunião do Comitê de Adaptação, entre os dias 6 e 9 de maio. Foram discutidos os desafios de implementação dos principais temas de negociação em adaptação para 2025: Planos Nacionais de Adaptação, Meta Global de Adaptação e interseção entre gênero e adaptação climática. O Comitê de Adaptação é composto por 16 membros e tem como objetivo prover suporte técnico às Partes e sociedade civil quanto à implementação da adaptação no âmbito da Convenção sobre Mudanças Climáticas e o Acordo de Paris.
MONITOR DE DESASTRES
O Monitor de Desastres captou 14 atos de reconhecimento de emergência decorrentes de eventos climáticos extremos, que alcançaram 67 municípios. Estiagem é novamente predominante com 50 ocorrências, somando Sul e Nordeste. Chuvas Intensas ocorreram 9 vezes, algumas das quais no Norte.
Nota explicativa: os dados registrados no Monitor de Desastres referem-se única e exclusivamente às situações de emergência ou calamidade pública reconhecidos oficialmente pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil/MDIC nesta semana. Eventualmente, é possível que desastres ocorridos na mesma semana não sejam contabilizados, dado que o reconhecimento do governo federal leva alguns dias para ser publicado.
TALANOA POR AÍ
Observatórios da Amazônia Legal
Nesta semana, Taciana Stec, especialista em Políticas Climáticas da Talanoa, esteve em Porto Velho (RO) para o II Encontro Fortalecendo os Observatórios da Amazônia Legal. Realizado pelo Instituto Centro e Vida (ICV) e parceiros, o encontro reuniu lideranças locais que desenvolvem o monitoramento de ameaças e políticas públicas que impactam os seus territórios, além de organizações de atuação nacional com experiência em monitoramento e avaliação de políticas públicas.

COP30: diálogo é o caminho
A Talanoa realizou em Brasília, na terça-feira (6), o Workshop Técnico “Pacote de entregas da COP30: do mínimo ao transformacional”. Cerca de 30 representantes da sociedade civil participaram de discussões estratégicas para COP30, desde o diagnóstico de temas de negociação e sinais políticos relevantes até a definição de articulações importantes para aumentar a cooperação em torno da ambição e da efetividade da próxima Conferência do Clima.

TALANOA NA MÍDIA
AP News | À imprensa internacional, a presidente da Talanoa, Natalie Unterstell, afirmou que os responsáveis pelo enterro da meta de não aquecer o planeta mais de 1,5ºC não serão esquecidos pela história, comentando fala da presidente da Petrobras, Magda Chambriard. A executiva repetiu o bordão de Trump “Drill, baby, drill”, para defender a exploração de petróleo na Foz do Amazonas (leia na seção Frases da semana). |
Rede CNT | O especialista em Políticas Climáticas Caio Victor Vieira falou à Rede CNT sobre as expectativas para COP30 e a urgência da implementação dos acordos estabelecidos em Paris. |
Bom fim de semana,
Equipe POLÍTICA POR INTEIRO